P&G recorre ao 'básico' para combater queda nas vendas

Leia em 5min 30s

Ameaçada pela tendência dos consumidores de optar por produtos mais baratos, a Procter & Gamble Co. lançou discretamente nos Estados Unidos uma versão de seu detergente para lavar roupas Tide que a empresa admite abertamente não ser "nova e melhorada".

 

O novo produto, Tide Basic, perdeu um pouco da capacidade de limpeza do original. E também custa 20% menos. Ele é um dos sinais mais eloquentes até agora de como a enfraquecida economia americana está forçando fabricantes de bens de consumo em massa a alterar o curso. Ontem, a empresa, mais conhecida no Brasil por marcas como Ariel, Pampers e Gillette, divulgou queda de 18% no lucro do quarto trimestre fiscal, porque as vendas de suas marcas mais caras encolheram em virtude dos bolsos apertados dos consumidores em muitos países.

 

A decisão de desenvolver o Tide Basic não foi tranquila. Durante décadas a P&G adotou a estratégia de promover novas características para convencer os consumidores a pagar mais por detergente, xampu e outros bens de consumo doméstico básicos. Mas, quando as marcas próprias dos supermercados, mais baratas, começaram a ganhar espaço nas prateleiras, a P&G passou a oferecer clones de alguns de seus produtos, como o papel higiênico Charmin e as toalhas de papel Bounty, a um preço mais baixo para se adaptar aos orçamentos mais magros.

 

A P&G sofreu até decidir adotar caminho similar com o Tide, a marca de detergente para lavar roupa mais vendida nos EUA. Uma versão mais "básica" serviria de contrapeso ao preço mais alto do Tide e ajudaria a expandir sua já dominante fatia de mercado, que vinha caindo. Nas quatro semanas encerradas em 12 de julho, o Tide teve 41,4% do mercado americano de detergentes líquidos, 3,25 pontos porcentuais abaixo do nível de igual período um ano antes. No mercado de detergentes em pó, ele ficou com 44%, uma queda de 1 ponto em relação a um ano antes, segundo estimativas da firma de pesquisa de mercado Information Resources Inc. Os números não incluem lojas da Wal-Mart Stores Inc.

 

Executivos da P&G temiam que a versão barata pudesse canibalizar as vendas do Tide normal, que responde por mais de US$ 3 bilhões da receita anual de US$ 79 bilhões da P&G. Os marqueteiros da empresa repudiavam tanto a ideia de manchar a valorizada marca que brigaram pelo menos oito vezes por causa disso nos últimos 30 anos.

 

Em novembro passado, dois gerentes da sede da P&G em Cincinnati entraram numa reunião de executivos para sugerir uma nova tentativa. "Apenas ouçam e mantenham a mente aberta", disse-lhes Suzanne Watson, uma diretora-associada de marketing.

 

Havia um bom motivo para prestar atenção. Muitos americanos estão, pela primeira vez, recortando cupons de lojas, experimentando marcas mais baratas e apertando os cintos. Economistas não sabem quando tempo essa tendência vai durar, mas um relatório recente da Information Resources identificou uma nova classe de consumidores cautelosos com o orçamento. Cerca de 52% dos consumidores planejam comprar marcas próprias das lojas no próximo ano para economizar, 47% querem reduzir a frequência a restaurantes e 48% pensam em usar tratamentos de beleza em casa, em vez de ir a salões.

 

Em Houston, Texas, Jaime Ball, diretora de marketing de uma fabricante de roupas local, diz que não sentiu realmente os efeitos da recessão, mas começou a cortar gastos assim mesmo, reduzindo as visitas ao shopping e resistindo às compras de impulso.

 

Depois de pagar US$ 17 durante anos pelos frascos do xampu e condicionador Matrix, Ball, de 28 anos, recentemente comprou um Pantene por US$ 5. "Comprar as coisas mais caras não é mais tão gostoso para mim - não é tão importante", diz ela. "Não sei nem se dá para dizer que há diferença."

 

Essa dúvida atinge o coração do atual dilema da P&G. A empresa, de 172 anos, construiu seu império depois da Segunda Guerra Mundial, com o aumento da riqueza dos americanos e a tendência deles de igualar o "melhor" com preço mais alto. A P&G inundou as rádios e as televisões com anúncios prometendo produtos de qualidade superior, desde pasta de dentes a cera de assoalho. Como retorno, a P&G conseguiu fixar preços mais altos.

 

A abordagem firmou produtos típicos do lar, como o líquido de limpeza Mr. Clean, a pasta de dentes Crest e o detergente para roupas Tide. A P&G vendia marcas mais baratas, mas mal fazia publicidade delas.

 

Agora o modelo da P&G está sob ataque porque varejistas como Wal-Mart, Target Corp. e cadeias de supermercados de todos os EUA melhoraram a qualidade e a seleção de suas marcas próprias, seduzindo os consumidores que contam centavos a abandonar os produtos mais caros da P&G, e minando a liderança da empresa no mercado.

 

O lucro da P&G no trimestre encerrado em 30 de junho ficou em US$ 2,47 bilhões, ante US$ 3,02 bilhões um ano antes. As vendas caíram 11%, para US$ 18,7 bilhões. Executivos da empresa atribuíram a queda em parte a diferenças maiores entre os preços de suas marcas e os de itens mais baratos. No período, a empresa informou que perdeu participação de mercado em cuidados para roupa, pilhas e salgadinhos.

 

Em resposta, a P&G está tentando estender as marcas de melhor qualidade a uma faixa mais larga de preços. Numa única loja, os consumidores podem escolher o que os executivos da empresa chamam de "portfólio", em que os cremes de pele Olay variam entre US$ 7 e US$ 68, e as pastas de dentes Crest vão de US$ 2,25 a US$ 4,25. As fraldas descartáveis Pampers Baby Dry custam cerca de 20% menos que as Pampers Cruisers.

 

"Cada um de nossos negócios precisa de uma estratégia de portfólio", diz Robert McDonald, um veterano da marca Tide que assumiu o cargo de presidente executivo em julho. "Antes de fazer qualquer coisa, quero investir em fazer nosso portfólio maior e mais amplo."

 

O novo Tide está à venda, por enquanto, em 200 supermercados nos EUA. A P&G vai observar seu desempenho nesses mercados antes de decidir qual será o destino do produto no longo prazo.

 

Veículo: Valor Econômico


Veja também

Sony lançará modelo por US$199

A Sony começará a vender este mês o mais barato dos leitores eletrônicos de livros dos Estados...

Veja mais
Feijão da Embrapa estimula projeto brasileiro na África

O sucesso comercial de uma variedade de feijão da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) em...

Veja mais
Lanchinho à porter.

A marca Taeq nasceu em 2006 como a etiqueta de bem-estar do grupo Pão de Açúcar. Hoje já s&a...

Veja mais
Reebok prejudica resultado da Adidas

A Adidas anunciou ontem sua segunda grande queda seguida nos lucros, com mais um prejuízo na Reebok afetando seus...

Veja mais
Henkel cresce apenas na América Latina

No segundo trimestre do ano, a América Latina se destacou no balanço da multinacional alemã Henkel,...

Veja mais
Hidrovia pode absorver 20% do transporte de contêineres

Até novembro, deve ser iniciada uma operação regular nas hidrovias gaúchas para o transporte...

Veja mais
De olho no futuro, Acer diversifica atuação

A fabricante de computadores pessoais Acer, terceira maior do mundo, entrará nos segmentos de televisores e leito...

Veja mais
Queda da cesta básica

A cesta básica ficou mais barata em 15 das 17 capitais pesquisadas pelo Dieese em julho, na comparaç&atild...

Veja mais
Produtores de milho arrematam R$ 26,5 milhões em subvenção para escoar a safra

Nesta terça-feira (04/08), cooperativas e produtores de milho que participaram do leilão de subvenç...

Veja mais