Os fundamentos do mercado de trigo voltam a favorecer os produtores da commodity. A redução da estimativa de safra do cereal na Argentina, em 1,1 milhão de toneladas, em apenas um mês, já reverte a curva negativa dos preços e gera uma perspectiva otimista para o início de 2009.
De acordo com a Secretaria de Agricultura da Argentina, a safra 2008/2009 de trigo será de 9 milhões de toneladas, ante 16,3 milhões de toneladas produzidas na safra passada. A retração de quase 50% é atribuída à escassez de chuvas nas zonas produtivas, além de geadas e diminuição do uso de fertilizantes. No total, a área perdida ultrapassa 450 mil hectares.
Os efeitos de uma menor oferta por parte do principal fornecedor de trigo para o mercado brasileiro poderão ser observados já nos próximos dias. A alta dos preços que ocorreu de forma instantânea na Argentina deve impulsionar o mercado interno em janeiro, ganhando força nos meses seguintes.
A previsão é de que o início do ano seja de grande movimentação nas vendas após um longo período no qual o triticultor ficou muito dependente de intervenções do governo para poder escoar sua produção. Desde o início da colheita no Paraná, em agosto, até agora o governo já contribuiu para a comercialização de 1,3 milhão de toneladas.
De acordo com Lawrence Pih, presidente do Moinho Pacífico, a partir de janeiro as indústrias irão comprar tanto trigo importado quanto nacional, o que deverá impulsionar um aumento dos preços domésticos, acompanhando a tendência de elevação das cotações internacionais.
"Será uma boa oportunidade para o produtor brasileiro vender o trigo por um preço melhor que os atuais", disse.
Segundo o executivo, os moinhos que se abasteceram durante a isenção da Tarifa Externa Comum (TEC) já não estão mais com os estoques elevados. Pelo contrário, com a crise financeira que se agravou a partir do último trimestre as indústrias ficaram sem linhas de crédito para fazer novas importações. "Os moinhos não têm liquidez e estão usando todo o estoque excedente", revelou Pih.
Apesar de afirmar que os moinhos estão trabalhando com margens negativas, Pih acredita que um repasse do incremento dos custos não deve ocorrer de forma imediata, já que o mercado está muito resistente a qualquer tipo de aumento. "Talvez um reajuste aconteça em fevereiro ou março, mas se o câmbio baixasse para um patamar entre R$ 2,10 e R$ 2,20 não seria necessário aumentar", avalia.
Mesmo destacando que não há risco de desabastecimento, as indústrias estudam mudanças estratégicas para a aquisição da matéria-prima, prevendo a alta dos preços. Até as indústrias da Região Sul, que costumam se abastecer com até 70% do seu consumo com a produção local, buscam amenizar o impacto da redução da safra argentina nas negociações de compra e venda. "A notícia de uma safra menor na Argentina muda o nosso planejamento. Complica [a comercialização] porque é um fornecimento a menos", disse Gerson Pretto, diretor industrial do Moinho Estrela. Segundo ele, desde ontem os preços dos fornecedores na Argentina já tinham aumentado de US$ 5 a US$ 10.
Élcio Bento, analista da Safras & Mercado, confirma a elevação dos preços no país vizinho. "Com a redução da estimativa de safra houve uma inversão dos preços que estavam caindo desde março de 2008, quando a cotação era de US$ 423 a tonelada", afirmou. "Essa cotação chegou a US$ 170 e agora com a notícia subiu para US$ 180, estancando a baixa desde março", completou.
O analista explica que com uma safra de 9 milhões de toneladas a Argentina passa a ter um saldo exportável de apenas 3,5 milhões. Numa perspectiva otimista, cerca de 3 milhões desse montante seria destinado ao Brasil, que também contaria com uma oferta de 1,2 milhão de toneladas provenientes do Uruguai e Paraguai. Como o País precisa importar 5 milhões de toneladas, teria que buscar 800 mil toneladas do Hemisfério Norte. "O setor espera a retomada de preços há um bom tempo e a tendência de alta deve ganhar força no final de janeiro com a recuperação dos preços internacionais e o vencimento dos contratos de opção", avaliou.
Veículo: DCI