Cervejaria da Ambev passa por desconforto na relação com Evo

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A maior fabricante de cervejas da Bolívia está passando por um período de sobressaltos em sua relação com o governo Evo Morales. A empresa, controlada pela Companhia de Bebidas das Américas (Ambev), foi multada há dois meses sob acusação de práticas monopolistas e de abuso de mercado. A indisposição chegou ao ponto de setores do governo terem começado a cogitar a possibilidade de a empresa ser estatizada, segundo fontes ouvidas pelo Valor.

 

Oficialmente o governo Morales - que desde de seu primeiro mandato, em 2006, já nacionalizou setores de gás, eletricidade e telecomunicações - nega que a companhia esteja em seus planos.

 

A Cerveceria Boliviana Nacional (CBN) domina o mercado. A Autoridade de Fiscalização e Controle Social de Empresas diz que a empresa tem 99% das cervejas no país. A Paceña é o carro chefe.

 

"Há uns seis meses, deputados amigos ligaram para a empresa para dizer que havia um movimento no governo para nacionalizar a cervejaria", contou à reportagem uma fonte que conhece o setor cervejeiro boliviano e que falou sob a condição de não ter seu nome publicado. "Disseram que havia correntes no governo que queriam a nacionalização."

 

O assunto chegou a autoridades do governo brasileiro. Uma delas, que também pediu confidencialidade à reportagem, disse que a ideia que estaria sendo gestada por setores do governo Morales era de uma "transferência forçada de parte ou mesmo de toda as ações da cervejaria para as mãos do Estado".

 

A Ambev não quis se pronunciar sobre a multa afirmando que o processo ainda está em andamento. Não quis tampouco comentar as afirmações a respeito das cogitações de nacionalização. A CBN, em La Paz, também não quis fazer comentários.

 

A reportagem apurou, no entanto, que a Ambev consultou o governo brasileiro recentemente para avaliar qual seria a melhor forma de proceder para tentar reverter esse suposto movimento de integrantes do governo socialista de Morales. Uma das hipóteses discutidas, disse a mesma autoridade, foi um reforço dos gastos da Ambev em projetos sociais na Bolívia.

 

De acordo com a fonte do setor na Bolívia, a CBN conta com um deputado do próprio partido do presidente, o MAS (Movimiento al Socialismo), que estaria atuando em favor da empresa e tentando abafar as pretensões de setores mais à esquerda que defendem a ideia da estatização.

 

A CBN tem fábricas em La Paz, Cochabamba, Santa Cruz, Oruro e Tarija e cerca 800 funcionários. Com mais de um século de existência, a empresa passou para o controle da Ambev em 18 de janeiro de 2008. Recentemente, foi alvo de uma queixa da pequena Compañia Cervecera Boliviana, de La Paz, dona da marca Auténtica.

 

Na queixa feita à Autoridade de Fiscalização e Controle Social de Empresas - órgão do governo boliviano encarregado de supervisionar o respeito às regras da atividade empresarial -, a pequena cervejaria formada por ex-funcionários da CBN acusava a gigante de forçar revendedores a fechar contratos de exclusividade, impedindo, na prática, a concorrência da Auténtica e de outras.

 

"Encontramos que havia mesmo contratos de exclusividade, o que não é permitido pela Constituição", disse à reportagem Óscar Cámara, diretor executivo da autoridade de fiscalização. A empresa foi sancionada por prática monopolista e por abuso de mercado. A primeira multa foi de 150 mil bolivianos. A CBN recorreu e em novembro o Ministério de Produção e Economia Plural entendeu que a sanção deveria ser maior e a subiu para 1.482.145 bolivianos (cerca de US$ 200 mil). A empresa foi proibida de manter sua política de contratos de exclusividade. A CBN pagou a multa e tem seis meses para recorrer à Corte Suprema. "Foi a primeira empresa no país a ser sancionada por prática monopolista na história da Bolívia", diz Cámara. Perguntado pelo Valor, o ministro da Economia e Finanças, Luis Arce, disse que o governo não quer estatizar a empresa.

 

A CBN teve além da multa outro revés no fim do ano. Em novembro, funcionários da empresa fizeram greve contra, segundo eles, o não pagamento de horas extras e de bônus salariais e pela demissão considerada pela entidade como injustificada de quatro funcionários. "Foi a primeira greve em 15 anos. O que existe é uma certa animosidade contra o capital privado na Bolívia e contra a cervejaria que, afinal, já não é mais boliviana", disse a fonte do setor cervejeiro.

 


Veículo: Valor Econômico


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