O superávit primário consolidado do setor público somou R$ 47,04 bilhões, o equivalente a 1,59% do Produto Interno Bruto (PIB), em 12 meses até agosto, se configurando como o pior resultado da série histórica iniciada em junho de 1999. No mês de agosto, segundo dados divulgados ontem pelo Banco Central, o superávit foi de apenas R$ 5,042 bilhões, cifra inferior aos dividendos transferidos pelas empresas estatais ao Tesouro Nacional, que somaram R$ 7,81 bilhões, pagos sobretudo pelo BNDES (R$ 4 bilhões) e Caixa Econômica Federal.
De janeiro a agosto, o resultado primário, de R$ 43,47 bilhões, correspondeu a 2,21% do PIB. A meta fiscal para este ano é de um superávit de 2,5%, que pode baixar para 1,56%, conforme revisão da lei orçamentária proposta pelo governo ao Congresso, há 15 dias.
O chefe do Departamento Econômico (Depec) do BC, Altamir Lopes, considerou o desempenho fiscal este ano, até agosto, "ruim", mas ressaltou que houve influência da queda do nível de atividade econômica e das ações anticíclicas, de aumento de gastos do governo. Passados os efeitos mais graves da crise financeira global, ele acredita que "o que se espera, agora, é a recuperação
das receitas", afirmou.
A contribuição das empresas estatais para o resultado de agosto foi residual - um superávit de apenas R$ 41 milhões. No ano, até agosto, o superávit somou R$ 282 milhões, equivalente a 0,01% do PIB, sendo que as empresas públicas estaduais e municipais é que seguraram um resultado positivo. As companhias federais tiveram déficit primário de R$ 2,33 bilhões, ou 0,12% do PIB. Tal performance decorre do fato de que a Petrobras está, agora, excluída das contas públicas
Já os governos regionais (Estados e municípios), fizeram superávit de R$ 17,22 bilhões no ano, ou 0,88% do PIB.
Por esse desempenho, a relação dívida líquida do setor público e PIB encerrou agosto em 44%, o mesmo nível de julho. Segundo Altamir Lopes, se o superávit primário realizado este ano for de 1,56%, essa relação entre dívida e PIB subirá para 44,2% em 2009. Se, ao contrário, o setor público conseguir cumprir a meta cheia (2,5% do PIB), a relação dívida líquida/PIB baixará a 43,3% neste ano.
O déficit nominal, que foi de 1,98% do PIB no ano passado, voltou a subir, mesmo com a queda da taxa de juros de janeiro para cá. Entre janeiro e agosto esse conceito, que inclui as despesas com juros da dívida pública, subiu para 3,3% do PIB.
Com um cenário de superávit de 1,56% este ano, o déficit nominal deve encerrar 2009 em 3,63% do PIB e os juros da dívida, em 5,19% do PIB. Segundo Lopes, se a meta de primário voltar para 3,3% em 2010, a relação dívida/PIB cairá para 40,9%. "Esperávamos a estabilidade e isso ocorreu. A dinâmica da dívida depende, atualmente, em grande medida, do comportamento do câmbio, porque há ativos significativos indexados ao dólar", esclareceu ele.
No curto prazo, a dívida é muito influenciada pelo câmbio, mas, no médio prazo, a taxa de juros é determinante. "Ainda temos muito a percorrer do ponto de vista da apropriação de juros menores. Parte significativa da flexibilização da política monetária ainda não foi apropriada", ressaltou.
Até agosto os juros da dívida somaram R$ 108,3 bilhões (5,51% do PIB), o que representou uma redução de 0,84 ponto percentual do PIB. Essa é a medida da redução do gasto com juros determinada pela queda da taxa Selic em 5 pontos percentuais verificada este ano.
Segundo Lopes, esse foi o melhor resultado desde 2007, quando o gasto com juros alcançou R$ 105,02 bilhões. Em 12 meses até agosto, essa conta foi de 5,12% do PIB, ou o equivalente a R$ 151,47 bilhões.
Para o economista Felipe Salto, da consultoria Tendências, a meta de superávit do setor público deixou de ser um compromisso com solvência, porque foi reduzida de 3,3% do PIB para 2,5%. Depois, caiu para 1,56%. Ele ressaltou que o governo fez escolhas ruins para a despesa, principalmente Previdência Social, pessoal e custeio.
"A reação à crise não teve substituição de gastos ruins por investimento. Se a relação entre dívida e PIB está aparentemente estabilizada em 44%, o risco fiscal será do próximo governo. A partir de 2011, o crescimento das despesas vai travar um crescimento mais forte da economia", lamentou.
Salto também procurou alertar para o que chamou de "impressionante" crescimento da dívida bruta do governo geral (governo federal, INSS, Estados e municípios). Em agosto, chegou a R$ 1,95 trilhão ou 66,6% do PIB. Em dezembro de 2008, o patamar era de 58,6% do PIB.
Veículo: Valor Econômico