Design na fase da maturidade

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A versão nacional do Idea, concurso de design dos EUA, premia 103 produtos, projeta brasileiros no exterior e discute o papel do design na crise

 

A senha para garantir a fidelidade do consumidor, padronizar uma marca global, de modo que ela possa ser reconhecida em qualquer parte do mundo, e fazer uma embalagem se destacar em um mar de informações pode ser resumida a uma palavra: o design. De ferramenta para melhorar o aspecto estético dos produtos, o design cresceu em importância e hoje faz parte da estratégia das empresas para se posicionar no mercado.

 

Um dos termômetros da relevância do design brasileiro é o Prêmio Idea/Brasil, a versão nacional do International Design Excellence Award (Idea), uma das mais importantes premiações do design nos Estados Unidos. Trazido ao País no ano passado pela Associação Objeto Brasil, entidade dedicada à promoção da indústria do design no Brasil, em parceria com a Agência de Promoção das Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), o prêmio cresceu em adesões. Nesta edição, foram 419 projetos inscritos e 103 premiados, em 14 categorias, ante 343 inscritos e 53 vencedores na primeira edição.

 

Há histórias de conquista de novos mercados. A pequena empresa Ciao Mao, que produz sapatos interativos e venceu o prêmio Idea/Brasil no ano passado, conseguiu fechar vendas para EUA e Japão após o reconhecimento. Outro projeto vencedor, o totem de luz da Ziplux, já encontrou clientes na Coreia e no Japão. "O design permite dar visibilidade à inovação das pequenas empresas e reforçar o posicionamento de mercado das grandes", diz Juarez Leal, coordenador da Apex-Brasil.

 

Agora, o desafio é mapear o impacto do design na economia brasileira.
A Objeto Brasil encomendou estudo sobre o tamanho da indústria do design no Brasil, que deve estar pronto até meados do ano que vem.

 

"Foi-se o tempo em que, para vender um trator para o produtor rural, bastava garantir um bom funcionamento da máquina no campo", admite Luiz Ghiggi, vice presidente de engenharia da AGCO, fabricante dos tratores Massey Ferguson. "Hoje, o senso estético do agricultor está mais apurado, pois ele se tornou um empresário do campo, se modernizou." Segundo o executivo, itens como o conforto interno do equipamento e seu nível de ruído se tornam mais relevantes, e cabe ao bom designer atender essas novas demandas.

 

A atenção a essas questões levou a fabricante de tratores a ser premiada com a Prata na categoria Comerciais e Industriais. O trator plataformado Massey Fergusson 7100 trouxe inovações como para-lamas mais envolventes aos pneus, o que traz mais segurança para o operador, e um toldo que o protege do sol e chuva.

 

Do campo para a prateleira do supermercado, foi-se também o tempo em que preço baixo garantia a preferência do consumidor. A linha Taeq, marca exclusiva do Grupo Pão de Açúcar que reúne de alimentos a roupas de cama, levou Ouro na categoria Estratégia de Design. "Marca própria sempre esteve associada a baixa qualidade. O design das embalagens foi importante para enaltecer os diferenciais da Taeq no ponto de venda", diz Isadora Sbrissa de Campos, gerente de marketing da Taeq. "Como nosso investimento em mídias de massa é pequeno, nos apoiamos na embalagem para comunicar o valor da marca para o consumidor."

 

Na prática, os itens da linha Taeq, comercializados em todas as lojas do Grupo Pão de Açúcar, ganharam embalagens em fundo branco, com formas orgânicas e sem excessos de informação. "O design não poderia ser complicado, com muitas cores e muita informação. O apelo da marca é justamente oferecer uma pausa para o consumidor", diz Isadora.

 

ECODESIGN

 

Já se foi também o tempo em que o impacto ambiental de um produto não era considerado relevante. A necessidade de fazer um uso mais racional de recursos como água e energia, aliada à oferta de materiais mais ecológicos, como a madeira certificada, fortaleceram o chamado ecodesign. "Tanto a crise econômica quanto a crise ambiental, que vem se anunciando pelas mudanças climáticas, sinalizam que já não dá mais para viver como vivíamos, nos mesmos padrões de produção e consumo, de uso intensivo dos recursos naturais e de poluição", diz Joice Joppert Leal, diretora executiva da Objeto Brasil.

 

Frederico Gelli, da Tátil Design, acredita no redesenho da economia por meio do design. Um dos precursores no Brasil da chamada ecologia industrial, ou biomimética - escola que utiliza os mesmos preceitos da natureza ao desenhar um produto ou ambiente -, ele inovou ao usar a impressão a laser sobre folhas naturais secas. Faturou o prêmio Ouro na categoria Ecodesign. "O designer não deve apenas fazer coisas para impulsionar as vendas das empresas, embora isso seja consequência do trabalho. Ele deve pensar em produtos com mais relevância para as pessoas e menor impacto no ambiente.

 

''O design brasileiro tem grande potencial''

 

Coroado designer da década pelo Idea americano, Tucker Viemeister diz que o único caminho para o design hoje é aliar beleza e utilidade

 

Unir utilidade e beleza na criação de objetos ou espaços não é mistério para o designer americano Tucker Viemeister, vice-presidente de criação do Studio Red, do Rockwell Group, renomada empresa de design interativo de Nova York. Em sua trajetória de mais de trinta anos de carreira, Viemeister criou 32 patentes, fundou quatro empresas de design tidas como revolucionárias e já comandou projetos para empresas como Coca-Cola, Procter & Gamble, Gap, Motorola, Nike e Toyota. No meio do caminho, cunhou a expressão "beautility", que resume a junção entre beleza e utilidade, o que, segundo ele, é o único caminho para o design em tempos de crise. Viemeister deu a seguinte entrevista:

 

Há espaço para o design em momentos de crise?

 

Não há dúvidas de que a economia global vai mal, especialmente nos Estados Unidos. Os negócios encolheram, centenas de designers e arquitetos foram demitidos e caiu incrivelmente a demanda por design.
No entanto, dispensar o design é uma visão equivocada das empresas.
Elas deveriam justamente investir agora em estratégias de design para colher os frutos depois da crise. O design pode apresentar soluções para vários problemas.

 

Por exemplo?

 

Estamos vivendo um momento de total mudança nos hábitos dos consumidores no mundo todo, e dos americanos em especial. A crise mostrou que o consumo pelo consumo é insustentável, sob todos os aspectos - econômicos e também ambientais. As empresas estão percebendo que o papel delas não será mais só produzir, distribuir e comercializar coisas. Cada vez mais, aspectos como o serviço e a chamada experiência de compra vão ganhar espaço. A indústria automobilística, por exemplo, está em um momento péssimo porque não se pode mais contar com o fato de que as pessoas vão comprar carros novos a cada seis meses. As empresas não venderão mais o carro, e sim a paisagem, o prazer da viagem. Isso é o que vai fazer a diferença para o consumidor. O design vai caminhar no sentido de prover essas experiências.

 

Seria o fim do consumismo exacerbado?

 

É uma grande mudança em curso. Nos últimos 20 anos nos Estados Unidos, a vida das pessoas foi ganhar dinheiro para poder ir às compras. As pessoas esqueceram a diversão, o entretenimento. Mas algumas companhias estão atentas ao fato de que é preciso ser relevante, em vez de só fabricar produtos. Cada vez mais o conteúdo vai importar, em vez do produto em si. Veja o caso da Apple. Eles ganham mais provendo conteúdo do que com os equipamentos em si. É um espécie de desmaterialização da economia.

 

Mas isso vale para os países emergentes? As classes médias de países como Brasil, Rússia, Índia e China (os BRICs) estão chegando agora ao mercado de consumo de massa. Qual é o papel do design nesse processo?

 

As classes emergentes desses países, e o Brasil me parece ser a exceção, não estão interessadas em design. Não acho que a China se interesse por design, de forma alguma. Na Índia, a consciência média sobre o que é um bom design é muito pífia.

 

E por que o Brasil é uma exceção?

 

O Brasil tem características muito interessantes. Vejo o País como uma ilha. De um lado, o Oceano Atlântico. De outro, um mundo de pessoas que só falam espanhol. O Brasil, até pelo seu tamanho continental, se apoiou nas diferenças regionais e no seu robusto mercado interno e desenvolveu um design bastante peculiar, que tem nível internacional.
Veja o caso dos irmãos Campana e das Havaianas. Em termos de design de interiores, área em que venho trabalhando fortemente nos últimos tempos, fiquei sensibilizado com a Livraria da Vila do Shopping Cidade Jardim, em São Paulo.

 

Há espaço para o avanço do design brasileiro no mundo?

 

Há muitos elementos do design brasileiro que certamente interessariam ao resto do mundo. No entanto, não vejo muito esforço de promoção do design brasileiro no exterior. Cabe às indústrias e ao governo promoverem, há muito potencial para o design brasileiro.

 

Veículo: Diário do Comércio - SP


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