Está na mesa do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, o Projeto de Lei 103/2008 que proíbe a propaganda de alimentos e bebidas com baixo teor de nutrientes e alto teor de gordura dirigida ao público infantil entre 6h e 21h, no rádio e na televisão. Deve ser aprovado ou vetado até amanhã. A Associação Brasileira dos Anunciantes (ABA), porta-voz dessas indústrias, considera a possibilidade de entrar com uma ação de inconstitucionalidade, caso a lei estadual seja aprovada.
"A regulação da publicidade é uma competência da União", diz o vice-presidente da Associação Brasileira dos Anunciantes (ABA), Rafael Sampaio. Empresas habituadas à divulgação constante de seus produtos - como Coca-Cola, Pepsico, BRF e Mondelez International (ex- Kraft Foods) - preferem silenciar agora, enquanto aguardam a decisão do governador.
Para o professor de direito constitucional da USP, Virgílio Afonso da Silva, quando duas instâncias (neste caso, a lei federal e a paulista) concorrem, devem ser favorecidos os direitos fundamentais à vida, à saúde e à alimentação assim como o direito da criança e assegurados com absoluta prioridade, segundo o artigo 227 da Constituição Federal. Os direitos fundamentais "podem justificar restrições, nos limites da proporcionalidade, ao direito à livre iniciativa e à atividade publicitária", diz Silva.
O argumento da ABA é a defesa da liberdade - e não a preservação da receita publicitária. "Pretendem colocar uma armadura sobre o direito das empresas de se comunicarem e isso é inadimissível", diz Sampaio.
Muitas das empresas de alimentos e bebidas já seguem as restrições da publicidade voltada às crianças, conforme suas cartilhas internacionais. É o caso da Nestlé, que informa não dirigir qualquer comunicação para crianças de 0 a 6 anos ou a Danone, para quem "a comunicação de produtos está alinhada a premissa de serem saudáveis".
Regras de auto-regulamentação não faltam. Em 2009, a Associação das Indústrias de Alimentos (Abia) se comprometeu com o Ministério da Saúde a estabelecer metas para redução de sódio e gorduras dos alimentos processados, de modo escalonado, até 2020. Definiu, também, regras de não fazer publicidade dirigida a menores de 12 anos em veículos cuja audiência seja formada por pelo menos metade das crianças nessa faixa etária nem fazer propaganda de alimentos e bebidas nas escolas. O comprometimento da indústria alimentícia mundial aconteceu por pressão da Organização Mundial de Saúde, no combate à obesidade infantil.
"No Brasil, os compromissos públicos mostram intenção, mas não têm efetividade nenhuma. A lei daria a coercitividade que só o Estado possui, partindo de uma norma comum às empresas e com poder de sansão no caso de descumprimento da lei", diz Ekaterine Karageorgiadis, do Instituto Alana, entidade de defesa dos direitos da criança. A organização considera a restrição publicitária uma questão ética e de saúde.
O Projeto de Lei Estadual 1096/2011, sobre venda casada de lanches e brindes, ainda tramita na Assembleia paulista e não há prazo para chegar à Casa Civil.
Veículo: Valor Econômico