Governo mantém pressão em cartões

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Tentativa das empresas de aumentar a competição no mercado não deve evitar a criação de novas regras

 

O Banco Central e os ministérios da Fazenda e da Justiça acham positivo o movimento voluntário das empresas credenciadoras de cartões de crédito, de tentar gerar competição neste mercado, mas isso não deve evitar a edição de regras para o setor nem descarta punições ao comportamento não concorrencial que impera há anos no País.

 

A esperada unificação das máquinas de leitura dos cartões é encarada como o melhor sinal que as empresas estão dispostas a mudar sua forma de atuação. As companhias, por outro lado, ainda acreditam que essa nova postura pode evitar punições e uma legislação elaborada à revelia do setor.

 

"Toda essa movimentação pode não criar o melhor dos mundos, mas é o primeiro passo para criar as condições para a efetiva concorrência.
Sem o fim da exclusividade no credenciamento, nada mudaria", disse um dos interlocutores de dentro do governo envolvido nas discussões sobre o tema. O anúncio de quebra da exclusividade das bandeiras (como Visa e Mastercard) e suas credenciadoras de lojistas (como Visanet e
Redecard) aconteceu no fim de junho deste ano para ser implementada em junho de 2010 .

 

Atualmente, uma loja só pode aceitar pagamentos feitos com o cartão Visa, por exemplo, se fizer um contrato com a Visanet. Cada bandeira tem sua própria credenciadora, com contratos e condições distintas.

 

Isso explica porque há uma máquina de leitura de cartão para cada bandeira. Com a mudança proposta pelo setor, essa exclusividade vai acabar e, a partir daí, as credenciadoras poderão trabalhar com mais de uma bandeira. Assim, será possível que um lojista tenha apenas um contrato para diversos cartões. Dessa forma, as máquinas de leitura poderão ser unificadas e serão reduzidos os custos e a burocracia para o lojista.

 

A percepção do governo é que as empresas líderes desse mercado resolveram se antecipar a qualquer medida do governo. O maior temor das credenciadoras é que seja criada uma legislação para disciplinar o mercado e, assim, aumentar a concorrência. Na visão das empresas, algo pior que uma legislação é ter de se submeter à ação do Legislativo e do Judiciário, instâncias em que a indústria de cartões de crédito é alvo constante de duras críticas.

 

Uma amostra dessa ação foi vista na quinta-feira da semana passada, quando a Secretaria de Direito Econômico (SDE) instaurou processo administrativo contra a Redecard por suposta prática abusiva e anticoncorrencial contra empresas de pagamento de comércio eletrônico, como MercadoPago, ligado ao MercadoLivre, e PagSeguro, do UOL. A Secretaria também proibiu diversos procedimentos que haviam sido adotados pela Redecard para trocar os contratos firmados com essas empresas de internet.

 

O fato reforçou a avaliação do mercado de que novas punições ainda podem vir e que há um empenho efetivo das autoridades em criar condições para concorrência. O entendimento é que a iniciativa de fim da exclusividade, apesar de ser positiva, não apaga os efeitos negativos de anos de comportamento anticoncorrencial das empresas.

 

Diagnóstico feito pelo BC, SDE e Secretaria de Acompanhamento Econômico diz que o atual modelo do mercado impede a entrada de novos competidores no credenciamento, pelo não compartilhamento dos equipamentos e a existência de exclusividade nos contratos.

 

Aluguel equivale a metade da folha de pagamento

 

Todo mês, Carlos Eduardo Prado paga R$ 9 mil pelo aluguel de 100 máquinas de cartão de crédito. A despesa pesa e frequentemente ele tenta renegociar. A última vez aconteceu há poucas semanas. Como em outras ocasiões, as reclamações não surtiram efeito e Prado deixou a reunião com as mãos abanando. Diretor comercial de uma rede de 23 postos de combustível. Prado diz que o dinheiro gasto com as máquinas pagaria mais da metade da folha média de salários de um posto. "As máquinas deveriam ser de graça porque fazem parte do custo do uso do cartão. É como se eu cobrasse o preço do litro da gasolina e uma taxa extra pelo cliente ter usado a bomba de combustível ou o ponto comercial", reclama. "O problema é que a concentração em duas empresas, a Visa e Mastercard, as deixa com poder de fogo muito grande", diz Prado. Ele já pensou em retaliar algumas bandeiras, mas o protesto parece inviável porque mais de 60% das vendas são feitas com esse meio de pagamento.

 

Preço diferente causa polêmica - Procon se opõe à cobrança maior para cartões

 

As taxas, os custos operacionais e o prazo de 30 a 40 dias para que um pagamento feito com cartão de crédito entre no caixa dos lojistas são os pontos que colocam o dinheiro de plástico no centro de uma polêmica: permitir ou não que as lojas fixem preços diferentes para um mesmo produto, dependendo da forma de pagamento.

 

A polêmica põe de lados opostos os órgãos de defesa do consumidor, como Procons, e de defesa da concorrência, como as Secretarias de Direito Econômico (SDE) e de Acompanhamento Econômico (Seae). Nos últimos dias, com a aprovação pelo Senado de uma emenda ao texto da Medida Provisória 460 estabelecendo condições para a cobrança de preços diferentes, o debate reacendeu com força. A emenda é um "contrabando" na MP que tratava originalmente da concessão de benefícios fiscais para as construtoras no âmbito do programa habitacional Minha Casa, Minha Vida, do governo federal. A MP retornou à análise da Câmara dos Deputados.

 

Essa foi uma nova tentativa do senador Adelmir Santana (DEM-DF) de criar condições para as cobranças diferenciadas em cartões e à vista.
O senador já havia conseguido aprovar no Senado, ano passado, um projeto de lei com as mesmas características da emenda. A proposta, entretanto, não avançou na Câmara. Ele argumenta que o impedimento para a diferenciação dos preços faz o produto ficar mais caro para os consumidores. "O que acontece hoje é que o comércio equaliza os preços para cima. Se algo é vendido por R$ 100 é porque o lojista imagina que o cliente vai pagar com o cartão, tanto que há desconto se for pagar à vista", afirmou o parlamentar. O Banco Central (BC), a Seae e a SDE apoiam a permissão para a cobrança diferenciada sob o argumento de que isso deve estimular a concorrência.

 

A permissão para a cobrança diferenciada de preços pelos lojistas vai alterar o artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor que proíbe expressamente essa medida. Os Procons defendem a manutenção do texto atual do código porque o cartão é encarado como pagamento à vista. O assistente da direção do Procon de São Paulo, Carlos Alberto Nahas, explicou que o cartão é assim entendido porque ao usá-lo em uma compra, o consumidor quita sua obrigação com o fornecedor direto que é o lojista. "Dessa forma, ele é como o dinheiro, um pagamento à vista", afirmou Nahas. Já o cheque é uma ordem de pagamento, que pode inclusive ser suspensa pelo titular.

 

Veículo: O Estado de S.Paulo


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