Fim de um mistério de quase nove meses: a Nestlé está negociando a compra da maior fábrica da Parmalat, controlada pela Laep Investments, no país. A unidade fica em Carazinho, no Rio Grande do Sul, onde são fabricados leite longa vida, leites especiais, leite em pó, leite condensado e creme de leite. Estima-se, no mercado, que a aquisição da unidade será fechada por R$ 100 milhões. Procurada, a Nestlé não quis se pronunciar. A Laep também preferiu ficar em silêncio.
Essa pode ser a segunda aquisição da Nestlé em cinco meses. Em dezembro, a empresa anunciou a compra da Água Mineral Santa Bárbara e parte de suas instalações industriais, no interior de São Paulo. "O que está fazendo o processo se esticar são questões fiscais", disse Zurita em uma entrevista no início de abril, referindo-se à segunda aquisição.
Em setembro passado, o presidente da multinacional declarou que a companhia estava prestes a fechar dois negócios. Na semana passada, Zurita acrescentou, sem dar pistas, que ainda há uma terceira aquisição a caminho. "A companhia se interessa por empresas que tenham bons produtos para serem agregados ao portfólio", afirmou.
Com a unidade de Carazinho, que tem capacidade para processar 1,6 milhão de litros de leite por dia, a Nestlé avança em seu projeto de ampliar a participação no mercado nacional de lácteos. Este ano, a empresa entrou no segmento de leite longa vida premium, com produção terceirizada, num investimento de R$ 100 milhões.
Quando a compra da unidade gaúcha da Parmalat for concretizada, a Nestlé passará, enfim, a produzir lácteos no Rio Grande do Sul. Em outubro de 2008, três meses depois do previsto, a Nestlé inaugurou uma planta em Palmeira da Missões, com um investimento total estimado de R$ 120 milhões e geração de 900 empregos diretos. A fábrica, para produção de leite pré-condensado (desidratado), tem capacidade de processamento de 1 milhão de litros de matéria-prima por dia.
Atualmente o produto, base para outros derivados lácteos como iogurtes, é enviado para processamento na fábrica da Nestlé em Araçatuba (SP). Carazinho fica a apenas 90 quilômetros de Palmeira das Missões e permitirá à Nestlé acelerar a produção de lácteos na região Sul.
A fábrica da Nestlé em Palmeira, segundo fontes do setor de lácteos no Rio Grande do Sul, consumiu até agora R$ 30 milhões e, por enquanto, emprega apenas 60 pessoas.
Em recente entrevista, Ivan Zurita afirmou que não há outro modo de a empresa avançar no país que não por meio de aquisições. Ele disse que a meta da companhia, que em 2008 teve faturamento líquido de R$ 13,4 bilhões no Brasil, é crescer no mínimo 4% em 2009.
Para alcançar esse objetivo, o mercado de leite longa vida é crucial para a Nestlé. O setor gira cerca de 5 bilhões de litros por ano no Brasil e o de leites especiais (com vitaminas, por exemplo), no qual a companhia acaba de ingressar, aproximadamente 100 milhões de litros. Zurita já disse também que a Nestlé quer abocanhar 250 milhões de litros do total de 5 bilhões de litros com sua linha premium.
A companhia suíça é líder em captação de leite no país, por meio da DPA (joint venture com a cooperativa neozelandeza Fonterra), e deve avançar mais este ano com a concretização do negócio com a Parmalat. Em 2008, a empresa captou 1,9 bilhão de litros de leite.
Enquanto a Nestlé investe para crescer, a Parmalat encolhe. O enxugamento, porém, já estava previsto no plano de reestruturação da Laep, que está em crise desde meados do ano passado. No segundo semestre de 2008, a companhia decidiu concentrar as operações industriais, vendendo ativos, após dois trimestres seguidos de prejuízos e de uma queda sem precedentes no valor de suas ações. Em 12 meses, os papéis acumulam queda de 90,83%, segundo o Valor Data.
Segundo os últimos dados disponíveis, as dívidas líquidas da Laep somavam R$ 290 milhões no terceiro trimestre de 2008 - a empresa busca reestruturar um total de R$ 117 milhões em debêntures. No período, a Laep teve prejuízo de R$ 86,4 milhões.
Embora seja uma saída para levantar recursos, ao se desfazer de Carazinho, a Parmalat abrirá mão de seu ativo mais importante atualmente, segundo fontes do mercado de leite. Além das boas condições, a unidade é bem localizada e está numa importante bacia leiteira do país.
A Laep já recorreu a outras vendas para fazer caixa. Em setembro de 2008, apenas quatro meses depois de comprar da Danone os negócios relacionados à marca Poços de Caldas e a licença da marca Paulista por 15 anos, a Laep vendeu os ativos para o Laticínios Morrinhos, controlado pelo GP Investimentos, pelo mesmo valor. Em fevereiro deste ano, a empresa vendeu a fábrica de Garanhuns (PE), por R$ 31 milhões, para a gaúcha Laticínios Bom Gosto.
A Laep também já colocou à venda a Integralat, seu projeto para integração da produção, que era considerada menina dos olhos quando o empresário Marcus Elias assumiu o negócio.
Diante da necessidade de caixa, fontes do setor afirmam que a Laep poderia se desfazer de outras unidades. Hoje, estão em operação, além de Carazinho, Santa Helena de Goiás (GO), Ouro Preto d'Oeste (RO), Itaperuna (RJ), Governador Valadares (MG) e Jundiaí e Guaratinguetá (SP). Todas operam com ociosidade.
Veículo: Valor Econômico