Segmento no país atravessa grave crise, já que grande parte de seu rebanho foi destruída.
Buenos Aires e São Paulo - A continuidade da política protecionista na cadeia produtiva de carne bovina pode levar a Argentina de exportador a importador da proteína. "Em 2005 e 2006, a Argentina fazia parte dos cinco maiores exportadores de carne do mundo. Grande parte de seu rebanho foi destruída e isso não se recupera de uma hora para outra", diz o zootecnista e consultor da brasileira Scot Consultoria, Alex Santos Lopes da Silva.
Conforme dados do Instituto de Promoção de Carne Bovina Argentina (IPCVA, pela sigla em espanhol), em 2005 a Argentina exportava 578,8 mil toneladas de carne bovina. Com as restrições impostas a partir de 2006, esse número passou para 235,2 mil toneladas no ano passado, com receita de US$ 1,481 bilhão. Estimativas do IPCVA indicam que, com as medidas que provocaram a crise no setor, o país está deixando de gerar US$ 1 bilhão em exportações.
O diretor técnico da consultoria brasileira em agronegócio Informa Economics FNP, José Vicente Ferraz, realça que é preciso entender as motivações para o governo intervir no mercado. "No curto prazo é benéfico, mas para o longo prazo é ruim. A indústria deixa de fazer investimentos e o pecuarista deixa a atividade, causando problema de oferta para o mercado interno, mesmo sem exportações." explica.
As restrições às exportações se acentuaram a partir de 2006. A medida protecionista "gran barata" (grande oferta) fixada pelo secretário de Comércio Interior, Guillermo Moreno, que de "xerife dos preços" passou a ser o "superministro" de Cristina Kirchner, consiste em reservar a carne para o mercado doméstico, vendida a preço abaixo de custo, o que compromete os resultados dos frigoríficos. Os exportadores perdem US$ 500 em cada tonelada exportada em conseqüência das retenções (imposto de exportações) e da "gran barata".
Cota - Para cada corte exportado à Europa dentro da cota Hilton, ao valor de US$ 15 mil, o exportador recolhe 15% em retenções mais 7% correspondentes ao volume de carne reservada aos consumidores domésticos. Outro exemplo são as exportações para a Rússia, de cortes menos valorizados: ao valor de US$ 4 mil, agregam-se os 15% de retenções e outros 12,5% de carnes para o mercado interno. "Estamos com retenções reais de 22% a 27,5% para a carne, muito acima do que é cobrado pelo trigo e quase igual à soja", reclama um executivo.
O resultado dessa política aplicada nos últimos cinco anos foi um desastre: o rebanho bovino argentino caiu 20%, ou 12,5 milhões de cabeças, 120 frigoríficos fecharam suas portas e 7 mil trabalhadores já perderam seus postos de trabalho. Até o fim do ano, o número de desempregados no setor subirá para 14 mil operários, conforme estimativas do presidente da Câmara da Indústria e Comércio de Carnes da República Argentina (Ciccra), Miguel Schiaritti.
Não ficaram imunes nem mesmo as 28 mil toneladas da cota Hilton, cumpridas rigorosamente durante 30 anos e que atraíram os frigoríficos brasileiros para o mercado argentino. Neste ano, a Argentina não poderá cumprir a cota de 12 mil toneladas. Em 2010, deixou de enviar 9,5 mil toneladas. No ano passado, faltaram 2,2 mil toneladas para completar a cota.
O consenso entre os especialistas que a tendência é de a situação do setor de carne bovina argentino continuar o mesmo, pelo perfil e pelas atitudes populistas do governo Kirchner. Entretanto, caso a presidente mude de comportamento, haverá um longo caminho para o país retomar a posição de grande exportador e produtor da proteína.
Veículo: Diário do Comércio - MG