Consumidor, esse desconhecido

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Os erros que as empresas ainda cometem por não saber o que os clientes querem

 

Quando o Walmart chegou ao Brasil, em 1995, sua primeira loja em Osasco vendia tacos de golfe no meio dos corredores. O problema é que, naquela época, os brasileiros mal conheciam o esporte. Obviamente, a ideia não vingou. Há algum tempo, a Unilever lançou uma linha de Omo composta por um novo componente de limpeza. Estava tão animada com o produto, o Omo Power, que nem terminou os testes de marketing antes de apresentá-lo aos clientes. Mas os consumidores não se mostraram nem um pouco interessados. Esses casos, considerados clássicos por estudiosos de hábitos de consumo, revelam o distanciamento que muitas vezes existe entre o que a empresa coloca no mercado e o que o cliente na verdade procura. É difícil acreditar que, nos dias de hoje, uma empresa gaste milhões em pesquisas e, ainda assim, continue a errar. Mas isso acontece com uma frequência surpreendente.

 

No mês passado, em conversa com diretores de redes varejistas, Marcílio Pousada, presidente da Livraria Saraiva, admitiu um escorregão. "Colocamos televisores para vender em uma loja. Era uma tentativa para ver se o consumidor aceitava. Não funcionou", disse. Na busca por um novo público, a ampliação da linha de produtos é sempre arriscada.

 

"Atender um público com um produto que ele não associa à sua marca raramente dá certo", diz Elizabeth Salmeirão, diretora da consultoria TNS Research International. Segundo ela, o grande temor das empresas, e que se tornou terreno farto para erros, é a questão da ousadia. "Ninguém quer perder mercado para o concorrente que foi mais audaz", afirma Elizabeth. A pressa poderia explicar a decisão da Sony de trazer para o Brasil, em março, a sua tevê de LED. Ninguém a vendia por aqui ainda e, mesmo com um preço de lançamento alto (R$ 24 mil), a empresa arriscou. Um mês após o anúncio da Sony, a Samsung lançou o seu televisor LED por R$ 7 mil. Resultado: os modelos da Sony foram retirados das lojas. "O nosso produto era importado, por isso estava numa faixa de preço mais alta. Decidimos rever o investimento", diz William Lima, gerente da Sony.

 

Em cinco anos, o volume de produtos lançados no mundo cresceu 40%, chegando a quase 232 mil mercadorias no final de 2008, segundo relatório da ESPM. No Brasil, nos hipermercados existem hoje cerca de oito mil itens à venda e entre 1,5 mil e 2 mil mercadorias entram e saem das prateleiras todos os anos. Segundo dados da ACNielsen, 80% dessa montanha de mercadorias que vai parar nas lojas não atinge as metas de vendas. "A maioria dos produtos só consome dinheiro", disse à DINHEIRO Bruce Clarkson, da BCG Consulting.

 

Para entender melhor seu consumidor, a TIM acaba de anunciar um modelo de gestão incomum. A operadora criou uma área de atendimento ao cliente que tem o objetivo de captar o que o consumidor deseja. O interessante é que o executivo responsável pelo setor, Paolo Tazzioli, vai se reportar diretamente ao presidente da empresa, Luca Luciani. "Antes, tínhamos que discutir decisões com outros executivos até bater o martelo com o presidente. Queremos, agora, ganhar em agilidade para reagirmos mais rápido", diz Tazzioli. A TIM perdeu a vice-liderança do mercado no ano passado e foi mais lenta, por exemplo, no lançamento do iPhone no Brasil - inclusive por achar que o aparelho demoraria para emplacar por aqui, o que acabou não acontecendo.

 

Nem sempre, porém, demorar a perceber tendências é o único problema. Mexer no que estava dando certo pode se revelar também um erro. Renata Vichi, presidente da rede de lojas Kopenhagen, lembra de um momento como esse. A empresa decidiu retirar do bombom Cherry Brandy uma pequena fita amarela com um alerta sobre o perigo de o cliente engasgar com o caroço da cereja que ficava dentro do chocolate. Foi o princípio do caos. "Conseguimos um lote de cerejas sem caroço e, então, o aviso perdeu o sentido", conta Renata. "Os lotes começaram a ser vendidos, mas não identificavam mais o produto como sendo o bombom. E recebemos várias reclamações de que o Cherry Brandy estava com defeito. Voltamos com a fitinha." Mudanças em produtos consagrados são arriscadas, principalmente ao se olhar as estatísticas. A consultoria Booz Allen publicou no ano passado os resultados surpreendentes de uma pesquisa com 51 empresas americanas. Nela, as companhias informam que, de cada 58 ideias de novos produtos, apenas uma obtém sucesso absoluto. Por isso, algumas sacadas são tão valorizadas. Quando o grupo Iguatemi resolveu retirar o parque de diversões no centro de um dos andares do shopping Market Place, o espaço acabou se valorizando. "Foi uma forma de ganhar área locável e repaginar o local. Acreditamos que a proposta do shopping na região não comportava aquele parque", disse recentemente a analistas Carlos Jereissati, presidente do Grupo Iguatemi. Ele só fez isso, porém, depois de consultar os frequentadores do shopping. "Foi uma medida que fez todo sentido. Prova que nem sempre ouvir o consumidor é algo tão complicado", conclui Elizabeth, da TNS.

 


Veículo: Revista Isto É Dinheiro


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