Depois de pressionar a inflação ao longo de 2010, os preços dos alimentos dão os primeiros sinais de que os tempos de vilões da alta de preço ficaram para trás. Divulgado ontem pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), o Índice de Preços ao Consumidor (IPC), que pesquisa preços na cidade de São Paulo, aumentou apenas 0,36% na semana passada, tendo os preços dos alimentos registrado queda de 0,41% - a quarta variação negativa consecutiva.
Os economistas, no entanto, divergem quanto à duração desse movimento até o fim do ano. Enquanto Antônio Comune, coordenador do IPC-Fipe, avalia que os preços dos alimentos devem voltar a aumentar, ainda que em ritmo menos acelerado que o verificado no ano passado, para Fabio Silveira, sócio-diretor da RC Consultores, as commodities agrícolas e metálicas, à exceção do petróleo, vão perder força - retirando uma pressão sobre os alimentos. Ambos, no entanto, revisaram para baixo as expectativas para o ano - Comune espera o IPC entre 5% e 5,4%, inferior aos 6,4% registrados em 2010, enquanto Silveira passou sua expectativa para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 6,2% para 6%. Já Tatiana Pinheiro, especialista de inflação do Santander, trabalha com IPCA em 6,1%, "com viés de alta".
Os dados do IPC-Fipe referentes à semana passada indicaram, para Comune, uma tendência de curto prazo. O maior avanço, de 1% no item transportes, é "totalmente pontual", uma vez que reflete as elevações nas tarifas de ônibus e de metrô. Os alimentos, por sua vez, estão "devolvendo" as fortes elevações verificadas no ano passado, quando itens como carne bovina ficaram 37% mais caros entre janeiro e dezembro. Em 2011, entre janeiro e a semana passada, as carnes já registraram recuo de 5% nos preços praticados em São Paulo, e continuarão caindo mais um pouco, diz Comune, para quem, no entanto, o movimento não se estenderá além do primeiro semestre.
De acordo com Silveira, o repique nos preços do barril de petróleo não foi pontual - resultado dos conflitos em países produtores, como Líbia, e dos problemas em plantas nucleares no Japão, que passará a demandar mais petróleo. "Com a maior parte da renda, tanto dos governos quanto das famílias, sendo consumida pelo petróleo mais caro, menos dinheiro ficará disponível para outras commodities agrícolas e minerais", avalia Silveira, para quem a tendência para o ano é de preços declinantes nos produtos básicos.
Segundo Silveira, o IPCA deixará a casa dos avanços mensais de 0,8%, registrados em janeiro e fevereiro, para 0,5% em março e abril. "O que impede que o IPCA caia a 0,3% não são os alimentos, mas sim a demanda, que continua acelerada, devido ao mercado de trabalho muito aquecido."
Para Tatiana, os alimentos não serão mais o foco da inflação, que continuará no mesmo patamar de 2010. "O item alimentos pesa 22% do IPCA, e sua variação em fevereiro, de 0,23%, não justifica a alta de 0,8% registrada pelo índice. Isso quer dizer que uma série de preços subiram muito para compensar um número fraco de um item tão pesado", explica Tatiana.
Segundo ela, a inflação, além de mais disseminada, está pressionada pela "herança negativa", uma referência à indexação do aluguel ao Índice Geral de Preços-Mercado (IGP-M), que passou da deflação de 2009 para os dois dígitos registrados no ano passado. "O consumo cedeu pouco, a economia não está tão desaquecida assim", diz.
Veículo: Valor Econômico