Pedro Eugênio, um jovem nascido em São Carlos (SP), fundou a sua primeira empresa aos 16 anos de idade: o provedor de internet TopNet, que em 1999 foi vendido para o Terra. Autodidata em tecnologia da informação, Eugênio formou-se em publicidade e propaganda pela Faculdade Belas Artes. Em 2006, aos 29 anos, decidiu tentar um novo negócio e criou o Busca Descontos, um site que faz comparação de preços com foco apenas ofertas e descontos.
"Começou como um "hobby", mas em 2010 a procura pelo site aumentou muito. Então, decidi largar o emprego e me dedicar só à empresa", afirma o empreendedor. Após cinco meses de dedicação exclusiva, a Busca Descontos recebeu um aporte do grupo francês LeadMedia para acelerar seu processo de expansão. A empresa tem atualmente 3 milhões de usuários cadastrados. As vendas geradas pelo site em uma promoção feita no dia 25 de novembro movimentaram R$ 17,2 milhões.
Pedro Eugênio é o retrato do empreendedor de tecnologia da informação no Brasil na atualidade. Uma pesquisa encomendada pelo grupo RBS e realizada pela M. Sense Pesquisa e Inteligência de Mercado com 770 empreendedores digitais revelou singularidades no perfil do empresário digital que contrastam com o perfil médio do empreendedor brasileiro e do empresário do Vale do Silício, nos EUA.
Cenário mostra predominância de homens na faixa de 20 a 30 anos, das classes A e B e com superior completo
O estudo indica que a maioria dos empreendedores digitais pertence às classes A e B (86% do total), são do sexo masculino (75%), mora em São Paulo (62%), tem idade entre 20 e 30 anos (61%) e possui nível superior completo (67%, sendo que 21% fizeram pós-graduação).
Esse perfil apresenta características um pouco mais sofisticadas que as do perfil médio do empreendedor brasileiro, descrito em outra pesquisa do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). Por esse outro estudo, os homens ainda são maioria, mas com uma predominância menor, de 52,4%. A faixa de idade também é menos concentrada: 31,4% dos empreendedores totais do país têm entre 25 e 44 anos, sendo que a faixa de 25 a 34 anos representa 16,7% do total. Os empresários das classes A e B respondem por 19,2% do total e 22,2% possuem graduação e pós-graduação.
Para Fabio Bruggioni, executivo-chefe de internet e mobilidade do grupo RBS, o perfil diferente do empreendedor digital está relacionado à natureza do setor, que é relativamente jovem - os computadores pessoais chegaram às residências na década de 80 no Brasil; a internet e os celulares, na década de 90. Bruggioni observa que nos anos 70 nem havia faculdades de computação no país. "As pessoas mais jovens acreditam mais na tecnologia porque convivem mais com ela", acrescenta.
O fato de o setor de TI ser jovem no país explica, na opinião de Bruggioni, por que apenas 15% dos empreendedores cursaram ciência da computação. Entre os cursos mais frequentados estão comunicação social (32%), administração de empresas (14%), design gráfico/digital (9%) e engenharia (8%). "O que move esses empreendedores é a paixão pela área digital", avalia o executivo.
Igor Senra, cofundador do Moip Pagamentos, serviço de pagamentos on-line, faz parte do grupo de jovens que migrou para a área de TI. Senra formou-se em administração de empresas no Centro Universitário UNA, em Belo Horizonte, e trabalhava na área de sistemas de inteligência artificial da Cemig. Aos 29 anos, decidiu investir seus recursos na fundação da empresa. "Tinha interesse em um negócio que fosse escalável e que desse um retorno interessante com pouco investimento", afirma.
O Moip foi criada na incubadora Funsoft e foi transferida para São Paulo há três anos. A empresa recebeu aportes dos grupos iG, Ideiasnet e Arpex Capital. Para este ano, a empresa prevê uma receita próxima de R$ 30 milhões, ante R$ 16 milhões no ano passado. O crescimento mais acelerado, diz Senra, só foi possível com a mudança para São Paulo. "A base de clientes potenciais é maior e as empresas de São Paulo estão mais abertas a inovações", afirma o executivo.
O fato de São Paulo apresentar um mercado mais amplo e disposto a novidades atrai mais empreendimentos digitais ao Estado, segundo a pesquisa do M.Sense. Do total de empresas de tecnologia digital, 62% estão em terras paulistas e 10% estão no Rio Grande do Sul.
Nas regiões Sudeste e Sul, a população não só apresenta mais interesse pela tecnologia, mas também a consome mais. Um dos fatores que explica esse cenário é uma maior concentração das classes A e B nessas regiões. Bruggioni, da RBS, considera que esse contato mais próximo com as tecnologias faz com que as classes A e B também vejam o setor como uma opção de investimento, mais do que as outras classes veem. "Provavelmente, em cinco a dez anos empreendedores de outras classes sociais chegarão ao mercado e haverá mais equilíbrio", avalia Bruggioni.
Fernando Okuma é um exemplo. Paulistano, formou-se em economia e finanças pela University of Pennsylvania, nos Estados Unidos. Trabalhou no JP Morgan, nos EUA, e na McKinsey & Company, na Austrália. Voltou ao Brasil porque decidiu abrir a própria empresa e começou a estudar direito na USP. Lá conheceu Alan Kajimoto e Bruno Yoshimura, que estudam ciência da computação. Juntos, fundaram a Kekanto, rede social de compartilhamento e classificação de estabelecimentos comerciais. "Era um nicho de mercado que inexplorado e sempre foi meu sonho criar uma empresa do zero", afirma.
A Kekanto também obteve êxito em sua área. Em novembro, a rede social recebeu um aporte de "alguns milhões de dólares" dos fundos de investimentos Accel Partners e Kaszek Ventures. A Kekanto tem 3 milhões de visitantes únicos e 300 mil usuários cadastrados
Perfis como os de Okuma são comuns em TI, mas começam a despontar empreendedores sem esse perfil clássico, mas que também alcançam êxito. Marco Gomes está entre esses empreendedores. Nascido em Gama, cidade próxima a Brasília, Gomes sempre estudou em escola pública. Quando cursava a faculdade de ciência da computação, na Universidade de Brasília (UnB), fez um projeto para gestão de publicidade em redes sociais em 2006. O projeto foi publicado na internet e ganhou a atenção do portal de tecnologia americano Tech Crunch, considerado uma referência para o setor de TI.
"Como meu projeto chamou a atenção de investidores, decidi abandonar a faculdade e abrir a empresa, para não perder a oportunidade", afirma Gomes. Com 20 anos de idade, ele mudou-se para São Paulo e fundou a Boo-Box, empresa de tecnologia para publicidade e mídias sociais. A empresa classifica o público de 200 mil sites para selecionar anúncios para produtores de conteúdo on-line.
Como todo fundador de empresa novata, Gomes passou por dificuldades, principalmente financeiras. Em 2007, no entanto, a companhia recebeu um aporte de US$ 300 mil do fundo de investimentos Monashees Capital. Em 2009, a empresa começou a gerar receita e, no ano passado, tornou-se lucrativa. Foi também em 2010 que a Intel Capital selecionou a Boo-Box e outras 17 iniciantes em 11 países para fazer um aporte total de US$ 77 milhões. O recurso investido na Boo-Box é estimado em US$ 5 milhões. "Com a entrada do capital, a empresa cresceu quatro vezes de maio a outubro. Agora estamos bem", afirma Gomes.
Veículo: Valor Econômico