Estar à frente de uma farmácia já é tradição na família de Paulo Vinício Andrade de Oliveira, presidente da Rede de Farmácias Econômica, de Teixeira de Freitas, extremo Sul da Bahia. Ele cresceu atrás do balcão. Desde os 12 anos ajudava os pais, primeiro com as entregas, depois no atendimento. Mais tarde, abriu a própria farmácia, a Drogaria Mais Saúde, e passou a dividir a clientela com não mais de 40 concorrentes, a maioria deles de pequeno porte, em todo o município.
Há dois anos, porém, o cenário mudou. A perspectiva da chegada das grandes redes à região levou Oliveira e 30 outros donos de farmácia a pensar em uma estratégia que garantisse a sobrevivência dos negócios.
Com a ajuda do Sebrae da Bahia, eles criaram em junho de 2009 a Rede de Farmácias Econômica, com 26 associados, de cinco municípios baianos. Além de Teixeira de Freitas, também fazem parte do grupo as cidades de Posto da Mata, Nova Viçosa, Itamaraju, Eunápolis e Itabela.
"Fizemos boas ações em grupo, como a campanha 'Aqui tem medicamento genérico a preço de fábrica'", conta Oliveira. Outras ações, diz ele, foram "o folheto de ofertas com 60 itens de uso contínuo e, principalmente, compras conjuntas que nos ajudaram a aumentar nosso poder de barganha junto aos fornecedores", afirma.
Em outubro do mesmo ano, a temida promessa se confirmou. A primeira grande rede desembarcou na região. A Pague Menos chegou agressiva na oferta de crédito, disposta a conquistar mercado. Num primeiro momento, a Rede Econômica perdeu espaço, mas tratou rapidamente de resgatar uma velha prática de sucesso comprovado no passado: a de chamar o cliente pelo nome, perguntar sobre a família, conversar e deixar a pessoa se sentir valorizada, bem atendida. Ou seja, reforçou o atendimento personalizado.
Paralelamente, o grupo ampliou o Disk Entrega, que passou a ser gratuito, disponibilizou os serviços de correspondente bancário e implantou o sistema de acompanhamento em domicílio. O que isso significa? Que o próprio farmacêutico visita seus clientes, pelo menos uma vez ao mês, para conferir se os remédios estão sendo tomados na hora certa, se estão bem armazenados e sanar eventuais dúvidas.
"Os resultados não demoraram a aparecer, aos poucos fomos recuperando as vendas e a participação no mercado", afirma Oliveira. Há três meses, contudo, a rede se viu obrigada a descredenciar alguns varejistas que não faziam a lição de casa e acabavam por comprometer o resultado do grupo.
"Hoje, somos 15 associados que juntos movimentam cerca de R$ 1,5 milhão por mês", revela o executivo. "Sozinhos, dificilmente teríamos passado sem grande comprometimento pelas mudanças do perfil do mercado. Juntos, não apenas enfrentamos um concorrente gigante, como também contratamos uma agência especializada para criar nossas campanhas de marketing e padronizar o layout das lojas", conta Oliveira. Ele diz que sobrou até um tempinho extra para se dedicar aos estudos. Oliveira cursa o quarto período da faculdade de Farmácia.
Somar forças, sem dúvida, é um dos segredos para a sobrevivência das farmácias independentes e também das pequenas redes frente à nova realidade do mercado farmacêutico, desenhada com maior impacto nos últimos três anos. Há pouco mais de uma década, o segmento crescia sob os olhos do dono, com o farmacêutico fundador atrás do balcão vendendo medicamentos e ministrando pequenos atendimentos clínicos.
Mas essa realidade se transformou. No início dos anos 2000, os grandes negócios ganharam força, deslancharam e abriram caminho para o surgimento de redes gigantes com atuação em território nacional.
Maiores e mais bem abastecidas, graças à legislação que permitiu às farmácias vender um leque variado de produtos, as novas redes passaram a dar mais dinheiro do que muitos setores do varejo. Além disso, mudaram o perfil do próprio ponto de venda, transformando-se também em centros de beleza e bem-estar. Da iluminação ao layout, tudo foi mudado.
A soma de todos esses ingredientes engordaram o faturamento do setor, o suficiente para chamar a atenção dos fundos de investimento e iniciar o processo de fusões e aquisições. Da associação entre a Drogasil e a Droga Raia, por exemplo, surgiu o sétimo maior grupo de varejo do Brasil, com uma receita bruta de R$ 4,1 bilhões por ano.
O setor como um todo também respondeu positivamente ao novo momento. As 64.302 farmácias e drogarias espalhadas pelo país movimentaram no ano passado R$ 36 bilhões, com estimativas de crescimento 13,9% em 2011. As chamadas farmácias independentes, na maioria das vezes com uma única loja, responderam por 49% das vendas, enquanto as redes médias somaram 13% e as 26 maiores redes, associadas à Abrafarma, 36%.
"Trata-se de um setor extremamente pulverizado, que passou por um processo de profissionalização na última década e que a cada dia ganha um novo perfil com a expansão das redes regionais e a união dos grandes players de atuação nacional", afirma Alberto Serrentino, sócio da Gouvêa de Souza GS&MD consultoria de varejo. É justamente nas mãos das 26 maiores redes do setor, com um total de 3.498 lojas - o equivalente a 6% do número de pontos de venda do Brasil -, que está 36% do mercado em unidades vendidas em 2010 e 36,5% do volume de faturamento. A batalha em busca do bolso do cliente é desafiadora.
Para os pequenos negócios, segundo Serrentino, há dois cenários: atuar nos mercados periféricos, porque o Brasil é muito grande e a faixa de pequenos municípios não abriga grandes operações; e, nas grandes cidades e capitais, crescer em forma de associações ou manter a atividade em bairros e pontos onde as grandes redes não penetram.
No novo modelo, os distribuidores não só respondem por 58% do movimento do setor, como também funcionam como estoque de alto giro para os pequenos, que tendem a aumentar seu mix de produtos em decorrência das compras coletivas feitas pelas centrais de negócio.
"Seja qual for a opção, nas pequenas ou grandes cidades, todas as farmácias precisam se modernizar, colocar um pé na internet e ampliar a gama de serviços", reforça o consultor. "Esse é um segmento que tem muito espaço para ganhos em produtividade e eficiência, índices essenciais para quem quer enfrentar os gigantes com competitividade", afirma.
Veículo: Valor Econômico