O gerente de recursos humanos Márcio Rodrigues da Silva, 37 anos, sabe exatamente quanto tem que pagar pelas parcelas do imóvel que comprou na Lapa, zona oeste de São Paulo, a ser entregue em 2011. Dono de casa própria, ele não vê problema em se endividar um pouco mais e usar a primeira parte do 13º salário para adquirir uma TV de LCD (tela de cristal líquido) de 42 polegadas, que custa mais de R$ 5 mil. "Se for parcelado, cabe no orçamento", diz ele, que estava na manhã de sexta-feira na megastore do Ponto Frio, em São Paulo.
Silva estava comprando um multifuncional - aparelho que reúne impressora, "scanner" e copiadora, em quatro vezes no cartão. Assim como ele, muitos brasileiros permanecem imunes à turbulência global que sacode o mercado financeiro e faz com que as empresas revejam suas estratégias. Para esses consumidores, este é o momento de preparar a casa e comprar presentes.
Os varejistas, por sua vez, apostam em produtos que evoluíram em tecnologia, e preço, em relação ao Natal passado. A TV de tubo de tela plana anunciada em dezembro de 2007, por exemplo, cedeu lugar ao aparelho de LCD de alta definição acima de 30 polegadas. E o sonho de instalar um computador de mesa (desktop) se transformou na vontade de ter um microcomputador portátil, ou notebook, de preferência com alta velocidade de conexão.
"O crédito para o setor produtivo apertou, mas ainda está disponível para o consumidor", diz Marcelo Lopes, diretor da cadeia de suprimentos do Grupo Pão de Açúcar, que neste Natal aumentou de dois para seis o número de centros de distribuição (CDs) sazonais instalados para apoiar os 18 fixos. Neste processo adicional de estocagem, o grupo está investindo R$ 20 milhões.
No Extra, a bandeira do Pão de Açúcar para eletroeletrônicos, eletrodomésticos e eletroportáteis, cerca de 40% do mix estará em oferta neste final de ano, com descontos entre 30% e 40% à vista. Em itens de maior valor, como computadores e TVs, a rede vai oferecer parcelamento em 15 vezes sem juros. "Só em TVs de LCD, vamos dobrar o volume em relação ao Natal passado", diz Ramatis Rodrigues, diretor executivo do grupo.
O Carrefour também tem metas ousadas para os eletrônicos top de linha. "A receita das categorias de computadores e TVs será alavancada em até 45% neste fim de ano a partir da venda de notebooks e dos aparelhos de plasma e LCD", diz Luiz Fernando Rego, diretor da divisão eletro do Carrefour. A varejista francesa e a Casas Bahia acreditam que a venda de TV de plasma, que despontou em 2007, vai crescer este ano. Tanto LCD quanto plasma são tecnologias de alta definição de imagem mas, para especialistas, o plasma será superado pelo LCD, que oferece mais qualidade e é mais barato para produzir. "Apesar de ser bem mais cara, prefiro a LCD à TV de plasma, que deixa 'manchas' na tela", diz Silva, cliente do Ponto Frio.
A rede carioca, controlada pela Globex, está empenhada em convencer o consumidor a fazer novas dívidas com o 13º salário. Acaba de lançar a promoção "Descontaço", que abrange todas as categorias. "Temos uma câmera digital de cinco megapixels, por exemplo, que passou de R$ 299 para R$ 120", diz a diretora de marketing do Ponto Frio, Valéria Carreti. O megapixel indica quanto a imagem pode ser ampliada; hoje, as câmeras mais avançadas têm 13 megapixels.
Por conta do dólar, o preço dos itens de informática subiu até 15% na rede, diz Marcos Vignal, diretor comercial do Ponto Frio. O executivo, porém, diz que a alta já foi assimilada e que a discussão sobre a crise mundial ainda não causa impacto sobre as vendas.
"O clima lúdico do Natal tende a desviar a atenção do público do assunto", diz Vignal, que aponta o período entre a segunda quinzena de novembro e a primeira semana de dezembro como o tempo em que o consumidor "arruma a casa". "Depois disso, ele parte para os presentes", diz o executivo, que vem observando demanda em ascensão por outros produtos mais sofisticados, como lavadora de roupa, geladeira "frost free" (que dispensa degelo) e fogão cooktop (de mesa).
Em teleconferência com analistas na sexta-feira, o presidente do Ponto Frio, Manoel Amorim, disse que, a 40 dias do Natal, alguns varejistas ainda travam queda-de-braço com a indústria e não têm garantia de fornecimento para a data. As maiores pressões vêm da informática, que repassou um dólar de R$ 2,10 para os preços, disse. "O Ponto Frio decidiu aceitar os reajustes a entrar numa guerra". A rede exigiu, porém, três contrapartidas: fornecimento preferencial para o Natal, prazos mais longos de pagamento e "proteção de margem de lucro". Nessa última cláusula, a rede quer que o fornecedor lhe garanta descontos caso algum concorrente "faça gracinhas com o preço", disse Amorim.
Pronta para entrar com campanhas massivas em São Paulo e no Rio para anunciar as duas megalojas Super Casas Bahia, que estreiam dia 21 em São Paulo e dia 5 no Rio, a líder do varejo no país está certa de que os "produtos de alta tecnologia" terão demanda garantida neste Natal. No Rio, a primeira edição do evento terá como garoto-propaganda o ator e cantor Evandro Mesquita. (Com Claudia Facchini)
Veículo: Valor Econômico