Câmbio reduz índice de nacionalização

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Autopeças: Valorização do real também compromete investimentos no país e leva projetos para outras regiões

 

Sílvio Barros, diretor-geral da Meritor: substituição de peça nacional por importada para manter custo sob controleA valorização do real ante o dólar já representa importante ameaça ao elevado índice de nacionalização das autopeças brasileiras - hoje, o conteúdo local de um veículo fabricado no país está acima de 80%. Multinacionais que fornecem conjuntos de componentes às montadoras, as sistemistas, iniciaram a substituição de uma ou outra partes de componentes automotivos de origem nacional por importados, com vistas à manutenção de custos em níveis competitivos, e têm encontrado dificuldade junto à matriz para aprovar novos investimentos no país.

 

Aquelas que ainda não recorreram a esse expediente adiantam que, se nenhuma medida que crie condições de recuperação de competitividade for implementada, não haverá outra alternativa a não ser a busca de mais fornecedores estrangeiros. O alerta foi feito por gigantes da indústria, como Bosch, Meritor e BorgWarner.

 

"A luz amarela está acesa para novos investimentos no país", afirma o vice-presidente executivo da Robert Bosch América Latina, Besaliel Botelho, acrescentando que a operação brasileira já perdeu projetos para outras regiões consideradas mais competitivas, como México e China. No médio prazo, lembra o executivo, a ausência de aportes em capacidade fabril poderá resultar em desindustrialização, como ocorreu na Argentina.

 

A operação brasileira da Meritor, uma das maiores fornecedoras mundiais de conjuntos de peças no segmento de veículos comerciais, já recorreu à substituição de itens para manter custos sob controle e reduziu de quase 80% para cerca de 65% o percentual de conteúdo nacional. Pares da companhia, que fabrica eixos para caminhões e cardans, também adotaram essa estratégia. "Estamos reduzindo o índice de nacionalização, porém mantendo um nível que permita o acesso ao Finame", diz o diretor-geral da empresa para América do Sul, Sílvio Barros, referindo-se à linha de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para a compra de veículos comerciais e equipamentos que exige índice de nacionalização mínimo de 60%.

 

Conforme Barros, o aumento das compras externas de componentes não está alinhado à estratégia de longo prazo da companhia. Ampliar a base de fornecedores no país segue como meta, porém a valorização do real e seu impacto na competitividade dos sistemas produzidos pela Meritor levaram à adoção de medidas com efeito imediato na linha de custos. "O cenário é positivo e queremos acompanhar a demanda crescente. Mas o câmbio pode impedir que as empresas brasileiras se beneficiem desse bom momento."

 

Para Botelho, da Bosch, é contraditório que um setor que passou anos em busca de mercados consistentes não consiga se beneficiar plenamente pelos sucessivos recordes de produção da indústria automobilística nacional. "Estamos perdendo oportunidade de crescimento", afirma. Na Bosch, o índice de nacionalização fica acima de 70%, sem variação significativa até o momento e o foco na política "local para local" está mantido. Contudo, surge outra preocupação relacionada à cadeia de suprimentos que, pressionada pela concorrência dos importados ou por custos crescentes, deixou de investir nos últimos anos. "A cadeia está trabalhando a pleno vapor e volumes adicionais (de componentes que seriam fornecidos por essas empresas) têm sido comprados lá fora", diz.

 

A americana BorgWarner, que fornece turbocompressores para motores, sentiu, assim como a Bosch, queda significativa nos volumes exportados e não vê perspectiva de melhora no curto e médio prazos. Até 2008, 25% do faturamento era gerado por embarques para América Latina, Europa e Estados Unidos. Hoje, essa fatia está em 10%. Na Bosch, a participação de 50% das exportações há quatro anos foi reduzida a menos de 20%. A BorgWarner também ainda não alterou o índice de nacionalização de seus sistemas - em torno de 80% -, mas alerta que, mantidas as atuais condições, não haverá outra saída senão importar. "Como precisamos sempre buscar competitividade, não teremos alternativa a não ser importar mais caso essa situação não se reverta", diz o diretor-geral Arnaldo Iezzi Jr.

 

O câmbio vem ampliando o estrago na balança comercial. Historicamente superavitária - houve registro de déficit anos atrás, porém não da magnitude atual -, a indústria tem assistido ao efeito negativo da combinação de queda nas exportações e aumento das importações. No ano passado, segundo dados do Sindipeças, o déficit alcançou o recorde de US$ 3,5 bilhões, com compras externas de US$ 13,1 bilhões e embarques de US$ 9,6 bilhões. Foi o quarto ano consecutivo de saldo negativo.

 

Para o diretor-geral Honeywell Turbo Technologies, José Rubens Vicari, o calcanhar de aquiles da indústria de autopeças não está limitado ao câmbio. "Alta carga tributária, gargalos de logística, encargos sociais e ajustes de salário acima dos níveis da inflação colocam o setor em grande desvantagem perante outros países", enumera o executivo. Assim, a solução para retomada da competitividade das peças nacionais dependeria de uma política industrial efetiva.

 

Veículo: Valor Econômico


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