Se alguém ainda acha que uva tem que ser sempre redonda ou ter gosto apenas de uva, os próximos anos serão uma surpresa. Da mesma forma como já acontece com outras frutas - a melancia quadrada do Japão talvez seja o melhor exemplo -, novas variedades de uvas chegarão ao mercado brasileiro com o apelo de sabor açucarado, cores bem definidas e formato propositadamente incomum.
Maior produtor nacional de uvas de mesa, o Grupo JD, ex-braço agrícola do Carrefour no país, espera distanciar-se mais da concorrência com o lançamento até 2016 de cinco novas uvas - sendo uma com sabor similar ao do algodão doce e outra escurecida e alongada como uma tâmara, com quase dez centímetros de comprimento.
Com investimentos em pesquisa de R$ 4 milhões, a maior parte advindo do governo federal, o JD vem trabalhando com geneticistas de seis laboratórios estrangeiros e da Embrapa para chegar à planta ideal não só em aceitação popular, mas também em resistência às altas temperaturas do Nordeste e com uniformidade dos gomos, de forma a diminuir a necessidade da mão de obra que recentemente migrou para a construção civil.
"Precisamos inovar sempre nessa área. O consumidor gosta de coisas diferentes e nós precisamos ganhar produtividade", diz Arnaldo Eijsink, diretor do JD desde a separação do Carrefour, em 2007.
Em um mercado altamente pulverizado, com centenas de pequenos produtores instalados no país, o JD se prepara para expandir o portfólio atual de 10 variedades e sair da "mesmice" das uvas itália e niágara, que respondem por boa parte do consumo nacional.
Carro-chefe do grupo, as uvas representaram cerca de 70% do faturamento de R$ 130 milhões do ano passado. Além das frutas, plantadas em Pernambuco e na Bahia, a empresa trabalha com pecuária bovina em Mato Grosso e tem uma trading em São Paulo.
Segundo Eijsink, as novas variedades de uvas irão elevar a produção da empresa das 16 mil toneladas registradas no ano passado para 25 mil toneladas em três anos. A triagem das novas plantas foi feita em meio a 91 variedades, desenvolvidas pelo processo de cruzamento convencional em laboratório e plantadas nas fazendas do grupo. "Dessas, 30 a gente já descartou porque não atende às nossas necessidades", diz o executivo.
Há dois anos, o JD iniciou o plantio das cinco mais promissoras, que renderam uma primeira safra simbólica de três mil toneladas - oferecidas como degustação a potenciais compradores em dias de campo organizados pela empresa. Elas já respondem por 250 dos 900 hectares plantados com uvas nas fazendas do grupo no Vale do São Francisco. Até 2016, elas deverão atingir metade da área total. "Exceto uma variedade, as demais não têm sementes. São uvas finas de maior valor agregado e aceitação no mercado", diz Eijsink.
Atender ao paladar brasileiro se tornou mais relevante à medida em que as uvas ganharam espaço no país. Ao contrário do que ocorria há seis anos, com mais da metade da produção exportada, hoje 60% das uvas da JD fica no Brasil.
Além da ausência de sementes, as futuras uvas terão crocância e um "brix" mais elevado - isto é, um teor de açúcar mais alto. Hoje, as uvas têm um brix que varia de 15 a 17. "As próximas chegarão a 19. Brasileiro gosta de doce", diz o executivo, citando a chegada da variedade algodão doce. "O desafio é encontrar o equilíbrio entre açúcar e acidez, responsável pela conservação da fruta". Além disso, terão de ter cores bem definidas. "Se a uva vermelha vem com uma pontinha de verde, não vende".
Desde que se tornou um empresa independente, o JD, da família Jacques Defforey, um dos fundadores do Carrefour, vem avançando também no mercado de carne bovina certificada. Recentemente, anunciou uma parceria com a Marfrig Alimentos para a venda da primeira carne do país com o selo da Rainforest Alliance, reconhecido internacionalmente. Os cortes nobres seguem com exclusividade ao Carrefour. O couro foi vendido para a italiana Gucci. "Mas o Carrefour não é o nosso maior cliente", diz Eijsink. "É só um cliente especial".
Veículo: Valor Econômico