Está gelado. Vai esquentar?

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A Femsa perde mercado num ritmo inédito no Brasil. Mas garante que, graças a isso, ganha mais dinheiro que as concorrentes

 

A trajetória da cervejaria mexicana Femsa nunca foi das mais fáceis no Brasil. Desde que adquiriu a Kaiser, em 2006, precisou se desdobrar para dar novo gás à marca. Até hoje, a marca cresce menos do que a concorrência. Considerada uma de suas maiores apostas do grupo por aqui, a Sol, outro de seus rótulos, nunca teve mais de 1% das vendas do setor no Brasil. No passado recente, a Femsa perdeu distribuidores e chegou até a entrar numa briga declarada com a AmBev nas tevês e na Justiça. Em momento algum seu desempenho por aqui animou os acionistas. Mas nada pode ser comparado ao baque sofrido na mais recente leitura da consultoria ACNielsen, divulgada na semana passada. Em agosto, as três marcas de cerveja da Femsa (Kaiser, Sol e Bavária) registraram a menor participação de mercado desde que a companhia desembarcou no País. Entre janeiro e agosto, a taxa desabou de 8,2% para 6,9%, uma perda equivalente a R$ 140 milhões em receitas. Esse resultado provocaria um terremoto em qualquer empresa. Mas não se tem notícia sobre demissão de diretores ou mudanças dramáticas na gestão do negócio. Isso porque a Femsa garante que já esperava por isso. Parece uma incoerência, mas, de certa forma, foi ela - e não os rivais - a maior responsável pela performance negativa.

 

Nesse ano, a companhia fez reajustes de preços que chegaram ao dobro da alta promovida por AmBev ou Schincariol. Enquanto as duas concorrentes subiram as tabelas em quase 5% na virada do ano, na Femsa a alta foi de 10,7% no primeiro trimestre. A Femsa fez uma opção clara: decidiu mexer no preço porque precisava proteger a margem de lucro, ainda que isso provocasse queda nas vendas. "Resolvemos garantir a rentabilidade. Esse é o nome do jogo. Reajustamos, perdemos share, mas a operação continua no azul", diz Paulo Macedo, diretor de relações externas do grupo. A visão é compartilhada por gente de fora da empresa. "Uma companhia do porte da Femsa tem compromisso com acionista. Para o investidor, não interessa se ela perdeu mercado ou não. Por isso, ela protegeu o resultado", diz Joaquim Ferreira Sobrinho, professor da Trevisan Escola de Negócios.

 

A origem do problema estava na escalada do dólar após o estouro da crise financeira. Cerca de 70% da matéria-prima usada na produção da bebida é dolarizada. A empresa não quis amargar as perdas geradas pela alta dos custos. As operações de proteção cambial (hedge) fechadas pelo grupo não consideravam uma disparada no dólar superior a R$ 2,20 (ele foi a R$ 2,51).
 

 

US$ 672 milhões foi o lucro da Femsa no mundo em 2008, uma queda de 22% sobre o ano anterior
Nessa hora, não há muito o que fazer se a empresa não tem peso no tabuleiro de forças. A AmBev muitas vezes divide a conta com o varejista, que ou aceita a pressão ou fica sem o produto. Na Femsa, com poder de barganha bem menor e portfólio de marcas limitado, não funciona assim. No final do primeiro semestre, o que se viu foi preço mais salgado e volumes mais magros - alta de 1,9% na quantidade vendida no primeiro trimestre e 0,5% de abril a junho. No semestre todo, o setor cresceu 4%. Até agora, a quantidade de dinheiro que vai para o caixa da Femsa cresce numa velocidade maior do que o volume comercializado. Enquanto o valor do Ebitda subiu 72% entre 2003 e 2008, as vendas registraram alta de apenas 9%. Agora, se quiser aumentar os volumes de produção, a empresa terá que superar limitações na produção em algumas fábricas. A unidade de Manaus, que atende o Norte, está operando com 100% da capacidade instalada. É a região que ajuda a empresa a ganhar dinheiro, mas não há como produzir mais ali sem o desembolso de vultosos investimentos.

 

Também não existem planos para ampliar a unidade de refrigerantes de Minas Gerais, uma das mais eficientes do grupo, e que poderia passar a produzir cerveja.
Em novembro, José Antonio Fernández Carbajal, presidente do Conselho de Administração da Femsa, disse que poderia produzir a bebida em Minas Gerais dentro de quatro anos. "Isso ainda não está certo. Aquela unidade fabrica refrigerante e precisamos acertar essa ampliação com a Coca-Cola", diz Macedo. Ele, porém, garante a satisfação da empresa com os resultados no Brasil. "Nós crescemos há três anos consecutivos e operamos no azul há quase dois anos." Para ele, a Femsa está muito longe de entrar numa fria.

 

Veículo: Revista Isto É Dinheiro


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