Cresce a procura por especialistas em fusões

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Noites em claro diante de cláusulas contratuais e relatórios administrativos são comuns na rotina de um especialista em fusões e aquisições. Quem garante é o advogado Mauro Leschziner, que participou de operações como a compra do portal Zip.Net pela Portugal Telecom, da aquisição da Batávia e Eleva pela Perdigão, além da transferência da divisão de caminhões e ônibus da Volkswagen do Brasil para o grupo alemão Man AG, efetivada em março, no valor de € 1,1 bilhões. "Para desempenhar bem a função é preciso construir uma relação de confiança com o cliente e achar soluções criativas que facilitem os acordos", diz Leschziner, que hoje trabalha na união JBS-Bertin.

 

Depois da crise financeira, profissionais como Leschziner reaparecem em alta no mercado. Segundo a consultoria internacional Robert Half, a demanda pela função retornou a partir de julho. Isso significou uma elevação salarial de pelo menos 30% para quem mudou de emprego. O processo de seleção dos profissionais está mais rápido. Um dos motivos, segundo os consultores, tem sido a pressa das empresas para preencher as novas vagas. Se antes a busca por um candidato ideal na empresa de recrutamento levava até três meses, agora ela dura pouco mais de duas semanas.

 

"Com a crise, o mercado oferece boas oportunidades para aquisições de empresas pouco valorizadas. Esse movimento aumenta a demanda por esse tipo de profissional", analisa Fábio Saad, gerente de mercado financeiro da Robert Half. Segundo Andreas Belck, chefe do departamento de finanças da ESPM, mais de 40 mil fusões e aquisições acontecem anualmente no mundo. Apenas no ano passado, 600 ocorreram no Brasil. "De 2006, quando se efetuaram cerca de 250 operações, para 2008, com 670 contratos fechados, o crescimento dos acordos no Brasil foi superior a 260%."

 

A Robert Half também percebeu que os bancos internacionais no país estão expandindo suas áreas de M&A (mergers & acquisitions ou fusões e aquisições) e que o setor deve continuar aquecido nos próximos 12 meses. "A partir do segundo semestre, pelo menos sete instituições de investimento reforçaram suas estruturas."

 

O salário, segundo a Robert Half, está entre os maiores do mercado e é possível encontrar no setor financeiro recém-formados recebendo cerca de R$ 100 mil por ano ou diretores com remuneração anual acima de R$ 1 milhão. "A profissão exige muito. A carga horária é pesada e é fácil encontrar profissionais que trabalham mais de 14 horas por dia e também nos fins de semana."

 

No dia da entrevista ao Valor, Mauro Leschziner não dormia há 24 horas. Mas não estava reclamando. Sócio do escritório Machado, Meyer, Sandacz e Opice, banca com 300 advogados, ele atua na área desde 1994 e observou no início do ano uma redução de 30% nas operações de fusões por conta da crise. Com a retomada dos negócios a partir de março, voltou a chefiar equipes com cinco a dez advogados para atuar em projetos. "É preciso ter inglês fluente e bons conhecimentos de direito civil, trabalhista e societário."

 

Segundo os consultores, o profissional da área pode trabalhar em bancos, grandes empresas, boutiques de investimento e escritórios de advocacia- mas a cobrança no setor financeiro é maior. "Nesse segmento, o especialista trabalha no risco. Atua em cerca de cinco negócios ao mesmo tempo, para tentar fechar pelo menos um contrato", diz Saad, da Robert Half.

 

O executivo de M&A deve ter uma sólida base de conhecimento financeiro, estar atento às movimentações do mercado e saber identificar oportunidades. É desejável um background em administração com foco em finanças, marketing, direito e economia, além de técnicas de "valuation", gestão de marcas e logística. Para o professor Plínio Chapchap, da Brazilian Business School (BBS), o conhecimento para quem vai assumir a função depende do nível de responsabilidade do cargo.

 

"Em um estágio mais inicial é necessário ter conhecimento acadêmico da área. Para quem estiver em um patamar mais avançado de negociação, a experiência no mercado financeiro é fundamental". Segundo Saad, da Robert Half, os especialistas geralmente têm formação nas áreas de engenharia e administração, com pós ou MBA como complemento.

 

Fora das empresas recrutadoras, o processo seletivo é feito por meio de convite a executivos que já atuam na área ou que conheçam bem o mundo corporativo. "São ex-diretores de bancos e de grandes empresas. Mas também trabalhamos com jovens talentos que formamos durante as operações", afirma Luis Alberto de Paiva, sócio da Corporate Finance Investimentos e Participações, envolvida em 32 casos de compra e venda de companhias, dos setores de embalagens, alimentos, serviços e tecnologia.

 

Focada no midle market, a Corporate Finance fechou quatro contratos em 2008 e deve encerrar 2009 com cinco ações de fusões e aquisições. Com uma equipe de 22 profissionais, mantém operações em Porto Alegre, Curitiba e São Paulo, além de um escritório em Portugal. Para pertencer ao quadro da empresa, o analista de M&A deve ter olho clínico para perceber oportunidades lucrativas e antecipar tendências de mercado.

 

Já a área de fusões e aquisições do escritório Trench, Rossi e Watanabe Advogados espera um crescimento de 10% nos negócios, este ano. "Temos 45 operações em andamento nos setores de agronegócios, varejo, seguros e energia", detalha a sócia da banca, Cláudia Prado. "A tendência é de aumento de compras na área de infraestrutura, por conta da Copa do Mundo e das atividades do pré-sal, além de ações com fundos de private equity."

 

Entre janeiro e dezembro de 2008, o Trench, Rossi e Watanabe concluiu 38 operações de fusões. Este ano, já foram concretizadas 20 ações. Durante o período de crise, a banca não demitiu ninguém de M&A e, recentemente, efetivou três estagiários, contratados como advogados juniores. O escritório tem cerca de 40 especialistas no setor.

 

Além de conhecimento em direito, Cláudia chama a atenção para outros requisitos. "O conhecimento da indústria do cliente é cada vez mais importante para que o profissional preste uma boa assessoria. É fundamental também ter habilidade em negociação". Em dezembro de 2008, a banca assessorou a empresa americana Archer Daniels Midland Company (ADM), do setor de agronegócio, para a aquisição de 49% do capital da Central Cabrera Energética Açúcar e Álcool e 80% da Bela Vista Bio Etanol. Em julho, ajudou a Fiberweb na operação de joint venture com a Petropar. "A contratação na área depende da descoberta de talentos experientes."

 

Segundo Peter Anderson, sócio-diretor da ARC Executive Talent Recruiting, a profissão de M&A pode ser dividida em dois grupos: os que originam os negócios e aqueles que executam as transações finais. "As principais características do primeiro time são a capacidade de vislumbrar oportunidades e ter acesso aos dirigentes das empresas, além de um histórico de realizações que confira credibilidade". Entre os que finalizam os projetos, deve-se mostrar capacidade de gestão e uma longa lista de negócios concluídos.

 

É o caso do executivo João Teixeira, vice-presidente de corporate do Santander Brasil e responsável pela área de fusões e aquisições do banco. Teixeira acompanha o segmento desde o início das privatizações do sistema Telebrás, nos anos 1990. No banco desde 2002, chefia 20 profissionais entre economistas, administradores, engenheiros e advogados. "É preciso saber usar técnicas de avaliação e negociação, além de fazer com que os atores da operação confiem plenamente em você."

 

No Santander, a equipe de Teixeira participou dos acordos JBS-Bertin e Petrobras-Suzano. "Além de facilitar acordos de compra, o profissional da área ainda pode se envolver com a reestruturação de empresas, atração de investimentos diretos no Brasil e com a internacionalização de companhias nacionais."

 

Para os especialistas, o trabalho de M&A também não acaba com a assinatura dos contratos - dependendo do porte das empresas, uma transação de fusão ou aquisição pode durar de seis meses a um ano. Depois da fusão, as organizações querem que o executivo de compra e venda apresente resultados como o aumento das receitas em um curto espaço de tempo, ampliação do market share e injeção de capital para novos investimentos. "Nesse estágio, o profissional já passa a ser um analista em planejamento financeiro", diz Felippe Mendes, consultor da Alpen Executive Search.
 


Veículo: Valor Econômico

 


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