No momento em que sofre pressão dos investidores para reduzir seu elevado endividamento e pagar seu passivo de curto prazo, a Marfrig anunciou ontem mais uma etapa da reestruturação de seus negócios. O ex-diretor financeiro global da Cargill Sérgio Rial assumirá em dezembro o cargo de CEO da principal divisão do grupo, a Seara Foods, que reúne as operações de aves, suínos e alimentos processados.
A indicação do executivo também antecipa outro anúncio aguardado pelo mercado financeiro. Rial comandará a própria Marfrig a partir de 1º de janeiro de 2014. A escolha de um novo CEO para o grupo atende a uma regra do Novo Mercado da BMF&Bovespa, pela qual não pode haver sobreposição dos cargos de CEO e presidente do conselho de administração. As companhias listadas no Novo Mercado têm até maio de 2014 para se enquadrar na regra. Na Marfrig, as duas funções são exercidas pelo fundador da empresa, o empresário Marcos Molina.
Quando assumir a Seara Foods, Rial terá a missão de catapultar o negócio que é considerado a "menina dos olhos" de Molina, que vê na Seara a possibilidade de crescer em industrializados. Entre suas tarefas está a de consolidar a divisão em uma só empresa, com personalidade jurídica própria. Criada em fevereiro deste ano no processo de reestruturação da Marfrig, a Seara Foods funciona atualmente como um "guarda-chuva" que integra outras três empresas: Seara Brasil, Keystone Foods e MoyPark. No terceiro trimestre, a Seara Foods obteve uma receita líquida de R$ 4,3 bilhões, ou 68,2% do faturamento total da Marfrig.
O processo de consolidação da Seara Foods não implica na fusão das três companhias. Na prática, elas funcionarão como divisões da Seara Foods e permanecerão com o atual foco. Com cerca de 60% das receitas da divisão, a Seara Brasil produz aves, suínos e produtos industrializados no Brasil. Já a Keystone é voltada para a operação de food-service e atende clientes como o McDonald's. Por último, a irlandesa MoyPark, que produz industrializados de frango na Europa.
Para a Marfrig, estruturar a Seara Foods em uma pessoa jurídica própria tem importância estratégica. A medida dá flexibilidade à divisão num momento de dificuldades financeiras do grupo. Com isso, a empresa poderia até mesmo avançar numa eventual cisão e abertura de capital da Seara Foods, como muito se especulou no mercado financeiro.
Mas decidir sobre uma possível cisão da Seara não é o desafio imediato da Marfrig. Antes, ela precisa concluir a oferta pública de ações anunciada no fim do mês passado. A empresa pretende obter R$ 1,1 bilhão com a emissão desses novos papéis para amortizar sua dívida de curto prazo. Os R$ 2,84 bilhões disponíveis no caixa da empresa no fim de setembro não seriam suficientes para honrar sua dívida de curto prazo (vence em até um ano) que somava R$ 3,2 bilhões no período. A dívida líquida total da Marfrig chega a R$ 9,2 bilhões.
Nesse sentido, a experiência de Rial como principal executivo financeiro da Cargill, maior empresa de agronegócios do mundo, pode ajudar. Esse é o entendimento do mercado financeiro. "A escolha de um executivo desse porte é positiva para a governança da empresa, que precisava um choque de gestão", afirma Gabriel Lima, analista do Barclays.
Cauê Pinheiro, analista da corretora SLW, destaca a passagem de Rial pelos bancos Bear Stearns e ABN Amro. "Como é um executivo que também vem de banco, acho que deve focar bastante em resultado", afirma ele. Além disso, acrescenta Pinheiro, a presença do executivo brasileiro no comando da Marfrig a partir de 2014 traz mais profissionalismo para a companhia e deixa Marcos Molina concentrado na estratégia do grupo.
Apesar de bem recebida pelo mercado, a indicação de Rial não suplantou o mau-humor dos investidores com as perspectivas para a economia global. Ontem, as papéis da Marfrig na BMF&Bovespa recuaram 0,36%. O Índice Bovespa levou tombo maior, de 1,5%.
Veículo: Valor Econômico