Inflação fica mais comportada e reage à atividade fraca

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A inflação no atacado e no varejo está cada vez mais comportada, refletindo o impacto da abrupta desaceleração da economia. Divulgados ontem, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de fevereiro e a primeira prévia de março do Índice Geral de Preços de Mercado (IGP-M) revelaram um quadro inflacionário tranquilo, em que as maiores altas são basicamente sazonais, como o reajuste das mensalidades escolares. 

 

O IPCA subiu 0,55% no mês passado, mas 60% desse aumento se deveu à elevação de 4,77% do grupo educação - sem ele, o indicador teria alta de 0,24%. Outra boa notícia é que apenas 56,3% dos produtos que compõem o IPCA subiram em fevereiro, o menor percentual desde novembro de 2007. A primeira prévia de março do IGP-M registrou deflação de 0,45%, depois de ter subido 0,42% em fevereiro. Os preços no atacado mergulharam 0,71%, devido ao tombo de 2,09% dos produtos agropecuárias e de 0,25% dos industriais. Não há sinal, nem no atacado nem no varejo, de repasse relevante da desvalorização do câmbio para os preços. 

 

O economista Francis Kinder, da Rosenberg & Associados, observa que o comportamento favorável do IPCA é disseminado: dos nove grupos que compõem o indicador, apenas dois - educação e comunicação - se aceleraram no mês passado. Ele ressalta o choque positivo nos preços de alimentos. A alimentação no domicílio, por exemplo, teve deflação de 0,11% em fevereiro, depois da alta de 0,71% registrada em janeiro. Kinder aponta o efeito da crise no resultado das cotações das carnes. Com a queda nas exportações, há um excedente de produtos para serem vendidos no mercado interno. "Com isso, os preços das carnes recuaram 2,21% em fevereiro", diz ele. 

 

O economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, chama a atenção para a deflação de 0,37% registrada pelos bens de consumo duráveis (como automóveis e eletroeletrônicos). Foi o quarto mês seguido de variação negativa desses produtos, que tendem a ser influenciados pela alta do dólar, já que têm muitos componentes importados. A demanda fraca, porém, tem impedido repasses significativos do câmbio para os preços, dizem Gonçalves e Kinder. O economista da Rosenberg cita o caso do item aparelhos eletrônicos. Depois de subir 0,67% no IPCA de janeiro, já houve queda de 0,38% em fevereiro. 

 

Kinder destaca outro exemplo, pinçado do IGP-M. Na primeira prévia do indicador de janeiro, os equipamentos de informática no atacado subiram 10,57%, uma alta forte. A questão é que esse aumento já começou a ser devolvido. Em fevereiro, houve queda de 2,71% e em março, de 0,74%. 

 

Gonçalves vê um cenário tranquilo para os preços daqui para frente, lembrando que a deterioração no mercado de trabalho deve continuar. Para ele, seguem desanimadoras as perspectivas para o consumo das famílias, que no quarto trimestre recuou 2% em relação ao trimestre anterior, feito o ajuste sazonal. Ele projeta um IPCA de 4,3% em 2009, abaixo do centro da meta perseguida pelo Banco Central, de 4,5%. Nos 12 meses até fevereiro, o indicador sobe 5,9%. 

 

O comportamento dos preços no atacado sugere um quadro tranquilo para a inflação no varejo nos próximos meses. Kinder lembra que, na primeira prévia do IGP-M de março, o grupo metalurgia básica recuou 2,18%, aprofundando a queda de 0,06% registrada em fevereiro. O tombo das cotações agropecuárias no atacado, de 2,09%, também indica um cenário positivo para a inflação ao consumidor. A soja caiu 7,83% na primeira prévia de março do IGP-M. 

 

Gonçalves também destaca o comportamento do Índice Nacional do Custo da Construção (INCC), que tem peso de 10% no IGP-M. Formado por itens basicamente não comercializáveis internacionalmente (os non tradables), o indicador mostrou forte desaceleração em março, com alta de apenas 0,16% - em fevereiro, subira 0,43%. "É mais um sinal de que a demanda está fraca", afirma ele. 

 

No momento, um dos focos de pressão mais forte sobre a inflação vem de serviços (como aluguéis, condomínio, mensalidades escolares, cabeleireiro e conserto de automóvel). Nos 12 meses até fevereiro, os serviços no IPCA acumulam alta de 7,09%. A inflação passada tem muita influência sobre itens, assim como sobre os preços administrados (como tarifas públicas). A expectativa, porém, é que os preços de serviços vão perder força daqui para frente, num quadro de deterioração do mercado de trabalho. Em fevereiro, excluindo educação, já houve uma desaceleração aí, como nota em relatório o economista Adriano Lopes, do Unibanco: o grupo passou de uma alta de 0,83% em janeiro para 0,65% no mês passado. Para Lopes, dado o cenário de atividade econômica claudicante, o cenário para a inflação é benigno, o que deve levar a reduções nas projeções de inflação nas próximas semanas. Ontem, a LCA Consultores anunciou a revisão da estimativa para o IPCA em 2009 de 4,9% para 4,6%. 

 

Veículo: Valor Econômico


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