As vinícolas brasileiras vão colocar um pequeno exército nas ruas para ajudar a Receita Federal a fiscalizar a aplicação do selo fiscal em todos os vinhos e espumantes nacionais e importados vendidos no varejo e no atacado a partir de agora. O controle é obrigatório desde o dia 1º deste mês, exceto para os produtos adquiridos pelo comércio até 31 de dezembro de 2010 com a data da compra confirmada por nota fiscal, e é visto pelos produtores nacionais como um forte aliado no combate ao contrabando, ao descaminho (crime que caracteriza importação ou exportação sem pagamento de impostos) e aos produtos brasileiros ilegais.
Os fabricantes nacionais aplaudem a medida, mas importadores foram à Justiça contra a nova instrução da Receita Federal. A Associação Brasileira de Exportadores e Importadores de Alimentos e Bebidas (Abba) obteve liminar no Tribunal Regional Federal de Brasília para não estampar o selo de controle fiscal nos vinhos importados, diz o diretor executivo do Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin), Carlos Paviani. Mas a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional já recorreu e, segundo o presidente da União Brasileira de Vitivinicultura (Uvibra), Henrique Benedetti, a expectativa do setor é que a medida seja revertida em breve.
Conforme Paviani, as equipes comerciais das 800 vinícolas que produzem vinhos e espumantes engarrafados no país (das quais 500 no Rio Grande do Sul) somam cerca de 3 mil pessoas, que visitam regularmente os pontos de venda e podem checar eventuais irregularidades. "Vamos prestar informações à Receita, nosso papel é este", diz Paviani. As indústrias já são obrigadas a aplicar o selo em seus produtos desde 1º de janeiro de 2011, assim como as importações feitas a partir da mesma data.
"Os vendedores transformam-se em fiscais e o próprio consumidor vai passar a exigir o selo", diz Daniel Salton, presidente da Salton, uma das maiores vinícolas nacionais, com produção de 21,6 milhões de garrafas de vinho e espumante em 2011. A ideia é compartilhada pelo enólogo Dirceu Scottá, da Dal Pizzol, que elaborou 300 mil garrafas no ano passado. "Haverá um autocontrole do setor".
Segundo o superintendente-adjunto da Receita Federal no Rio Grande do Sul, Ademir de Oliveira, a fiscalização está preparada para começar o trabalho "imediatamente". Sem dar detalhes sobre a estratégia montada para coibir as vendas irregulares, ele conta, além da equipe de fiscais (o número de agentes não foi revelado), com as denúncias dos consumidores e das empresas que operam legalmente para agir contra a sonegação e a "concorrência desleal".
Quem for apanhado com produtos irregulares em estoque sofrerá punição severa. As mercadorias serão tributadas, apreendidas, o responsável receberá uma representação fiscal e responderá a processo penal, explica Oliveira.
Paviani calcula que mais de 20 milhões de garrafas de vinho e espumante (equivalentes a 15 milhões de litros) entram irregularmente no país todos os anos. "O problema não será resolvido de uma hora para outra, mas os efeitos positivos do selo fiscal serão sentidos nos próximos dois a três anos", acredita. De janeiro a novembro de 2011, segundo a Uvibra, o mercado doméstico legal alcançou 83,7 milhões de litros de vinhos finos e 15,8 milhões de litros de espumantes, entre nacionais e importados.
"Com o selo saberemos qual é o tamanho real do mercado", diz o presidente da Uvibra, Henrique Benedetti. Para ele, por exemplo, boa parte dos 54 milhões de litros de vinho importados pelo Paraguai da Argentina e do Chile em 2010 acabou entrando ilegalmente no país. "Naquele ano o Brasil, com quase 200 milhões de habitantes, dez vezes mais do que o Paraguai, comprou legalmente 45 milhões de litros dos dois países.
A introdução do selo fiscal obrigatório em vinhos e espumantes, a exemplo do que já ocorre com as bebidas "quentes" como uísque e vodka, é um processo que começou em abril de 2010. Na época, a Instrução Normativa (IN) 1.026 da Receita Federal estabeleceu janeiro de 2011 como data para a indústria e os importadores começarem a aplicar o selo e janeiro de 2012 para o varejo e o atacado iniciarem as vendas apenas de produtos controlados, depois de um ano para liquidar os estoques anteriores.
Em agosto de 2011, porém, o prazo para adequação do comércio foi estendido até janeiro de 2015, mas alguns dias depois, sob pressão das vinícolas, outra IN restabeleceu a data de janeiro de 2012. O último capítulo foi escrito dia 29 de dezembro, quando a Instrução Normativa 1.230 permitiu a venda, a partir de agora, de produtos sem selo adquiridos pelo varejo e pelo atacado antes de janeiro de 2011.
Segundo o Ibravin, cada selo, impresso pela Casa da Moeda, custa R$ 0,023, mas o valor pode ser compensado no recolhimento do PIS e da Cofins pelas empresas. A aplicação da estampa custa, em média, de R$ 0,01, caso o processo seja mecanizado, até no máximo R$ 0,03, quando a colocação é manual, calcula Paviani. Para Scottá, da Dal Pizzol, são "valores irrisórios" diante dos benefícios gerados pelo maior controle.
Conforme o enólogo, a vinícola faz a aplicação manual e deslocou um funcionário para reforçar a equipe de duas pessoas que colava o rótulo e agora coloca também o selo. Já a Salton investiu 100 mil euros em uma seladora no início de 2011, sem contar a nova linha de envase adquirida em meados do ano por R$ 8 milhões e que já incluía equipamento para selagem. Antes da automatização da operação, a empresa começou a selar os produtos manualmente em dezembro de 2010 com 30 funcionários temporários.
Veículo: Valor Econômico