Em 2011 o Brasil consumiu 1,2 bilhão de litros de sorvete, 8% mais que em 2010. Significa que neste ano cada brasileiro deve consumir em média 6,2 litros. Ronaldo Brizola, diretor financeiro da Associação Brasileira da Indústria de Sorvetes (Abis), afirma que o número pode dobrar nos próximos anos, colando o consumo brasileiro à média europeia. De 2003 a 2011 o mercado nacional de sorvetes cresceu 70%.
A indústria brasileira de sorvetes faturou US$ 2,1 bilhões em 2011. Enquanto no plano nacional as gigantes Nestlé e Unilever dominam, na segmentação regional as sorveterias locais abocanham fatias expressivas do mercado. A razão disso é a proximidade entre a produção e o paladar do cliente.
Na Amazônia o calor ajuda, mas é o açaí a locomotiva do setor. "O açaí é a base da alimentação do povo", explica Armando Laiun Filho, sócio-proprietário da Sorveteria Cairu, de Belém (PA). Na Amazônia, é consumido nas refeições com farinha ou beiju molhado e peixe frito.
A Cairu começou há quase meio século, vendendo picolés. Hoje trabalha com 55 sabores, dos quais 20 regionais. São frutas, como o taperebá, bacuri, murici, uxi, araçá e graviola, e misturas como o carimbó, de castanha com cupuaçu, e o paraense e mestiço, ambos com feitos açaí e tapioca. Dos mais vendidos, apenas o chocolate não pertence ao mix amazônico. "Os sabores com açaí são os mais procurados", afirma Laiun.
A empresa tem 155 funcionários e chega a produzir 10 toneladas de sorvete por dia para 14 lojas próprias. Os sorvetes de massa custam em média R$ 4 e os picolés, R$ 1,50. As vendas oscilam com o termômetro: "Na chuva caem de 30% a 40%. No verão, aumentam, e chegam a dobrar em julho; em outubro chegam a triplicar com o Círio (de Nazaré)", conta Laiun. O empresário calcula que, no ano passado, vendeu 500 mil litros de sorvete e projeta um crescimento de 20% em 2012.
Fora do Pará a empresa fornece para Manaus, mantém uma pequena fábrica no Rio de Janeiro, que distribui o produto na cidade e em São Paulo. A Cairu mira o mercado do Nordeste no futuro, por meio de franquias.
O slogan da Sorvete Glacial de Manaus (AM) é "A fruta gelada". Com essa proposta a pequena sorveteria, criada por um casal de origem portuguesa nos anos 80, tornou-se líder no mercado local e tem hoje 200 funcionários, 12 lojas próprias e 500 revendedores com freezers da marca na capital e em 10 municípios do interior do Amazonas. No semestre mais quente do ano, a sorveteria pode produzir até 20 toneladas por dia e mantém a média entre cinco e seis toneladas no período das chuvas.
Para competir com sorvetes 'soft' e marcas locais e nacionais, a Glacial mantém um mix de produtos com preços entre R$ 2 e R$ 30. "Atendemos da classe D à A", afirma José Antônio Lóio, sócio-proprietário e filho dos fundadores.
A sorveteria trabalha com 50 sabores. Os regionais oscilam entre 25 e 28, de acordo com a estação e a safra. "O amazônica tem uma grande preferência pelos sabores regionais", garante Lóio. Açaí, tucumã e cupuaçu batem os sabores tradicionais tanto no palito quanto na massa.
A empresa olha para o segmento turístico de maneira especial. Antes da Copa de 2014, vai abrir três novas sorveterias. Está presente no aeroporto, hotéis e restaurantes, e mantém parcerias com empresas e governo para associar o produto à Amazônia. A boa aceitação levou a empresa a buscar hoje parceiros fora do Amazonas para expandir a marca.
A preferência do mercado pelos sabores locais se confirma em empresas de menor porte. A sorveteria Acre-Bom de Rio Branco (AC) tem duas lojas e produz em média 1300 picolés e 200 quilos de sorvete ao dia. São 38 sabores de picolé e 30 de massa.
A sorveteria é uma das mais antigas e tradicionais na cidade e pratica um preço um pouco acima da concorrência. "A qualidade não é a mesma. Trabalhamos com 100% de fruta, sem corante", justifica João Paulo Marques, administrador da Acre-Bom. Marques é casado com Manoely Vasconcelos, neta do fundador da empresa, Lauro Vasconcelos.
Antes de tornar-se um dos mais tradicionais sorveteiros do Acre, Vasconcelos deixou os seringais onde nasceu e foi para Brasileia (AC), onde criava receitas com os frutos regionais. Para fazer os primeiros sorvetes usou goma de mandioca como emulsificante e clara de ovo para estabilizar a massa. O acerto do "Seu Lauro" há 40 anos é a razão do sucesso das sorveterias da Amazônia e da Acre-Bom. Os sabores mais vendidos são o açaí com leite e o abacaxi com pedaços da fruta.
"Quanto mais você aproxima um produto da sua origem, maior é a satisfação", resume Cristiano Amorim, administrador da ' Gelateria Dois-Noventa ', a primeira em estilo italiano de Boa Vista (RR). A gelateria trabalha com sabores locais, como graviola e taperebá. Até regionalizou a tradicional 'panna cotta' italiana, acrescentando castanha do Pará e doce de leite. Inaugurada há um mês, a 'Dois-Noventa' já tem um campeão de vendas. Nenhuma novidade: é o açaí.
Veículo: Valor Econômico