O ambicioso plano da cachaça

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Governo de MG promete ressuscitar programa para ampliar produção artesanal em 45%. Baixar imposto, reforçar marketing e criar centro de pesquisa estão entre medidas estudadas


 
Adormecido há quatro anos, o Pró-Cachaça será ressuscitado pelo governo de Minas, que deseja associar a tradicional bebida artesanal, criada na época do Brasil colônia, ao nome do estado, a exemplo do uísque escocês, da vodca russa, do champanhe francês e da tequila mexicana. O primeiro passo será a nomeação dos 22 integrantes do conselho gestor do programa, o que ocorrerá em março. Algumas medidas já foram definidas e serão implantadas nos próximos quatro anos: marketing agressivo para divulgar a branquinha nos mercados externos e interno, conseguir a indicação geográfica (IG) do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi) – o título confere ao produto uma espécie de identidade, tornando-o mais confiável – e criar a primeira unidade estadual de pesquisa voltada para inovações e outras melhorias no setor. Outra medida é possibilidade da redução, de 12% para 8,4%, da alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

 

A promessa de reativação do Pró-Cachaça anima os fabricantes artesanais. A expectativa da Associação Mineira dos Produtores de Cachaça de Qualidade (Ampaq) é expandir a produção anual em 45,8%, de 240 milhões de litros para 350 milhões, depois de as medidas serem implantadas. A produção nacional artesanal soma 400 milhões, mas, quando levado em conta a aguardente industrializada, o volume chega a 1,3 bilhão. “Minas Gerais é responsável por 60% da cachaça de alambique. Somos 9 mil produtores, dos quais 900 são formais. O setor tem 45 mil empregos diretos. Se o governador cumprir o que está na página 62 do seu plano de governo (revitalizar o Pró-Cachaça), vamos agregar números melhores”, avalia Alexandre Wagner da Silva, presidente da entidade.

 

Ele elogia a estratégia do governo em associar a bebida ao estado, mas alerta que o sucesso do programa também depende da revisão dos impostos, pois, apesar de Minas responder por 60% do mercado nacional de aguardente artesanal, a cachaça industrializada – a maioria é fabricada em São Paulo e no Ceará – ainda domina o comércio brasileiro. “Uma das metas é tentar, junto aos governos estadual e federal, a redução das alíquotas. Pretendemos abaixar (o ICMS) para 8,4%. Ainda é uma proposta”, antecipa Thiara Ribeiro, secretária executiva do programa, acrescentando que uma das consequências do Pró-Cachaça deve ser a migração de produtores informais para a formalidade.

 

Também aumentará a produção da tradicional bebida, usada por Dom Pedro I (1798/1834) para brindar o grito às margens do Ipiranga, em 7 de setembro de 1822. “Foi um desafio à bagaceira portuguesa, bebida feita com o bagaço da uva. Por muitos anos, (a coroa lusitana) proibiu a fabricação da cachaça brasileira (feita com a cana-de-açúcar)”, conta o apreciador da branquinha Murilo Albernaz, de 62 anos, dono do Clube Mineiro da Cachaça, no Bairro Santa Tereza, na Região Leste. O estabelecimento dele tem a maior variedade de marcas de aguardente do país: “São 1,2 mil rótulos diferentes e 4 mil garrafas”.

 

Uma delas é a legítima Havana, fabricada em Salinas, no Norte de Minas. A garrafa de 750 ml, que fica exposta num oratório, sai a R$ 450, quase cinco vezes mais que a embalagem de um uísque de boa qualidade negociada nos supermercados da capital. “A dose pode ser degustada a R$ 45”, divulga Albernaz que vende uma embalagem a cada dois meses. Já as duas marcas produzidas pelo presidente da Ampaq – Água da Bica e Sonhadora, ambas fabricadas em Brumadinho, na região metropolitana, custam bem menos.

 

No entanto ele projeta bons negócios após a revitalização do Pró-Cachaça: “A produção da Água Limpa, que hoje é de 80 mil litros por ano, deve saltar para 100 mil. A da Sonhadora, feita para mulheres, passará de 50 mil para 80 mil”. Seu Ailton Fernandes, dono da Meia Lua, de Salinas, no Norte de Minas, também torce para o sucesso do programa. Parte de sua produção é voltada para o mercado dos Estados Unidos. Ele espera aumentar a parcela de exportação.

 

“Estou no mercado desde 1988. Minha produção atual é de 40 mil litros por ano. Vendo para todos os estados brasileiros, e a expectativa é ampliar a produção, caso o programa dê certo”, diz o fabricante, escondendo quanto fatura com o mercado externo. Nesse concorrido setor, o segredo é uma das causas do sucesso.
 

 
Produtor quer rever o IPI

 
 
Os produtores mineiros de cachaça de alambique vão reivindicar junto ao governo federal mudanças no cálculo do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para o produto, pois, atualmente, enquanto os fabricantes artesanais pagam, em média, R$ 2,50 para cada garrafa vendida, o segmento industrializado, que produz em maior quantidade, desembolsa apenas R$ 0,14. A proposta é que o tributo leve em conta o teor alcoólico da “marvada”.

 

“Com isso, haverá uma concorrência leal. Na prática, o preço da industrial será o mesmo da artesanal, equiparando os produtores. Nos outros países, é esse o tipo de cobrança que ocorre”, defende o presidente da Ampac, Alexandre Wagner Silva. A secretária executiva do Pró-Cachaça, Thiara Ribeiro, diz que o programa tentará a redução de impostos junto ao governo federal, mas a pauta só será discutida pelo conselho gestor nos próximos meses.

 

“Os industrializados pagam muito menos porque produzem em larga escala, podendo vender o produto mais barato nas gôndolas”, acrescenta Alexandre. Para reforçar o pedido da categoria, o presidente da Ampaq recorre às políticas públicas de saúde, pois, conforme ressalta, o governo deve cobrar mais dos produtores que fabricam a bebida com elevado teor alcoólico.

 

A associação não tem uma estatística que revele o consumo per capta de aguardente no Brasil, contudo, a estimativa é que a quantidade gire em torno de 6 litros anuais por habitante. A quantidade, claro, oscila de acordo com a época do ano: “No calor, o consumo é menor”, diz Alexandre.
 

 
Veículo: O Estado de Minas


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