Comércio e indústria repensam modelo de negócios para atender às atuais exigências de um novo ambiente econômico - Cobranças deixaram de ser assunto de ambientalistas e viram exigência econômica; para especialistas no tema, a inovação é fundamental
Empresas de coleta de lixo e saneamento básico se tornando empresas de "soluções ambientais". Petrolíferas investindo pesado na produção de biocombustíveis e tecnologias de sequestro de carbono. Indústrias farmacêuticas praticando preços diferenciados em regiões carentes para ampliar a venda de medicamentos.
Mais do que preocupação socioambiental ou estratégia de marketing, empresas de diversos setores começam a repensar seu próprio modelo de negócios para sobreviver em uma economia na qual exigências socioambientais estão se tornando uma realidade.
"Decisões como a da OMC (Organização Mundial do Comércio) de aprovar o "dumping" social e ambiental como política da instituição ou a das grandes redes de varejo no Brasil de boicotar a compra da carne ligada ao desmatamento na Amazônia mostram que esse tipo de cobrança deixou há tempos de ser um assunto restrito aos ambientalistas. Virou uma exigência econômica", disse Fernando Almeida, presidente do CEBDS (Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável).
Repensar o modelo de negócios para atender às exigências desse novo ambiente econômico, sejam elas oriundas do mercado ou da regulação, não é uma tarefa fácil. Para especialistas e empresários reunidos na semana passada em São Paulo para discutir o tema, durante o congresso Sustentável 2009, o caminho para resolver essa equação passa, necessariamente, pela inovação.
"Pensar em novos modelos de negócios tem sido um grande desafio, e nesse sentido a inovação é fundamental. O que nos motiva não é a situação do planeta, mas sim a ameaça à nossa própria sobrevivência como negócio", afirmou o gerente corporativo de Saúde, Segurança e Meio Ambiente da Braskem, Jorge Soto.
No fim de 2008, o conselho de administração da empresa aprovou um ambicioso plano de investimentos de R$ 500 milhões para a produção de eteno e polietileno a partir do álcool da cana-de-açúcar, apelidado de "polietileno verde".
O interesse dos compradores pelo novo produto, segundo Soto, foi surpreendente, apesar do maior custo em relação ao polietileno produzido do petróleo. "Mesmo com o início da produção previsto para 2010, já temos demanda identificada para mais de 600 mil toneladas por ano do polietileno verde. Além de ser um produto de maior retorno, é uma inovação que pode nos trazer diferenciação importante no mercado químico em escala mundial."
Outro exemplo, ligado à área social, é o da gigante farmacêutica GlaxoSmithKline, que definiu como política estratégica não cobrar, nos países mais pobres, mais do que 25% do valor dos remédios comercializados nos países desenvolvidos. Segundo o presidente da GSK para América Latina e Caribe, Rogério Ribeiro, isso viabilizou uma ampliação importante do acesso das pessoas aos remédios sem prejudicar os resultados financeiros da companhia.
"Vemos isso não como filantropia, como ação social, mas sim como um novo modelo de negócios que interessa a todos: à nossa empresa, às populações atendidas e aos governos locais. Temos de ser arrojados para inovar os negócios rumo a uma economia caracterizada pela preocupação com a sustentabilidade", afirmou Ribeiro.
Para onde as empresas devem olhar nesse novo horizonte? Segundo Diane Osgood, vice-presidente da Business for Social Responsibility, é possível separar as possíveis novas estratégias de negócios em cinco áreas diferentes. A primeira, segundo Osgood, diz respeito aos novos mercados que surgem nesse ambiente que alguns chamam de "economia verde" ou "nova economia".
A segunda área diz respeito a como produzir o mesmo produto utilizando a menor quantidade possível de recursos naturais e com a maior durabilidade, o que os especialistas chamam de desmaterialização da economia. A terceira é relacionada ao maior acesso dos bens e serviços produzidos, a exemplo do que fez a GSK nos países pobres.
A área mais complexa, segundo Osgood, é como incentivar a redução do consumo dentro de um modelo econômico lastreado, justamente, no consumo crescente.
A qualificação das cadeias de vendas e fornecimento, segundo ela, é a quinta área para a qual as empresas devem atentar. A decisão das redes Pão de Açúcar, Walmart e Carrefour de suspender a compra de carne dos frigoríficos denunciados pelo Ministério Público do Pará e pela ONG Greenpeace de incentivar a devastação na Amazônia é um importante exemplo nesse sentido.
Veículo: Folha de S.Paulo