Desaceleração da economia, protestos na rua que fecharam as portas do comércio, alta do dólar; nada foi problema para a água engarrafada no primeiro semestre do ano. Não houve crise. Entre janeiro e junho, as vendas de água no varejo cresceram 14,8%, para R$ 1,56 bilhão, na comparação com o primeiro semestre de 2012. O volume aumentou 10,2%, para 1,82 bilhão de litros, de acordo com dados da consultoria Nielsen.
Mas o movimento não é de agora: a venda de água aumenta há três anos. Em 2012, foi a segunda categoria de bebidas com maior crescimento, atrás de suco pronto, e a quarta entre todas as 154 (atrás também de tintura e bronzeador) analisadas pela Nielsen. E na esteira do mercado, aumenta também o espaço para a água "premium", mais cara e com composição específica de ingredientes minerais.
"Houve investimento significativo dos fabricantes nesta categoria. Não só em mídia, mas também em ponto de venda. Hoje existe mais espaço na gôndola, destaque que antes não havia para a água. E no produto, em novas embalagens e tamanhos", diz Stephanie Biglia, analista da Nielsen.
A Minalba, do Grupo Edson Queiroz, dono também da marca Indaiá, põe o bom momento do mercado na conta do aumento da renda do brasileiro. "A classe C teve acesso a novos produtos e novos hábitos, passou a ter poder aquisitivo para adquirir água mineral", diz o superintendente de bebidas da empresa, Antônio Vidal. Segundo ele, mesmo com sinalizações macroeconômicas negativas, o setor deve continuar crescendo. Com 21 fontes e presente em 15 estados, a Minalba prevê crescimento de 12% a 15% em faturamento este ano.
"Hoje há um olhar diferente do consumidor para o produto", explica Vidal, para quem crescer pede investimento na valorização da marca. "No Nordeste temos campanha sobre a qualidade de nossas fontes", diz.
Investir em marketing é a aposta da Brasil Kirin, dona da água Schin, que aumentou a verba para água em 60% neste ano, diz o gerente de produtos não alcoólicos, Bruno Piccirello. "Temos presença estabelecida no Nordeste, uma das áreas que mais puxam o segmento". A companhia produz água em sete de suas 13 fábricas, e concentra a produção no Nordeste.
A Coca-Cola quer aumentar a capilaridade de suas três marcas, Crystal, Ijuí e Charrua, presentes em 12 estados. "O movimento agora é de expansão para que Crystal se torne uma marca nacional", diz a diretora de marketing Aliucha Ramos, sem detalhar a estratégia. A Coca-Cola informa que é líder em água engarrafada em embalagens descartáveis, com 20,6% de participação em volume, citando dados da Nielsen. A Minalba tem 15% no mesmo segmento, onde também compete a Danone com a água Bonafont. A estratégia da Danone é associar a marca a um estilo de vida saudável.
Em 2012, a venda de água engarrafada no Brasil somou R$ 2,66 bilhões, com alta de 16,3% sobre 2011. Foram vendidos 3,3 bilhões de litros no ano, 11,7% a mais do que um ano antes. Cerca de 45 marcas têm participação significativa no mercado de água, mas o número de engarrafadoras chega a centenas.
Segundo a Nielsen, os galões de 20 litros - segmento onde a Minalba lidera - ainda vendem mais, mas as embalagens menores, com até 2 litros, estão disparando.
O segmento de águas especiais ainda é minúsculo no Brasil - a participação não chega a 1% em faturamento ou volume no varejo, segundo a Nielsen. Mas o nicho ganhou espaço no último ano: cresceu 11,1% em volume e 24,6% em valor. Crescer no segmento demanda originalidade. "Os fabricantes tentam fazer produtos com algum diferencial e agregar valor. Por exemplo, com menos sódio, Ph diferenciado ou embalagem atrativa, para que a água do ponto de venda seja diferente da do filtro", diz Stephanie, da Nielsen.
A água mineral custa em média R$ 1,45 a garrafa de 1,5 litro, mas uma "super premium" pode custar dez vezes mais. Marcas populares na Europa, como a Perrier, da Nestlé, e a Evian, da Danone, são consideradas premium no Brasil.
Focar o marketing em restaurantes e hotéis é parte da estratégia para atrair consumidores, diz Humberto Cárcamo, gerente da importadora Casa Flora, representante exclusiva da norueguesa Voss e das francesas Evian e Badoit, da Danone. Ele espera vender 50% mais águas premium em volume este ano que em 2012.
As redes Pão de Açúcar, com sede em Paulo, e a carioca Zona Sul, miram o consumidor de vinhos. "A gente posiciona as águas especiais perto dos vinhos. Existe uma propensão dos apreciadores da bebida a tomar água 'diferenciada'", diz o diretor Pietrangelo Leta, do Zona Sul. No ano passado, o faturamento com águas premium cresceu 18% - acima do crescimento geral da rede que foi de 15%. Já o Pão de Açúcar faz degustações de água com os especialistas em vinhos e queijos. "O crescimento é exponencial, mas existe a limitação financeira. Nem todos podem comprar", diz Cárcamo da Casa Flora.
Veículo: Valor Econômico