Concorrência: Processo para apurar suposta formação de cartel foi aberto na quinta-feira
O Ministério da Justiça investiga um suposto cartel no mercado de chocolates. O objetivo é verificar se a Associação Brasileira da Indústria de Chocolates, Cacau, Amendoim, Balas e Derivados (Abicab), que representa as principais empresas do setor, estaria direcionando os reajustes de preços às vésperas da Páscoa.
O processo foi aberto pela Secretaria de Direito Econômico (SDE), na quinta-feira passada. A SDE verificou que, semanas antes da Páscoa, as empresas que pertencem à Abicab costumam se reunir e, logo depois, a diretoria da entidade anuncia um percentual mínimo de aumento nos preços dos ovos.
Neste ano, a reunião ocorreu no Hotel Maksoud, em São Paulo, em 4 de março, e, após o encontro, a Abicab informou à imprensa que os preços finais dos chocolates para a Páscoa ficariam 8% mais caros do que no ano anterior. Para a SDE, a divulgação de um percentual mínimo para os aumentos é grave, pois isso influencia os lojistas e as redes de varejo que podem impor reajustes ainda maiores para o consumidor final.
"Na melhor das hipóteses, se não houve cartel, todos se sentem induzidos a seguir esse percentual", afirmou Ana Paula Martinez, diretora do Departamento de Proteção e Defesa Econômica (DPDE) da SDE.
Essas reuniões ocorrem todos os anos num período de 40 dias antes da Páscoa. Nas declarações à imprensa, a Abicab fornece uma perspectiva de elevação nos preços e também no volume que será produzido.
A SDE constatou que, nos últimos anos, os aumentos reais de preços costumam ficar acima dos percentuais indicados pela Abicab. Ou seja, primeiro, a associação informa um percentual e, depois, o mercado acaba praticando preços superiores aos que foram sugeridos.
Neste ano, após a associação falar numa Páscoa 8% mais cara, o aumento médio de preço no varejo, segundo o Procon de São Paulo, foi de 12%. No ano passado, a Abicab divulgou uma projeção de aumentos de preços de 4,7% e o Procon verificou um aumento real aos consumidores de 7,3%. A pesquisa do Procon foi feita com base nos preços praticados por grandes varejistas como Carrefour, Wal-Mart, Pão de Açúcar e Lojas Americanas.
A Abicab reúne as principais empresas do setor, como Nestlé e Kraft , que, disputam a liderança do mercado. Os órgãos antitruste do governo tentaram romper com o, que foi considerado, oligopólio neste mercado, em 2004, quando o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) vetou a compra da Garoto pela Nestlé. A ideia era permitir que uma terceira empresa adquirisse a Garoto e, com isso, ampliasse a competição no mercado.
Mas, a Nestlé recorreu à Justiça contra a decisão do Cade e o caso se encontra, atualmente, sob pedido de vista no Tribunal Regional Federal (TRF) de Brasília. Desde janeiro, o juiz federal Avio Mozart Novaes, autor do pedido de vista, está para fazer o seu voto e retomar o julgamento. Antes de ele pedir vista, os desembargadores João Batista Moreira e Fagundes de Deus votaram a favor do reenvio do processo ao Cade para que ele seja reapreciado, o que deverá alongar ainda mais a definição final deste caso.
De acordo com a SDE, a Kraft, a Nestlé e a Garoto detêm 81,4% das vendas de chocolates. A secretaria concluiu que as demais empresas do setor possuem "escala pequena e penetração apenas regional" no mercado, o que dificulta a competição.
Ainda segundo a SDE, as possibilidades de novas empresas entrarem no mercado estão limitadas pela necessidade de investimentos elevados em produção e marketing. O pequeno número de empresas líderes (Kraft e Nestlé) foi considerado como um incentivo para a combinação de preços.
A Páscoa representa 17% do faturamento total das companhias e, por isso, é considerada como um período importante para as empresas do setor.
A SDE incluiu três dirigentes da Abicab como réus no processo. Eles e a Abicab terão 15 dias para apresentar defesa. O Valor procurou a Abicab e o seu presidente, Getúlio Ursolino Netto, para que pudessem se manifestar a respeito da abertura de investigações, mas não obteve resposta até o fechamento desta edição.
Se condenada, a Abicab poderá pagar multas de até R$ 6 milhões. Os dirigentes da associação podem ser obrigados a pagar multa, cujo valor é calculado tendo como base a multa aplicada à entidade.
Veículo: Valor Econômico