O descasamento entre oferta e demanda por insumos naturais, usados na fabricação de cosméticos, preocupa as empresas compradoras desses materiais. Em comunidades produtoras, no Piauí e Pará, a cotação de semente do murumuru, por exemplo, usada por sua propriedade hidratante, já subiu 13% neste ano.
As preocupações aumentaram em relação a determinados ativos nas últimas semanas, como a já citada semente do murumuru, o buriti (ambos coletados em comunidades amazônicas) e o óleo de palma. "Praticamente não há murumuru no mercado hoje e nem mesmo estoque da colheita realizada no começo deste ano", diz Marcelo Golino, presidente da Chemyunion, uma das maiores fornecedoras de ativos para empresas cosméticas.
Nesse caso, há uma baixa produção, em parte, por conta do fato de certas comunidades terem ampliado a produção do açaí na região do Amazonas onde existiam as árvores de murumuru (próximos aos terrenos baixos e leitos de rio) nos últimos anos. O maior interesse pela fruta por algumas empresas, como Natura e Vitaderm, chegou a aumentar a oferta no ano passado, mas ela ainda é limitada.
"O açaí tem uma procura maior e os produtores ganham na escala", diz o executivo. Na comunidade de Pimenteira, no Pará, o quilo do murumuru estava em R$ 2,70 em junho e foi a R$ 2,85 neste mês. Custava R$ 2,52 no início do ano, segundo a cooperativa dos produtores locais de Pimenteira.
Quanto ao buriti, com uso muito comum pela indústria em sabonetes e cremes, há uma expectativa grande em relação ao que será colhido pelos produtores nos próximos meses. É que a forte seca na Amazônia - a segunda maior da história na região, segundo o Serviço Geológico do Brasil - só deve dar sinais de alívio no fim do ano, quando ocorre a formação do fruto. O buriti só consegue prosperar em solos úmidos.
"Usamos intermediários que possuem estoques maiores de polpa da fruta. Estamos na entressafra do buriti agora, mas se essa falta acontecer com a seca, temos menor poder de compra do que as grandes empresas, e acabamos sendo mais afetados", diz Cristina Pamplona, diretora de marketing da Folhata Cosméticos, que produz cosméticos de murumuru, buriti, cupuaçu, entre outros.
Segundo Sergio Gonçalves, gerente da Croda, multinacional inglesa que produz ativos derivados de florestas no Brasil, os contratos de fornecimento aos clientes precisam levar em conta essas "variáveis de difícil controle", explica. "Esse é um risco consciente e compartilhado entre fornecedor e comprador", diz. A Croda atende companhias como Natura, Avon, O Boticário e L'Oréal. Ela informa que eventuais riscos, como a quebra da safra do buriti na Amazônia, a levará a buscar outras regiões produtoras como Centro-Oeste e Nordeste. Há consequências com essa mudança.
"A questão é que ao comprar o fruto em outro lugar, o produto é outro, com outra coloração. O odor e a formação do produto a ser produzido a partir do insumo pode variar", diz Gonçalves.
O executivo lembra que, as grandes empresas se protegem dessas variáveis ao fechar contratos de compra com comunidades, algumas de fornecimento exclusivo, e com períodos longos de estoque. A Natura informou, em nota ao Valor, que não percebeu mudanças da oferta de insumos. "Com relação ao fornecimento de buriti e murumuru, que têm cadeia restrita, planejamos o nosso portfólio respeitando o ciclo de colheita de cada ativo e a capacidade de nossas comunidades fornecedoras", diz a nota.
O Boticário e Avon não vendem mercadorias a partir desses insumos. No portfólio de ambas, são usadas matérias-primas mais comuns no mercado como morango, amora e pêssego, entre outras.
Sobre a possibilidade de haver uma alta preços do óleo de palma, um dos insumos mais básicos da cadeia de cosméticos, usado em praticamente todos os produtos naturais, a Natura diz que tem "contrato de reserva de volume". Problemas climáticos na Malásia, um dos maiores fornecedores do mundo, afetaram a oferta do insumo. Segundo Lan Chen, da LMC International, houve alta exagerada na cotação dos óleos vegetais. Em relatório recente, prevê que os preços do óleo de palma, em mais de US$ 940 a tonelada, atualmente, deve baixar para US$ 800 com o aumento de produção em 2011. Mas enquanto não cai, o presidente da Chemyunion se preocupa. Ele tem cerca de 500 clientes dependendo do óleo de palma.
Veículo: Valor Econômico