Mudança na cobrança de ICMS deve aumentar preço de cosméticos e produtos de higiene

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Inclusão de novos itens em regime de substituição tributária do Rio reacende batalha entre empresários e o Fisco


A inclusão de dezenas de novos produtos em um modelo diferenciado de arrecadação de impostos no Estado do Rio, que entrou em vigor na última quinta-feira, reacende uma batalha travada entre empresários da indústria e do varejo e o Fisco que deve, ao fim, fazer o consumidor pagar mais pelo que compra no dia a dia.

A secretaria estadual de Fazenda pôs mais de 50 itens de cosméticos, perfumaria, higiene pessoal e toucador, além de mamadeiras, sob um regime conhecido como substituição tributária. Por esse modelo, em vez de o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) ser cobrado em cada uma das etapas que o produto percorre entre a fábrica e as gôndolas dos mercados, ele é recolhido apenas por um contribuinte.

Esse contribuinte, que pode ser a fábrica ou a distribuidora (nunca o varejo) dependendo do produto, assume a responsabilidade de pagar o tributo por toda a cadeia, mas repassa o valor para o produto que vende ao varejo. Assim, todos os envolvidos pagam o imposto antecipadamente: o fabricante precisa recolher o ICMS antes de distribuir o item, e o varejo paga mais caro antes de poder vendê-lo aos consumidores. Quando a regra entrou em vigor, as companhias tiveram inclusive que pagar o imposto antecipadamente pelos produtos do seu estoque — mas o governo permitiu que o valor fosse parcelado em até 12 meses.

O secretário de Fazenda, Renato Villela, argumenta que a substituição tributária é importante pois, ao concentrar a arrecadação em menos contribuintes, aumenta a eficiência do Fisco e reduz a sonegação. Isso porque são necessários menos fiscais para combater o crime em um punhado de fábricas do que em cada um dos milhares de pontos de venda no varejo.

Mas o empresariado acusa o regime de ser responsável pela elevação do preço final dos produtos e de dificultar a vida das micro e pequenas empresas, que alegam não ter capital de giro suficiente para pagar o imposto antecipadamente. Além disso, reclamam de exagero na implantação do regime, que já abrange cerca de 500 produtos, segundo a Firjan.

‘Empresas sérias pedem o regime’, diz secretário

Segundo a advogada-chefe da Divisão Tributária da Firjan, Cheryl Berno, o preço final do produto na substituição tributária aumenta por dois motivos. Como o varejista pode levar até vários meses para vender o produto depois de o tributo ter sido pago, ele procura elevar seu caixa. Além disso, a Fazenda calcula o valor do imposto com base em uma estimativa do preço final dos artigos. Mas a advogada afirma que essas estimativas costumam ser infladas. No caso dos produtos recém-incluídos, Cheryl diz que foi levado em conta a estrutura de preço praticada em São Paulo:

— Como os preços em São Paulo são maiores, o imposto cobrado aqui acaba sendo maior, o que induz a um encarecimento dos produtos — explica ela, que não sabe estimar, porém, de quanto será esse aumento.

O secretário de Fazenda diz que, por lei, o estado só pode estimar o preço final — tecnicamente chamado de Margem de Valor Agregado (MVA) — com base em pesquisas de mercado ou na experiência de outros estados. Renato Villela diz que o Rio já se prepara para encomendar pesquisas, mas recorre, por enquanto, a protocolos de outros estados no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). E ele nega que a substituição tributária leve necessariamente a aumento de preços.

— Em alguns setores houve até redução de preços — assegura o secretário, que não informa, no entanto, a quais setores se refere.

— As empresas sérias, que pagam imposto, costumam nos pedir a substituição tributária para os seus segmentos, pois são prejudicadas pela concorrência desleal dos sonegadores. Eu não estou dizendo que quem está reclamando é sonegador, mas muita gente séria é a favor da medida.

Arrecadação de ICMS cresce 13,1% em 1 ano

A indústria de cosméticos reclama do prazo exíguo que foi dado para adaptação. O decreto 43.889, que incluiu cosméticos e produtos de higiene na substituição tributária, foi publicado em 15 de outubro e entrou em vigor em 1º de novembro — mas houve audiência pública na Assembleia Legislativa (Alerj) sobre o tema. A Firjan e os empresários do setor tentaram adiar a mudança, mas não conseguiram.

— É uma tragédia pra gente. O prazo pequeno causa transtornos nas empresas, sobretudo nessa época em que todos estão fazendo estoque para o Natal. Vai haver desordem. Além disso, o comerciante tem dificuldade de entender a regra nova e eleva os preços — reclama Celso Dantas, presidente do Sindicato da Indústria de Produtos Cosméticos e Higiene Pessoal (Sipaterj).

— A substituição tributária tem eficácia discutível e traz injustiça porque impõe regras semelhantes (de formação de preço) para empresas que não funcionam da mesma forma.

A substituição tributária tem ajudado a elevar a arrecadação. No ano passado, o recolhimento de ICMS cresceu 13,1%, atingindo R$ 57 bilhões. Mas a Fazenda ressalva que outros fatores relevantes contribuíram para esse crescimento, como o aquecimento da economia, a abertura de concursos que dobraram o número de auditores fiscais e investimentos em tecnologia.

Para deputado, Fazenda fez da exceção a regra

— O problema é que o governo fez da substituição tributária, que deveria ser exceção, uma regra. O recurso deveria ser usado apenas em produtos em que há problema grave de sonegação, mas hoje abrange centenas de itens. Para a Fazenda é ótimo, pois ela antecipa suas receitas — afirma o deputado estadual Luiz Paulo (PSDB), presidente da Comissão de Tributação da Alerj.

— E é claro que ela tem impacto no preço final do produto.

Segundo o advogado Alexandre da Cunha Ribeiro, do Instituto dos Advogados do Brasil (IAB), substituição tributária é usada no Brasil desde o fim da década de 1960 e era focada em artigos com preço tabelado, em que era possível saber de antemão o valor exato do imposto final, sem precisar recorrer a estimativas.

Advogado sugere que pequenas empresas fiquem de fora

Segundo a Fazenda, o regime foi instituído no Rio em 1985 e hoje já atua sobre centenas de itens, de cigarros a artigos musicais. Em junho, o governo do Estado fez uma alteração na regra de substituição tributária que, segundo Villela, permite que o regime seja imposto em uma cesta muito maior de produtos. Isso porque, até então, havia um teto para a MVA. Logo, não compensava aplicar a substituição tributária em muitos produtos com alto valor agregado. A mudança é um dos fatores que impulsiona o aumento da lista de artigos sob o modelo.

Para Cunha Ribeiro, o maior problema do uso exagerado do regime é seu efeito sobre as pequenas empresas, que são obrigadas a pagar o ICMS antes mesmo gerar a receita com as vendas. Ele sugere que se tire as firmas que pagam Super Simples da substituição tributária.

— O Simples não representa nem 3% da arrecadação de ICMS do Rio. Então, não tem sentido se preocupar com isso. Essas empresas podem muito bem pagar o imposto da forma tradicional, sem ser por substituição tributária — recomenda o tributarista, que também acredita que o regime encarece o valor dos produtos.



Veículo: O Globo - RJ


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