Crescimento da África abre espaço para potências locais

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Empresas de bens de consumo estrangeiras como a Coca-Cola Co., a Nestlé SA e a Unilever PLC já atuam na África há anos sem grande concorrência das indústrias locais. Agora, as empresas domésticas estão se expandindo agressivamente pelo continente, ávidas para servir a uma classe média que cresce em meio a uma população de 1 bilhão de habitantes.

 

Entre as mais notáveis empresas de bens de consumo emergentes estão varejistas como a Nakumatt Holdings Ltd. do Quênia, a maior cadeia de supermercados da África Ocidental, a operadora de celular MTN Group Ltd., maior do continente, e a cadeia sul-africana de restaurantes Spur Corp. A Nakumatt ampliou sua atuação a três países vizinhos, enquanto a Spur, que tem 348 unidades, abriu restaurantes em sete outras nações.

 

A Nakumatt escolheu como modelo um ícone americano: a Kmart. Em uma visita à Flórida na década de 80, o fundador da empresa, Atul Shah, um ex-vendedor de colchões, percorreu a Kmart e se maravilhou com a sua limpeza. Ficou tão impresssionado ao ver que a varejista vendia alimentos, utensílios domésticos e móveis sob o mesmo teto que passou a visitar a loja diariamente por várias horas durante oito meses. A presença dele se tornou tão comum que os clientes passaram a lhe pedir informações. "Todo mundo gostava de ser atendido por mim", diz Shah.

 

Quando o comerciante retornou ao Quênia, ele abriu a Mega, uma pequena loja que vendia alimentos e alguns artigos para o lar. A loja era limpa e tinha corredores largos para facilitar a escolha, diferentemente do comércio apertado do resto do país. A cada dia, ele passou a oferecer novas linhas de produtos, incluindo móveis.

 

Shah é hoje o Sam Walton da África. O empresário americano também se inspirou inicialmente na Kmart para criar o Wal-Mart Stores Inc. Shah está vigorosamente ampliando a Nakumatt - ele abriu cinco lojas apenas nos últimos três meses - e hoje a empresa é a principal rede de supermercados do Quênia. Suas 24 lojas agradam à classe média africana que busca produtos feitos no Quênia, assim como importados da Europa, Estados Unidos e Ásia. No ano passado, o faturamento chegou a cerca de US$ 350 milhões, 76% acima do atingido em 2006, informou a empresa.

 

Shah expandiu seus negócios pelo Quênia e também tem lojas em Ruanda e Uganda. Ele também planeja abrir em breve unidades em várias cidades da Tanzânia, assim como em Burundi. Para o comerciante, a loja do Burundi vai servir como um ponto de comércio para os clientes da vizinha República Democrática do Congo. "Nós nos beneficiaríamos do comércio desses países vizinhos", diz.

 

O crescimento além-fronteiras da Nakumatt e de outras empresas é estimulado pela expansão da economia africana. O produto interno bruto do continente, que ficou pouco abaixo de US$ 1,5 trilhão em 2009, deve crescer 4,3% este ano, segundo o Fundo Monetário Internacional, ritmo só inferior ao da China e da Índia entre os mercados emergentes com enormes populações. O aumento do investimento e do comércio de empresas africanas em países do continente ajudou a amortecer os choques da crise econômica global sobre a África.

 

A expansão comercial também é em parte estimulada pelos novos bancos africanos que abriram agências por todo o continente, oferecendo o tão necessário capital para as empresas locais. O EcoBank, do Togo, tem agora agências em 27 países africanos. Na Nigéria, o GT Bank, que existe há dez anos, atua em cinco países de língua inglesa na África Ocidental.

 

Uma outra força local que está buscando explorar o mercado de jovens da África é o grupo sul-africano de mídia Strika Communications, uma empresa privada que produz a história em quadrinhos SupaStrikas, sobre um time de futebol fictício. A circulação do gibi cresceu de menos de 50.000 unidades, quando era um encarte de um jornal local, para mais de 2 milhões de cópias por mês em 21 países, principalmente por conta dos anúncios feitos por empresas africanas e estrangeiras inseridos dentro dos quadrinhos.

 

Mas ainda existem grandes obstáculos. A infraestrutura deficitária implica custos de energia mais altos e dificuldades no transporte de mercadorias entre os países. As tarifas comerciais são um estorvo que detém o investimento em novos mercados africanos. Além disso, a maioria da população da África vive bem abaixo da linha da pobreza, o que limita seu poder de compra.

 

Ainda assim, muitas empresas africanas estão encontrando formas de contornar essas barreiras.

 

A fabricante nigeriana de fertilizantes Notore Chemicals Ltd., por exemplo, foi direto aos governos para conseguir se beneficiar do crescente comércio regional e, recentemente, criou uma rede de distribuição que se esparrama por 20 países africanos de língua francesa.

 

"Na África existe o sentimento de solidariedade", diz Kola Masha, diretor-presidente da Notore, que tinha uma receita de apenas cerca de US$ 35 milhões em 2009 e que, depois de um aumento de produção, espera para 2010 um faturamento de US$ 200 milhões. "Os governos gostariam de dar apoio a outras empresas africanas."

 

Vários países estão tomando medidas para reduzir as barreiras comerciais. Nações da África Ocidental já chegaram a um acordo para a criação de uma zona regional de comércio, que passaria a vigorar este ano, reduzindo o custo na região. A franquia de restaurantes Spur, com sede em Joanesburgo, está se expandindo em áreas de veraneio ao norte do continente, tais como Namíbia, Quênia e na capital de Botsuana. A empresa fechou 2009 com vendas de US$ 22,8 milhões.

 

O MTN Group, maior operadora de celular da África, se tornou uma potência regional, com presença em 17 países, em grande parte porque está sediado no continente e foi capaz de identificar e de tirar vantagem do rápido crescimento da telefonia móvel. A empresa tem hoje 116 milhões de assinantes em 21 países.

 

Em 2009, o faturamento da MTN cresceu 9%, para cerca de US$ 15 bilhões. Para apertar o cerco ao mercado africano, a MTN recentemente fez uma oferta por ativos da rival egípcia Orascom Telecom Holding.

 

Veículo: Valor Econômico


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