A Natura vai ter lojas próprias, uma reação ao avanço de concorrentes, como O Boticário, Mary Kay e Jequiti, em sua seara. Conheça as estratégias das empresas nessa batalha cheia de aromas
Por Luciele VELLUTO e Carlos Eduardo VALIM
Diga-me como vendes, que eu te direi quem és. Há pouco tempo, essa era uma forma fácil de conhecer as principais marcas de cosméticos que atuam no Brasil. A paulista Natura e a americana Avon, por exemplo, optavam pelo modelo porta a porta, através de consultoras que eram recompensadas com uma porcentagem a cada frasco negociado. A paranaense O Boticário, por sua vez, preferia as lojas franqueadas. Correndo por fora, as demais concorrentes mesclavam as estratégias. A Jequiti apoiava-se em vendas diretas e na popularidade de seu dono, o apresentador de tevê Silvio Santos. A americana Mary Kay escolheu as vendas multinível, em que as consultoras recrutam outras vendedoras e ganham por parte dos negócios dessa rede.
A francesa L’Occitane, por fim, só era encontrada em lojas selecionadas. Essa divisão quase estática dos territórios de atuação acabou. Agora, todas estão invadindo o espaço de todas. Com isso, alguns dogmas começam a ser revistos. A Natura, por exemplo, vai ter lojas próprias e apostará pesado no comércio eletrônico. O Boticário, maior rede de franquias do Brasil, começou a formar uma equipe de vendas diretas. Todo esse esforço é fácil de ser compreendido. Elas travam uma batalha perfumada por um mercado que movimentou US$ 42 bilhões em 2012. Esse desempenho coloca o Brasil na terceira posição mundial na indústria de beleza, higiene e cosméticos, atrás apenas dos Estados Unidos e do Japão, dois mercados estagnados e sem perspectiva de expansão.
Daqui a dois anos, segundo alguns analistas, o mercado brasileiro pode ultrapassar o dos japoneses. “Crescemos mais de 10% ao ano nas últimas duas décadas”, diz João Carlos Basílio, presidente da Abihpec, associação que representa os fabricantes do setor. “Todo mês entram até 15 novas empresas no negócio.” Muitas dessas recém-chegadas são empresas de pequeno porte e restritas a uma atuação regional. Mas é comum encontrar entre elas gigantes estrangeiras, como a peruana Belcorp, a terceira maior da América Latina, com faturamento de US$ 1,7 bilhão, que aportou por aqui há um ano. “Queremos ficar entre as três maiores do País”, diz Claudio Eschecolla, diretor-geral da Belcorp, que foi executivo da Natura.
O plano dos peruanos é investir US$ 200 milhões, incluindo a construção de uma fábrica, para faturar R$ 500 milhões até 2015. Às novatas se soma o interesse de fabricantes como a Mary Kay, que opera há 15 anos no País. Dona de um faturamento global de US$ 3 bilhões, a marca estuda montar uma fábrica no Brasil. Atualmente, 40% dos itens que vende no País são produzidos por terceiros. A razão para o investimento é simples. A subsidiária nacional aumentou seu tamanho em 60%, em 2012. Neste ano, espera expandir-se mais 50%. “O Brasil já é o quarto mercado para nós”, diz Rosana Bonazzi, diretora de vendas da Mary Kay. Até tradições arraigadas são quebradas em busca de um quinhão no mercado brasileiro.
O Brasil será o primeiro país fora da França a receber uma unidade industrial e uma linha própria da L’Occitane, que sempre baseou a sua estratégia no charme da Provença, onde está a sua celebrada fábrica de essências. A nova marca recebeu o simbólico nome de L’Occitane au Brésil e terá preços até 40% menores que dos perfumes fabricados pela matriz. A linha explorará essências da Amazônia, a exemplo do que faz a Natura com a sua Ekos. “O Brasil ocupa a sexta posição em nosso ranking de vendas”, afirma Laura Barros, diretora da marca. “Acreditamos que ainda temos muitos consumidores a conquistar.” Para cumprir esse objetivo, a empresa abriu 41 lojas nos últimos três anos. A linha L’Occitane au Brésil deverá ser uma das responsáveis pelo crescimento local, ganhando espaços próprios de vendas.
CERCO – Em comum, as novas estratégias da maior parte dos fabricantes de cosméticos têm uma meta: desestabilizar a Natura. Com uma receita líquida de R$ 6,3 bilhões, em 2012, a companhia, que detém com 14,5% a liderança do setor, virou um modelo. Copiá-la virou regra. O Boticário, comandado por Artur Grynbaum, com receitas de R$ 6,6 bilhões no ano passado, foi a primeira a invadir a seara da Natura. Em 2011, silenciosamente, entrou no mercado de venda direta. Em um ano, recrutou um exército de 100 mil revendedoras. Analistas de mercado acreditam que boa parte do seu crescimento de 20% em 2012 ocorreu em razão dos resultados com as vendas diretas.
A empresa paranaense também criou, em 2011, a Eudora, marca para vender de porta em porta, que passou por reformulações neste ano. A Natura, no entanto, fez o caminho inverso ao de O Boticário. A companhia, presidida pelo executivo Alessandro Carlucci, anunciou a intenção de abrir 20 lojas-conceito nas principais cidades do País. O objetivo principal será a promoção da marca, mais do que alcançar volumes significativos de vendas. Elas, contudo, servirão como base de testes para planos mais ousados. A ação mais ambiciosa da Natura, no momento, está na internet. A empresa, atualmente, utiliza a ferramenta online de forma tímida. “É uma venda pequena e que não promovemos”, diz José Vicente Marino, vice-presidente da companhia. “Mas vemos grande potencial na internet.”
A prova disso é o projeto-piloto em andamento que permitirá ao seu exército de 1,5 milhão de consultoras ter sites próprios de e-commerce. “Não havia motivo para a Natura ficar encastelada em um único canal”, afirma Marcelo Pinheiro, sócio da consultoria paulista especializada em venda direta DirectBiz. O grande desafio da líder do setor, diante da concorrência reforçada, será seguir o ritmo de crescimento do mercado. O que não aconteceu em 2012. Enquanto o setor se expandiu 15%, a sua receita líquida cresceu 13,5%. Os novos passos da Natura serão seguidos de perto por seus concorrentes. “Vou esperar para ver se o plano de lojas da Natura vai dar certo”, afirma Lázaro do Carmo Jr., presidente da Jequiti.
“Não tenho vergonha nenhuma de dizer que sou um seguidor.” A empresa do Grupo Silvio Santos, que faturou R$ 410 milhões no ano passado, chegou a ser colocada à venda. Mas as negociações não avançaram. Sua atual estratégia é de parcerias, como as que foram feitas com a Elizabeth Arden e com a Coty, que chegou, inclusive, a cogitar sua compra. Sucessos mundiais, como os perfumes das cantoras pop Beyoncé, Madonna e Jennifer Lopez, passaram a ser fabricados no Brasil. Só o perfume da Beyoncé, lançado em fevereiro deste ano, vendeu mais de 42 mil unidades em um mês. Além disso, a Jequiti, que tem um time de 190 mil vendedoras, adotou estratégias insólitas para reforçar suas fileiras.
Ela oferece um vale-saúde que dá até 80% de descontos em consultas e exames médicos. Enquanto todos se armam para encarar uma briga cada vez mais acirrada, a Avon parece assistir olimpicamente ao avanço dos competidores. No ano passado, sua receita caiu 3% no Brasil. “Já é o terceiro ano em que ela não cresce no País”, diz Pinheiro, da DirectBiz. As vendas recuaram por conta de estratégias equivocadas e de dificuldades na instalação de um software de gestão. Uma prova de que os problemas da Avon não se restringem ao Brasil é o fato de ter perdido o posto de maior empresa de vendas diretas do mundo para sua compatriota Amway. Seu valor de mercado, de US$ 8,7 bilhões, é inferior ao da Natura, atualmente na casa dos US$ 10 bilhões.
Fragrância recarregável
Por Bruna Borelli
Na Europa, a perfumaria de luxo procura alternativas sustentáveis para reduzir os custos de distribuição “surfando” na onda do verde. É o caso da companhia francesa de cosméticos Clarins. Com receita anual de € 300 milhões, a empresa detém marcas conhecidas, como a Thierry Mugler, que produz o perfume Angel. A novidade é um equipamento de recarga de perfume, lançado no Brasil na quarta-feira 3, em São Paulo. Batizado de The Source (“A Fonte”, em inglês), o aparelho refila os frascos vazios de perfume, a um custo 35% menor para o consumidor.
O equipa-mento faz parte do projeto Empty Bottles, que existe desde 1992 na França e representa 50% do faturamento da empresa naquele país, onde o Angel é campeão de vendas. No Brasil, serão 70 máquinas em operação. Mais do que baratear o produto e incentivar o consumo consciente, a empresa economiza 50% com o transporte e a produção de novas embalagens. “É um retorno à perfumaria tradicional, quando os frascos eram assinados por um famoso designer de cristal e podiam ser reabastecidos com sua fragrância original”, afirma o francês Joel Palix, presidente da divisão de fragrâncias da Clarins, que esteve no lançamento.
Veículo: Revista Isto É Dinheiro