Os tecidos tecnológicos, aqueles com tratamentos especiais para cumprir determinadas funções, utilizados, por exemplo, na prática esportiva e na área de saúde, já não são mais garantia de proteção para os fabricantes brasileiros contra a competição com produtos importados. Indústrias que atuam neste segmento, como a Santaconstancia e a Tecelagem Panamericana já sentem o impacto da entrada de produtos acabados chineses no País, que leva à queda do consumo de tecidos pela indústria de confecção.
O ano de 2012 começou mal para o setor têxtil brasileiro, que vê o déficit de sua balança comercial aprofundar-se. De janeiro a março deste ano, a diferença entre exportações e importações foi negativa em US$ 1,4 bilhão, 23,7% acima do US$ 1,1 bilhão registrado em igual período de 2010. Os produtos chineses representaram 54% do total importado no primeiro trimestre, somando US$ 960 milhões.
A paulistana Santaconstancia, que possui seis fábricas na zona norte da capital, é um exemplo de como estes números afetam a realidade do setor. A empresa reduziu em 8% seu quadro de funcionários, de cerca de 700 trabalhadores em 2011, para 640 em março deste ano. Com capacidade produtiva de 600 toneladas ao mês, a companhia não revela sua atual taxa de ocupação, nem o quanto faturou no último ano. "Só posso falar que teve um declínio", afirma o diretor da empresa, Luca Pascolato.
"O que mais atrapalha hoje o Brasil no mercado têxtil é a entrada de roupa pronta", opina o empresário. De acordo com ele, o segmento de moda é o mais afetado, mas mesmo em roupas esportivas já há competição. "Eles têm imitações que não são tão boas quanto as nossas, mas uma boa parte do mercado acaba se seduzindo pelo preço e abre mão da tecnologia", relata.
Ainda assim, diz ele, os tecidos tecnológicos ainda são um diferencial importante. "Sé nós estivéssemos focados numa produção commodity, a realidade da empresa seria bem pior", pondera. A companhia concluiu em 2011 um ciclo de investimento de cinco anos, com financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). "A fábrica está pronta para quando [a demanda] retomar, nesse sentido estamos à frente de empresas que ainda não investiram", avalia.
Para 2012, a companhia espera apenas repetir o faturamento do ano passado, mas em 2013, Pascolato projeta um cenário melhor. "Em alguns períodos, as pessoas investem mais em móveis, eletrodomésticos, aparelhos eletrônicos, aí com o aumento do endividamento, tendem a ir para bens de consumo de menor valor, como roupas. É todo um ciclo macroeconômico que indica que, a partir de 2013, tende a melhorar o mercado têxtil", explica.
A Tecelagem Panamericana, com uma planta em Santa Bárbara D'Oeste (SP) e capacidade produtiva de 3 milhões de metros de tecido ao ano, também prevê crescimento para os próximos anos para o mercado de tecnológicos, que deverão passar a representar 35% do seu portfólio em 2012, ante 25% de participação no ano anterior.
Para isso, está investindo para obter homologação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para seus tecidos, utilizados em uniformes da área de saúde.
A companhia, que emprega 128 funcionários, registrou crescimento de 15% em seu faturamento em 2011, sendo 7% em valor e 8% em volume. "Para esse ano estávamos prevendo um avanço de mais 15%, mas do jeito que começou, está difícil até de repetir o que fizemos no ano passado", relata o diretor da empresa, Carlos Jorge Leitão.
O executivo conta que costumava acreditar que a fabricação de produtos exclusivos deixaria a empresa resguardada da competição com chineses, mas recentemente, mudou de opinião. "Estou preocupado com isso, parece que eles já estão desenvolvendo produtos exclusivos lá, o produto da China não é mais aquele ruim, eles melhoraram muito", afirma.
De acordo com ele, os chineses já estão produzindo com modelagem brasileira, ganhando espaço entre varejistas que antes não se davam bem com importados. Além disso, a indústria de confecção, que também enfrenta dificuldades - em 2011, o segmento registrou queda de produção física de 4,4% - também passa a consumir menos tecidos brasileiros. "O confeccionista, que trabalhava com, em média, 70% de importados e 30% de produtos nacionais, numa época como essa, que está muito difícil, o primeiro que ele deixa de comprar é o nacional, porque é mais caro."
Para mudar este cenário, apenas os incentivos previstos no Plano Brasil Maior não bastam, acredita o presidente do Sinditêxtil-SP, Alfredo Bonduki. "O plano caminhou na direção correta, mas para que tenha efeito sobre o setor, é importante que venha acompanhado de fortes medidas de defesa comercial", afirma.
Veículo: DCI