Fabricantes de lâmpadas na berlinda

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Ambiente: Philips, GE, Osram e Sylvania acumulam multa de R$ 4 milhões por falta de destinação do produto


  
As quatro maiores fabricantes de lâmpadas no país acumulam dívidas de quase R$ 4 milhões - cada uma - por não darem a destinação correta de seus produtos. A dívida, por enquanto, refere-se apenas ao Paraná, Estado que tomou a dianteira nacional e aprovou uma legislação própria que obriga fabricantes e distribuidores a recolher as lâmpadas e encaminhá-las a empresas recicladoras.

 

Philips, General Electric, Osram (da Siemens) e Sylvania não cumpriram a determinação. Alegam, entre outras razões, que o custo para reciclagem de uma lâmpada pode vir a ser até mais alto que o da sua produção. Desde 17 de julho do ano passado, a Secretaria do Meio Ambiente do Paraná aplica multa diária de R$ 10 mil a essas empresas, que recorreram da ação.

 

"Precisamos construir um modelo viável do ponto de vista financeiro e técnico", afirma Carlos Eduardo Uchoa Fagundes, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Iluminação (Abilux), entidade que reúne os fabricantes.

 

A queda de braço forçou o setor a se mobilizar para contra-atacar. A ideia é agir antes que outros Estados adotem uma posição similar à do governo paranaense ou - pior - optem por uma terceira via, o que exigiria da indústria uma enorme capacidade de adaptação para atender cada legislação local.

 

O primeiro passo foi contratar a consultoria Grant Thornton, sediada em Chicago, para mapear o que já é feito em outros países e elaborar um estudo sobre a viabilidade da reciclagem de lâmpadas no Brasil, baseando-se na realidade nacional de produção, logística e benefícios fiscais. O estudo está em fase de finalização. Deverá ser apresentado ao governo federal até dezembro como uma proposta oficial do setor de iluminação para o sistema de logística reversa, no qual os produtos comercializados são trazidos de volta para destinação, reutilização ou reciclagem.

 

"Estamos bancando a solução", afirma Fagundes, da Abilux. "O que nos incomoda muito são essas legislações descoordenadas, em que cada um faz do seu jeito. É preciso uma sistemática nacional."

 

A decisão de investir em um documento de fôlego foi motivada pela expectativa de encontrar uma alternativa à Política Nacional de Resíduos Sólidos, impasse que dura 17 anos no Congresso e perpetua o vácuo de marco regulatório.

 

Em julho, sob pressão da própria indústria, o deputado federal Arnaldo Jardim (PPS-SP) apresentou uma nova versão de projeto de lei retirando as lâmpadas, assim como produtos eletrônicos, do texto. A prioridade eram setores que já contavam com resoluções de logística reversa do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), como pneus e óleos lubrificantes. Nos bastidores, a grita se deu porque o sistema elevaria os custos da indústria, distribuidores e varejistas, que teriam de montar estruturas de recolhimento.

 

Alegando segredo de mercado, a Abilux divulga apenas estimativas da produção nacional. As lâmpadas incandescentes (que consomem mais energia) representam a maior fatia do mercado, com cerca de 250 milhões de unidades produzidas por ano. As fluorescentes tubulares, comuns em edifícios comerciais, respondem por outras 170 milhões de unidades. Fluorescentes compactas, que ganharam espaço com o apagão em 2001 por serem mais econômicas, vêm da China: são importadas de 120 milhões a 150 milhões de unidades por ano, excluindo as ilegais.

 

É aí que surge um novo nó na disputa com o Paraná, com ecos no debate nacional. A indústria acusa o governo paranaense de penalizar só fabricantes nacionais, as únicas multadas até agora, quando deveriam ampliar a fiscalização para as importadoras de produtos chineses, que trazem para cá 70% das lâmpadas compactas da Ásia.

 

"Não temos como identificar o importador porque não há cadastros disponíveis. Já os fabricantes nacionais, sabemos quem são", defende o secretário de Meio Ambiente do Estado, Rasca Rodrigues. "Nós vamos insistir na política de logística reversa com as lâmpadas. Com outros geradores, como o de embalagens e vidros, deu certo."

 

Segundo especialistas do setor, a reciclagem de lâmpadas não deve atingir sequer 5% do que é produzido e vendido no Brasil. A falta de uma cadeia organizada para coleta e recepção é o grande gargalo. As iniciativas hoje resumem-se a um e outro setor (ler texto abaixo).

 

Os fabricantes afirmam que o processo de destinação correta das lâmpadas poderia custar até mais que a sua produção. O custo médio para produzir um modelo fluorescente tubular é de R$ 1,50. O preço de reciclagem, no entanto, depende de fatores como o volume que será reciclado e logística desse material. Na Tramppo Recicla, empresa paulista especializada em reciclagem de lâmpada, o custo por unidade varia de R$ 0,60 a R$ 1,20.

 

A maior fatia de lucro da empresa, diz Carlos Pachelli, sócio e diretor da Tramppo, não está na venda do material reciclado que ele gera, mas nos serviços de descontaminação que oferece às empresas. Hoje, mais de 200 companhias - como o Bradesco e a Casas Bahia - pagam para que a recicladora dê destinação para suas lâmpadas.

 

"Fechar o ciclo não é simples. A logística aqui é complicada e cara", explica o holandês Harry Verhaar, diretor de Eficiência Energética e Mudanças Climáticas da Philips, em visita recente a São Paulo.

 

O grande problema da inexistência de reciclagem em grande escala é, como sempre, ambiental. Lâmpadas fluorescentes contêm mercúrio, metal pesado com alto poder poluidor. Quando descartadas em aterros ou lixões, contaminam lençóis freáticos e outros cursos d'água, provocando danos à saúde. Um dos casos mais trágicos de contaminação por mercúrio ocorreu em um vilarejo no Japão, nos anos 50, onde mulheres grávidas foram expostas a altos níveis do metal através do consumo de peixes contaminados.
 


Veículo: Valor Econômico


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