Empresas crescem rumo à periferia

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De olho nas compras das classes C e D, comércio e serviços se expandem em bairros mais populares e até mudam de cidade

 

Interessadas no aumento do poder aquisitivo e no apetite da classe média emergente para o consumo, as empresas brasileiras estão se movimentando em direção à periferia. É o que vem ocorrendo nos setores de serviços e comércio, que estão diretamente em contato com o consumidor. O objetivo é ampliar as vendas, aproveitando o aumento de renda da população e a oportunidade de ocupar mercados até agora pouco explorados. A aproximação com as classes emergentes tem justificativa na forte expansão do poder de consumo que as classes C e D vêm experimentando desde 2003.

 

Foi por causa do aumento do poder aquisitivo dessa camada da população que o Pro Labore, curso presencial e telepresencial para concursos públicos, expandiu sua rede em direção à periferia de BH e já abriu as portas em Venda Nova, Contagem e Betim. A ideia é atrair estudantes mais humildes, de nível médio, que ficam inibidos de frequentar a sede do curso, no Barro Preto, em Belo Horizonte, ou não têm condições de arcar com as despesas de transporte e alimentação. “Assim, começamos a atingir as classes C e D”, explica o gerente de franquias da rede, que tem outras 32 unidades no interior de Minas, Rogério Magno. Segundo ele, enquanto na sede a proporção de alunos é de 70% de classes A e B e 30% C e D, na periferia, 60% são das classes populares. “Ir para a periferia foi uma estratégia para conquistar esse público”, reconhece.

 

Segundo o economista Mário Rodarte, professor do Centro de Planejamento e Desenvolvimento Regional (Cedeplar) da UFMG, a renda das famílias e do trabalho principal cresceu mais entre a população dos municípios da Região Metropolitana de Belo Horizonte, do que na capital. No mesmo período, a população de BH cresceu 6%, ante 21% nos demais municípios do entorno. Em 2000, a renda familiar em Belo Horizonte foi elevada em 30,2%, enquanto nos demais municípios da região metropolitana avançou 32,2%. Já a renda do trabalho principal cresceu 28,8% em BH e 35,9% nas demais cidades.

 

Embora os números não signifiquem que os rendimentos dos habitantes dos municípios do entorno de BH já sejam maiores que os da capital, eles mostram que o poder de consumo da periferia cresceu mais. Fenômeno parecido já vem ocorrendo em São Paulo, onde o consumo anual da capital avançou 22,9% entre 2005 e 2010, enquanto o da periferia cresceu 61,6%. No mesmo período, gastos com higiene e cuidados pessoais, entre outros itens, aumentaram muito mais nos bairros do entorno (116,7%) do que nos localizados na região central (57,1%). Os moradores populares também compraram mais móveis e utensílios para casa (86,7%) do que os da região central (33,3%).

 

Motor do consumo Em maior contingente populacional, com emprego, mais dinheiro no bolso e livre acesso ao crédito, os consumidores das classes C2 (renda familiar média de R$ 933), D (R$ 680) e E (R$ 415) contribuíram com 65% de todo o crescimento do consumo brasileiro em 2010, consolidando um novo ciclo de crescimento no qual as classes da base da pirâmide assumem um papel fundamental no futuro da economia. “Não por acaso, o varejo, que apresentou um crescimento em 2010 de 5,7% em volume e 5,5% em valor, teve como um de seus grandes propulsores os lares do nível socioeconômico C2 e baixo”, afirma Claudio Czarnobai, analista de mercado da Nielsen. E é exatamente esse público que as empresas querem atingir.

 

Crescer na periferia também foi o roteiro escolhido pelo empresário Alexandre Salvador, que abriu a Dose Natural, rede de farmácias de manipulação presente em Contagem e Betim. A opção por regiões de classe média baixa foi feita depois que uma pesquisa encomendada por ele detectou que esses locais eram carentes de farmácias de manipulação. “As pessoas saem para comprar medicamentos no Centro da cidade e isso custa caro. E, além do mais, não contavam com atenção farmacêutica. Saímos na frente e, ao mesmo tempo, trouxemos mais comodidade para a população dos bairros onde estamos operando”, explica. Hoje já são três unidades – uma no Bairro Industrial e duas em Betim – e 15 funcionários. “Começamos com quatro. Em 2005, vendíamos em torno de R$ 12 mil por mês. Hoje na nossa maior farmácia já faturamos R$ 35 mil mensais”, comemora.

 

De Lourdes para Betim

 

Outra que escolheu a rota da classe média em ascensão foi a empresária Lorena Malta Silva, que em fevereiro fechou a Twiddy Fashion, loja de roupas e acessórios femininos localizada em Lourdes, coração da Zona Sul da capital, para reabri-la em setembro em Betim. “Lá o mercado está crescendo, a concorrência é menor e temos espaço para crescer”, diz. A expansão econômica gera aumento do emprego e com ele a geografia e a estrutura do comércio vai mudando nas cidades. Até o boom do mercado imobiliário interfere nesse processo, explica Silvânia Araújo, economista da Federação do Comércio do Estado de Minas Gerais (Fecomércio). “É como a música do Milton (Nascimento), as empresas estão indo para onde o público está”.

Empresas aparentemente voltadas com exclusividade para a classe média alta também acionaram o plano periferia, como O Boticário. Fábio Attie, franqueado da rede de cosméticos há 10 anos, tem nove lojas da rede e está abrindo a décima em Ribeirão das Neves com investimento de R$ 250 mil. “Atendemos aos consumidores das classes A à D”, sustenta. O empresário reconhece que as emergentes classes C e D são peças chaves na expansão do consumo. “O item vaidade é preponderante na cesta de gastos dos brasileiros. Nosso portifólio é igual numa loja do Belvedere e numa do (bairro) Céu Azul”, garante.

 

Veículo: O Estado de Minas


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