Cade dá multa recorde à AmBev e suspende programa de ''fidelidade''

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Empresa foi multada em R$ 352,7 milhões por programa que restringia a concorrência nos pontos de venda

 

A Companhia de Bebidas das Américas (AmBev), líder absoluta do mercado de cervejas no Brasil, foi multada ontem pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) em R$ 352,7 milhões, a maior multa já aplicada pelo órgão antitruste. A AmBev foi condenada por causa de um programa de relacionamento com bares, restaurantes, mercearias e supermercados, batizado de "Tô Contigo", iniciado em 2003. O programa foi julgado pelo Cade prejudicial à concorrência e aos consumidores finais por funcionar como um programa de fidelidade para os pontos de venda, induzindo-os a dar exclusividade às cervejas do portfólio da AmBev ou a limitar a comercialização de marcas concorrentes.

 

Além da multa, que equivale a 2% do faturamento bruto no Brasil da companhia em 2003, a AmBev terá de suspender imediatamente as exigências de exclusividade ou de restrições aos concorrentes - que, segundo o Cade, ainda estão sendo praticadas. Se descumprir a determinação, a empresa está sujeita a uma multa diária de R$ 53,2 mil. A empresa ainda terá de publicar em um jornal de grande circulação nacional o extrato da decisão do Cade.

 

O Cade também determinou à Secretaria de Direito Econômico (SDE), do Ministério da Justiça, que apure a responsabilidade dos executivos da AmBev no caso. Dependendo da participação deles no programa, podem receber multa de 10% a 50% da multa aplicada à empresa. "''A importância desse tipo de investigação é que executivos, com medo de serem apanhados, podem frear práticas anticoncorrenciais", disse o conselheiro-relator do caso, Fernando de Magalhães Furlan.

 

Segundo o conselheiro, a AmBev se excedeu ao exercer a sua liberdade de atuação no mercado. Em seu voto, ele destacou ainda que os mais prejudicados são os consumidores finais, que "não têm nem a variedade e nem os preços desejados" nos estabelecimentos comerciais.

 

A AmBev ainda pode recorrer da punição no próprio Cade e, depois, tentar derrubá-la na Justiça. A multa de R$ 156 milhões imposta pelo Cade à siderúrgica Gerdau, em 2005, por exemplo - que era até ontem a maior punição imposta pelo órgão -, ainda está sendo questionada nos tribunais. Furlan disse, entretanto, que atualmente há um entendimento no Judiciário de que, para que esse tipo de reação não seja meramente protelatório, a empresa tem de fazer um depósito judicial ou apresentar garantia efetiva de que pagará a multa, caso perca na Justiça.

 

O programa "Tô Contigo" virou alvo de investigação da SDE em 2004, após denúncia da cervejaria Schincariol. Pelo programa, os estabelecimentos recebem pontos de acordo com as quantidades de cervejas adquiridas da AmBev. A bonificação é então trocada por prêmios, como descontos nas compras de novos produtos. Nos contratos e no material de propaganda do programa, a AmBev afirma não haver exigência de exclusividade ou redução de vendas das marcas rivais.

 

No entanto, a SDE apurou - entrevistando proprietários de estabelecimentos varejistas - que, na prática, as regras do programa não eram claras e os agentes de venda da AmBev faziam sugestões de retaliações, caso não fosse dada a exclusividade nas vendas ou não se reduzisse o espaço para os concorrentes. O Cade entendeu que as provas eram suficientes, comprovando as reclamações das empresas concorrentes.

 

O relator no Cade contou ainda que, um dia antes do julgamento do processo, a AmBev, por meio de seus advogados, procurou-o para propor um acordo de suspensão da prática em troca do arquivamento do julgamento. No entanto, o plenário do Cade rejeitou ontem essa possibilidade e nem chegou a tratar do seu mérito. "Estava muito aquém do que poderíamos considerar um compromisso sólido", disse.

 

RECURSO

 

A AmBev se declarou ontem, em comunicado oficial, "surpresa" com a decisão do Cade. "Durante a fase investigatória, a SDE concluiu que, para não gerar efeitos anticoncorrenciais, o programa "Tô Contigo"
deveria sofrer alguns ajustes, os quais já se encontram substancialmente incorporados ao programa na sua configuração atual", disse a nota. A AmBev insiste que o programa não é baseado em exigência de exclusividade. Mas, antes de anunciar qualquer medida jurídica, informa que vai aguardar o inteiro teor da decisão para avaliar as medidas que serão tomadas.

 

Do lado oposto, a Cervejaria Schincariol, que fez a denúncia contra a AmBev, comemorou a decisão do Cade, tomada "por unanimidade": "O Grupo Schincariol entende ser esta uma vitória para todos os participantes deste setor, ao sedimentar o entendimento das autoridades brasileiras de que deve prevalecer, no País, um ambiente econômico marcado por igualdade de condições de competição", disse a empresa, em comunicado.

 

Veículo: O Estado de S.Paulo


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