A nova classe média já gasta mais com serviços do que com bens de consumo, revela estudo do instituto Data Popular. De cada R$ 100 desembolsados hoje, R$ 65,20 são com serviços e R$ 34,80 com produtos. Há 9 anos, as proporções entre gastos com serviços e bens de consumo estavam equilibradas. Eram de 49,5% e 50,5%, respectivamente.
O aumento do gasto com serviços da classe C, que é mais da metade (54%) da população do País, dificulta a tarefa do Banco Central de trazer a inflação para o centro da meta, de 4,5%. É que os serviços não podem ser importados para conter a alta de preços. Além disso, seus preços são influenciados pelo salário mínimo, que tem reajuste programado de 14% para o ano que vem.
"É a primeira vez que o gasto com serviços da classe C supera o desembolso com a compra de produtos", afirma Renato Meirelles, sócio diretor do instituto e responsável pelo estudo. Nos extremos da pirâmide social, no entanto, o estudo mostra que o perfil de consumo se manteve. Isto é, a alta renda continua gastando mais com serviços como proporção das despesas totais e a baixa renda, com produtos.
O trabalho considera como classe C as famílias com renda média familiar de R$ 2.295. As projeções do perfil de gastos da classe C para este ano foram feitas com base no cruzamento de dados da Pesquisa de Orçamento Familiar e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE. O estudo separa as despesas das famílias em bens e serviços num horizonte mais amplo, que inclui não só serviços livres, mas administrados, como energia elétrica, por exemplo.
Comida. Um recorte revelado pelo estudo é que a classe C desembolsa hoje mais com serviços considerados opcionais segundo os critérios do trabalho, como despesas com cabeleireiro, manicure, sapateiro, lavanderia, entre outros, do que com alimentos, que é um gasto obrigatório. Nesse caso, a proporção de gastos com esses serviços opcionais (22,6%) chega a ser quase o dobro do desembolso com a comida na casa da classe C (11,8%).
Entre os serviços com maior crescimento nos últimos cinco anos nos gastos da classe C estão manutenção do lar (211,23%), mensalidade escolar (181,23%) e viagens (158,25%). Meirelles diz que, ao equipar a casa com mais eletrônicos, a classe C gasta mais com serviços de energia.
Marcelo Neri, coordenador do Centro de Políticas Sociais da FGV, pondera que a valorização do real ajudou a mudar o perfil de consumo da classe C ao reduzir o preço dos bens transacionáveis. Mas ele ressalta que a classe C gasta mais com serviços porque também se beneficia do processo. É que o setor de serviços é o grande empregador da classe C. "A cabeleireira consegue hoje fazer turismo no Nordeste porque o penteado ficou mais caro. É um processo autofágico."
Veículo: O Estado de S.Paulo