A possibilidade de que o País sofra um processo recessivo não deve ser descartada. A avaliação é de Charles Calomiris, professor da Universidade de Columbia. "É certo que o Brasil deverá demonstrar efeitos defasados da crise. Entre os países da América Latina, é possível que tenha um desempenho menos ruim", disse o acadêmico ontem, durante seminário da Federação Brasileira de Bancos (Febraban). "Não é uma crise com as mesmas características da ocorrida na Ásia nos anos 90, mas países que produzem matérias-primas sofrerão", projetou.
Nas contas do especialista, a economia norte-americana deverá registrar contração de cerca de 10% em seu poder de consumo já durante o próximo trimestre. "É um número muito expressivo. Sou pessimista no que diz respeito a para onde vamos, pois os Estados Unidos têm atualmente uma liderança muito precária. Paulson perdeu mais de dois meses para intervir. Foi nosso pior fracasso administrativo desde a Grande Depressão", lamentou.
Para Calomiris, a crise só irá se dissipar quando houver mais clareza no valor real dos ativos imobiliários norte-americanos. "A chave é fixar e estabilizar o preço das residências. Isso pode ser feito dando incentivos fiscais ao financiamento hipotecário, explicou.
Matérias-primas em baixa
Os economistas que participaram do evento demonstraram preocupação com as duas principais formas de contágio da crise no Brasil: queda acentuada nas cotações de matérias-primas e escassez de crédito. Alta na inadimplência também está no radar "Esperamos que os valores das commodities não retornem aos patamares de 2001/2002, mas sabemos que elas não terão mais força para impulsionar a economia como estavam", afirmou Alexandre Schwarsman, economista-chefe do Banco Santander.
Um das empresas brasileiras mais sensíveis à queda na cotação das matérias-primas metálicas ´é a Vale, que aposta na força da robustez de seu caixa - reforçada por uma oferta de ações que somou R$ 19,4 bilhões - para encarar a turbulência. "O mundo está mais difícil de prever depois que trilhões sumiram sem ir para o bolso de ninguém", afirma Fábio de Oliveira Barbosa, diretor de finanças da mineradora.
Não são só as empresas que vislumbram a continuidade de um ambiente de crédito desfavorável. O encolhimento de linhas e redução de prazos são uma realidade para pessoas físicas desde a piora da crise. "O crédito, que deve fechar este ano com expansão de 25%, terá uma retração em 2009. Projetamos um crescimento de 20%", diz Uilson Melo Araújo, economista-chefe do Banco do Brasil (BB). "Também não é desprezível que, com a deterioração de fundamentos como emprego e renda, a inadimplência de pessoas físicas aumente", diz.
Novo jogo global
Para Paulo Rabello de Castro, presidente do Conselho de Planejamento Estratégico da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, a crise abre uma nova oportunidade para o País. "O que está em jogo é o regime monetário do dólar. O real faz parte desse movimento. Dessa maneira, teremos a chance de fugir da síndrome dos juros altos e ingressar em uma nova fase, de maturidade fiscal, política e social", projetou.
Rabelllo de Castro aproveitou a ocasião para criticar a postura do governo brasileiro durante a crise. "O governo demonstra uma total falta de sintonia com a população, dizendo aos consumidores que gastem em um momento em que, intuitivamente, eles sabem que não é o mais adequado para isso", disse o economista.
Veículo: Gazeta Mercantil