As maiores empresas do país estão acompanhando de perto o novo capítulo da disputa entre Abilio Diniz e Jean-Charles Naouri, presidente do Casino, rede francesa que controla o Pão de Açúcar.
Na terça, Abilio deve ser eleito presidente do conselho de administração da BRF (fusão entre Sadia e Perdigão), a principal fornecedora de alimentos do Pão de Açúcar, grupo que tem Abilio na presidência do conselho.
O Casino já pediu a renúncia do sócio brasileiro, que, por sua vez, diz não existir conflito. Para Abilio, as empresas não são concorrentes e só haveria impedimento se participasse do conselho de outra varejista. Acordo de acionistas de 2005, quando o Casino comprou parte do grupo, prevê a permanência vitalícia de Abilio no conselho.
Com a recusa do brasileiro, Naouri poderá convocar assembleia para pedir que sua destituição seja votada.
O caso pode parar na Justiça e abrir precedentes para que situações em outras empresas sejam questionadas, principalmente por minoritários. Preocupadas, companhias do ramo frigorífico, da construção civil e dos setores bancário e comercial já procuram os principais escritórios de advocacia do país.
Muitas têm em seus conselhos de administração representantes que integram ao mesmo tempo o conselho de suas fornecedoras ou de empresas clientes.
Uma das recomendações dos especialistas é formalizar um documento, com a anuência das duas companhias, sobre a atuação do mesmo conselheiro nas empresas. "Isso se aplicaria em casos em que uma empresa é credora, e outra, devedora", diz o advogado André de Almeida.
A disputa entre Abilio e Naouri divide a opinião de estudiosos em governança corporativa. Para o professor da Faculdade de Economia e Administração da USP Alexandre Di Miceli, a permanência simultânea de Abilio no conselho das duas empresas representa um conflito. "De um lado, o Pão de Açúcar quer comprar a preços mais baixos. De outro, a BRF quer vender mais caro", diz Di Miceli.
Essa é a opinião do Casino. "Imagine se, nos EUA, o presidente do conselho do Walmart também comandasse o da Procter&Gamble [fornecedor]. Isso causaria gargalhadas", disse Naouri, ao ser questionado sobre o sócio.
Advogados de Abilio discordam. Para Modesto Carvalhosa, é ínfima a relação de dependência entre a BRF e o grupo. Parecer do advogado mostra que as vendas da BRF para o Pão de Açúcar equivalem a 3,39% da receita total da companhia. Na outra ponta, a venda de produtos da BRF pelo grupo corresponde a 1,88% da receita total.
"O questionamento é uma conduta típica de má-fé do Casino para descumprir a principal cláusula [cargo vitalício no conselho], razão do acordo", diz Carvalhosa.
Para advogados de Abilio, o suposto conflito também existe no Casino. Na França, Naouri é membro do conselho da Fimalac, empresa que controla a Fitch Ratings, agência que faz a avaliação de risco do Casino e do GPA. Dois diretores do Casino integram o conselho da L'Oréal, um dos principais fornecedores do grupo francês.
Veículo: Folha de São Paulo