Além da laranja, múlti já trabalha com limão e, com a nova transação no país asiático, estreia em maçã
Depois de investir R$ 500 milhões entre as safras 2006/07 e 2009/10 no Brasil para fortalecer sua atuação no mercado mundial de suco de laranja, no qual tem participação em torno de 12%, a Louis Dreyfus Commodities acelerou a diversificação de seu portfólio de sucos para fazer frente à tendência estrutural de retração da demanda internacional pela commodity.
Quarta maior exportadora global de suco de laranja, seja concentrado e congelado (FCOJ) ou não concentrado (NFC), a multinacional francesa, que administra seus negócios na área a partir do Brasil - onde também atua em outros ramos do agronegócio, como grãos, açúcar e etanol, algodão e adubos -, já é a maior processadora de limão do país e, em agosto, adquiriu o controle de uma empresa de suco de maçã na China.
A companhia em questão, de capital privado, é a Shanxi Sanchuan Juice Company Ltd., localizada na Província de Shaanxi. A pedido do novo sócio chinês, a LDC, que globalmente fatura entre US$ 7 bilhões e US$ 8 bilhões, não divulgou a exata participação que comprou - apenas que a fatia é majoritária - nem o valor da transação.
Trata-se de uma empresa de pequeno porte, com capacidade de produção de 20 mil toneladas por ano, mas a tacada é simbólica. Apesar de ter grande potencial para as exportadoras globais de suco de laranja (as três maiores são as brasileiras Cutrale, Citrosuco e Citrovita), a China até agora não justificou as expectativas.
Segundo Henrique de Freitas, diretor-geral da divisão responsável pelo segmento de sucos - agora chamada LDC Juices, não mais LDC Citrus -, o negócio atendeu aos interesses do grupo tanto de diversificar a plataforma de sucos quanto de crescer na Ásia, o que se mostrou mais difícil do que o inicialmente previsto.
"A laranja continua sendo nosso carro-chefe. Entrando na maçã com a expertise que temos em sucos, inclusive na logística, acreditamos que os cítricos também serão beneficiados. Estamos mais competitivos", afirmou Freitas ao Valor. Até o fechamento do negócio, disse o executivo, foram dois anos de viagens constantes à China.
Além disso, na China o suco de maçã é negócio de gente grande. Há dois anos, as exportações chinesas do produto somaram 1 milhão de toneladas, apenas um pouco abaixo dos embarques brasileiros de suco de laranja. Laranja e maçã dominam o comércio mundial de sucos de frutas.
Essa diversificação é considerada vital por analistas, tendo em vista que o consumo mundial de suco de laranja não dá mostras de recuperação. Nos EUA, a queda de 2001 a 2010 chega a 43%. E na Europa, principal mercado do suco do Brasil, o cenário não é muito melhor.
Na Alemanha, por exemplo, a demanda caiu 2,1% apenas entre os primeiros semestres de 2009 e 2010. No Reino Unido houve estabilidade na comparação. O alento veio da França, onde o consumo cresceu 2,6%. Em mercados incipientes como a Rússia também houve aumento (5,1%), mas nada capaz de mitigar os estragos em mercados fortes como o alemão.
De qualquer forma, pondera Freitas, "são os emergentes que estão puxando o consumo". Além da China, diz, o Leste Europeu e o Oriente Médio apresentam bom potencial. "Também é preciso valorizar as vantagens da laranja para a saúde para que a demanda volte a crescer em mercados maduros e aumente mais rapidamente nos emergentes".
Nos emergentes, porém, o fator preço é uma limitação importante. A demanda global por suco de laranja entrou em declínio sobretudo pela proliferação de alternativas mais baratas, ainda que com menores teores de suco.
Por isso o pacote de R$ 500 milhões em investimentos no Brasil entre as temporadas 2006/07 e 2009/10 privilegiou ações capazes de reduzir custos e aumentar a eficiência das operações citrícolas.
Em logística, a múlti construiu um terminal no porto de Santos e ampliou o terminal de Ghent, na Bélgica, para também receber as exportações de suco não concentrado, que envolve volumes cerca de seis vezes maiores que as de suco concentrado e congelado.
Ainda nessa frente, a capacidade de transporte dos navios utilizados pela empresa para as exportações foi incrementada, em parceria com as empresas especializadas que fazem o serviço.
Para acompanhar a alta da demanda mundial por suco não concentrado, que ao menos amenizou o impacto do tombo do consumo do FCOJ, a companhia firmou as bases para triplicar a produção de NFC em duas de suas três fábricas em São Paulo, localizadas nos municípios de Bebedouro e Matão.
Na plenitude dessa expansão, afirma Freitas, o NFC representará 15% do volume total de suco de laranja (em equivalente de suco concentrado) exportado pela LDC.
Na produção de laranja, a Louis Dreyfus ampliou as parcerias com citricultores - são 40 atualmente - para garantir sua oferta própria da fruta. Nessa frente agrícola, também concluiu o plantio de 5 milhões de novos pés de laranja, ampliando seu total para 13 milhões.
Mesmo assim, pontua Freitas, a LDC Juices "continuará sendo dependente da fruta do produtor". Na maturidade da expansão do número de árvores próprias ou administradas com citricultores parceiros, essa oferta deverá representar, na média, um terço da demanda do grupo por laranja.
No caso do limão, outra frente em expansão, a empresa conta com um grande parceiro produtor e tende a elevar o processamento da fruta para a produção de suco em suas unidades de Matão e Engenheiro Coelho.
Empresa defende criação do 'Consecitrus'
Além de investir em logística, no aumento da produção de suco de laranja não concentrado, na diversificação do portfólio de suco e nas parcerias que mantém com citricultores em São Paulo, a Louis Dreyfus Commodities está envolvida nas negociações com produtores independentes de laranja para a criação de um novo ambiente de negociações de preços de fornecimento da fruta para a produção da bebida que é - e será - seu carro-chefe nessa área de atuação.
Em discussão pela cadeia produtiva paulista, responsável por 80% das exportações mundiais de suco de laranja, o "Consecitrus" - alusão ao Consecana, que norteia as negociações entre canavieiros e grupos sucroalcooleiros - estabeleceria critérios técnicos, agronômicos e mercadológicos para a definição do preço da fruta. O objetivo é conferir transparência ao processo e diluir a crescente tensão entre citricultores e indústrias exportadoras de suco, também alimentada por investigações das autoridades antitruste sobre a suposta formação de cartel entre as quatro grandes empresas da área.
"Mais do que um mecanismo de contrato, o 'Consecitrus' deve ser um veículo de informação, de esclarecimentos e convergência de visões. Com isso, haverá condições para que a cadeia produtiva tome decisões em uma direção comum, e este é um fator de alinhamento que não tem preço", diz Henrique de Freitas, diretor-executivo da divisão LDC Juices, globalmente liderada por Kenneth C. Geld, presidente da Louis Dreyfus Commodities Brasil.
Na opinião de Freitas, o estabelecimento do "Consecitrus" não significa que os citricultores independentes serão obrigadas a negociar segundo as bases ali definidas. "O produtor decidirá se seguirá ou não o modelo, mas ainda assim haverá um balizador de informações à disposição", afirma. Essas negociações entre indústrias e produtores envolvem contratos de fornecimento de prazo mais longo, a partir de uma safra.
Seus defensores acreditam que a melhora das relações na cadeia não só diluiria as tensões de preços, mas ajudaria a controlar as crescentes ameaçadas fitossanitárias aos pomares paulistas, lideradas pela doença conhecida como greening. Também colaboraria para o estabelecimento de estratégias conjuntas para combater a queda da demanda global por suco de laranja e, no futuro, até para a expansão da demanda doméstica para o suco de laranja engarrafado vendido no varejo.
Veículo: Valor Econômico