Depois de assistir ao domínio do setor de serviços na proposição de ideias para desoneração da folha de pagamentos, a indústria finalmente encaminhou uma proposta ao governo federal - e não se preocupou em evitar polêmica. Entregue na última sexta-feira a Nelson Barbosa, secretário-executivo do Ministério da Fazenda, a proposta desenvolvida pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) é simples: a contribuição patronal de 20% do salário do empregado ao Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) deve ser zerada, apenas para a indústria de transformação, e, para que a Previdência não fique sem a receita, a Fiesp sugere aumento de impostos para todos os setores da economia, à exceção da indústria.
Elaborado pelo Departamento de Competitividade e Tecnologia da Fiesp, chefiado por José Ricardo Roriz Coelho, o estudo sugere a elevação da alíquota da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), que é recolhida pelo governo federal sobre o faturamento das empresas. Atualmente a alíquota para recolhimento da Cofins varia conforme o sistema usado pela empresa para pagamento do Imposto de Renda (IR). Na regra geral, empresas que pagam IR pelo sistema do lucro real pagam Cofins de 7,6% sobre o faturamento. As empresas que recolhem IR pelo lucro presumido arcam com uma Cofins de 3%. A proposta da Fiesp é elevar as alíquotas da Cofins para 8,33% e 3,21%, respectivamente, para todos os setores, à exceção da indústria.
Assim, avalia a Fiesp, seria possível que os demais setores da economia compensassem a arrecadação de R$ 20,3 bilhões obtida pela contribuição da indústria com os 20% sobre a folha, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
De acordo com a Fiesp, para cada ponto percentual de encargo sobre a folha que é reduzido, os investimentos da indústria aumentam 0,78 ponto percentual. Assim, ao baratear a contratação de pessoal, a desoneração integral dos 20% para o INSS poderia ampliar os investimentos da indústria de transformação em 15,3 pontos.
"É a indústria o setor que mais paga impostos no país", diz Roriz Coelho, autor do levantamento encaminhado ao governo, "nada mais natural, portanto, que seja a indústria a mais beneficiada nas discussões em torno da desoneração dos encargos sobre a folha de pagamento". Segundo a Fiesp, a indústria de transformação contribui com 36,7% dos impostos arrecadados pelo setor público, mais que o dobro que os 16% recolhidos pelo comércio e os 13,4% pagos pelo setor financeiro.
Para Luigi Nese, presidente da Confederação Nacional dos Serviços (CNS), a proposta encaminhada pela Fiesp "é, no mínimo, imoral". "Fiquei chocado quando vi uma proposta que sugere ao governo desonerar um setor e onerar todos os outros", diz Nese.
No início do ano, a CNS apresentou ao governo uma proposta de isenção da alíquota de 20% destinada ao INSS cobrada sobre a folha, que seria substituída por uma Contribuição sobre Movimentação Financeira (CMF). Esta seria cobrada de todos os setores, por meio de uma alíquota de 0,82% sobre a movimentação financeira envolvendo o pagamento de salários. Em apresentação ao Grupo de Avanço da Competitividade (GAC), em Brasília, na semana passada, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, cobrou da indústria uma proposta própria. "Precisamos ter diversas propostas para comparar", disse Mantega, segundo fontes ligadas à indústria e aos serviços presentes no encontro.
"Qual é o sentido de um setor que representa apenas 16% do PIB, e gera menos empregos que serviços e comércio, ganhe um incentivo que deverá ser pago por todos os outros?", pergunta Nese.
Para Roriz Coelho, a ideia do segmento de serviços, de "reavivar a antiga CPMF" é anacrônica. "O fim da CPMF, em 2007, foi uma conquista da sociedade. Por que agora teremos de voltar a pagar um imposto sobre movimentação financeira?", diz. Além disso, afirma, "todos sabemos que esse tipo de contribuição é mais abusiva para quem tem menos renda".
Veículo: Valor Econômico