Um dos mais tradicionais itens no cardápio diário do brasileiro, o feijão passa por mais um momento de forte volatilidade em seus preços. Apesar dos alimentos estarem contribuindo de forma expressiva para o aumento da inflação no Brasil, o grão entrou em uma tendência de queda que deve permanecer até o início de 2011, quando será colhida a primeira safra do ano.
Dados do Instituto Brasileiro do Feijão (Ibrafe) mostram que o preço médio da leguminosa em novembro - feijão de nota 9 em São Paulo - foi de R$ 136,05 por saca. O valor representa um recuo de 19,6% em comparação a outubro e a segunda queda mensal consecutiva. Apesar da baixa, o valor atual está em um patamar 80% acima do registrado no mesmo período do ano passado, quando a saca do feijão foi negociada a um valor médio de R$ 75.
"Em algumas praças o feijão chegou a ser negociado a R$ 240 em setembro, depois ser vendido a R$ 40 no primeiro trimestre do ano, mesmo com o preço mínimo determinado pelo governo ser de R$ 80", afirma Marcelo Eduardo Lüders, presidente do conselho do Ibrafe.
Por ter um ciclo curto e três safras anuais, a produção reage rapidamente aos estímulos de preços. As baixas cotações praticadas em janeiro (R$ 77,41) e fevereiro (R$ 78,33) desestimularam o plantio ao longo da safra 2009/10, principalmente no segundo e terceiro ciclo, que recuaram 25,4% e 5,9%, respectivamente em relação a 2008/09.
Diante da menor oferta no segundo semestre do ano, as cotações atingiram um pico em setembro e estimularam novamente o aumento do plantio. É exatamente esse crescimento esperado que está pressionando as cotações nos últimos dois meses. "E seguramente continuará. Os preços devem ir a um patamar inferior ao mínimo novamente na primeira colheita de 2011", afirma Lüders.
Os dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) indicam que a primeira safra de feijão crescerá e ficará entre 1,53 milhão e 1,58 milhão de toneladas. O volume significará um crescimento entre 4,8% e 8,5%. Já para a produção esperada para todo o ano, incluindo os três ciclos, a Conab projeta em seu último levantamento uma oferta entre 3,43 milhões e 3,49 milhões de toneladas, o que vai representar um crescimento entre 5,3% e 7% sobre o volume colhido na safra 2009/10.
Com a expectativa de queda nos preços, o feijão tende a influenciar cada vez menos a inflação, pelo menos até o início de 2011. "Nossa avaliação é que os preços vão recuar até janeiro, desestimular o plantio da segunda safra e gerar novo aumento das cotações", diz José Sidnei Gonçalves, pesquisador do Instituto de Economia Agrícola (IEA), órgão da Secretaria de Agricultura de São Paulo.
O pesquisador defende que o governo crie uma política para ajustar o fluxo de produção. Uma alternativa seria retirar parte da produção do mercado, comprando o feijão e doando a mercadoria, já que o produto não pode ser estocado. "É necessário que o governo arque com o ônus do preço para evitar essa gangorra", afirma.
Mesmo com a expectativa de queda para os preços, a produtora paulista Laura Virgínia Brisola de Faveri, não pretende reduzir a área plantada no próximo ciclo. "Toda safra é a mesma coisa. A oferta cai, o preço sobe. Depois a oferta aumenta e o preço cai. Mas o produtor que sempre plantou feijão sabe disso e não altera a área. Quem entra e sai do mercado são os especuladores", diz.
Com 600 hectares irrigados, a produtora consegue fazer três safras nas propriedades localizadas em Cerqueira César e Avaré. Com um custo entre R$ 2.800 e R$ 3.200 por hectare e produtividade entre 48 e 52 sacas, os atuais preços cobrem os gastos, mas ela lembra que é preciso estar atento ao que acontece no mercado.
No varejo os preços também já começam a recuar. Depois de focar acima de R$ 4,50 por quilo, as cotações do feijão giram hoje ao redor de R$ 3,30, nível considerado "palatável", pelo diretor de suprimentos e exportação da Camil, José Rubens Arantes. "Até março teremos um mercado estabilizado, mesmo porque haverá uma resistência maior para se vender se os preços recuarem muito mais. Se os preços não chegaram a seu piso, estão muito perto disso", afirma Arantes.
O executivo lembra que mesmo para as indústrias, as oscilações nos preços não são algo interessante. Ele lembra que depois que os preços atingiram seu pico em setembro, o volume de vendas dos meses de outubro e novembro foi 32% inferiores ante agosto e setembro. "O consumidor se assusta quando o preço rompe os R$ 4,00 por quilo", diz Arantes.
Veículo: Valor Econômico